SAUDE RURAL
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SAUDE RURAL
Mais uma vez "Ideias e Acqao" vem apresentar aos seus leitores um
numero duplo especial. Os anteriores tinham tido por tema o "Apart
heid" e as suas incidencias na populapao negra rural na Africa do Sul
(n°. 1 26), a participaqao popular na Asia (n°. 116) e na America Latina
(n° 76).
Outros assuntos relacionados com o desenvolvimento rural, ultrapassando embora a questao agricultura em sentido mais estricio,
foram tambem aqui ja trazidos. Assim, em 1975, public3mos em colaboraqao com os nossos colegas da UNESCO, um numero especial sobre
"A alfabetizaqao em Meio Rural" (n°. 105). Desta vez vamos levar a
cabo uma incursao nos terrenos de outra orgamzaqao irm3, a OMS,
consagrando este numero a "Saude Rural". A enfase esta colocada,
como de costume, na "participaqao popular", um dos cavalos de bataIha da CMCF/AD. Foi nossa intenqao realqar mais uma vez que, seja
qual for o nosso campo de actividade — agricultura, educaqao ou saude
— nSo nos devemos limitar aos dominios da competencia especifica de
cada uma das nossas organizaqdes, mas entender o desenvolvimento
rural como um todo, pois e assim que elese apresenta naturalmenteas
proprias populates rurais.
Queremos agradecer ao co-redactor deste boletim, Dr. Neil Ander
son, especialista de saude publica, que foi respons3vel por diversas
missoes enquanto consultor da QMS. Agradecemos igualmente ao Dr
Richard Morrow do Programa de Investigaqao de Doenqas Tropicais e
ao Dr. Duane Smith da DivisSo de Reforqos dos Services de Saude da
mesma organizaqbo pelos seus conselhos relatives 3s doenqas especificas que referimos neste boletim (muito em especial ao Anexo). Por
fim, exprimimos ainda a nossa gratidao ao Conselho Ecumdnico das
Igrejas, em Genebra, cuja ComissSo para a Participate das Igrejas no
Desenvolvimento e Comissao Mbdica Crista, se prontificaram a contribuir financeiramente para as despesas suplementares que acarretou a
produto deste numero especial.
NOTA: Todos os numeros especiais que mencion3mos. bem como mais exemplares desta edipSo, podem ser enviados a pedido.
longo da ultima decada, a grande maioria dos Governos fizeram deAoclaracbes
solenes em que reconheciam que as condiqbes de vida dos
habitantes do Terceiro Mundo eram deploraveis e que a maior parte dos
esforqos empregues para atacar este problema tinham sido, infelizmente,
meficazes. Mais recentemente, tais declaraqbes definiam com mais detalhe
estrategias que procuravam melhorar esta situaqao. E de uma forma generalizada a "participacao popular” 6 assumida como a chave para osucessodo
desenvolvimento rural.
Isto mesmo era ja claramente enunciado pela CMRADR em Roma em
1979: "Participar nas instituiedes e sistemas que governam a sua vida 6, ao
mesmo tempo, um d/reito fundamental do homem e uma condipao essential
para o aiinhamento do poder politico em favor dos grupos desfavorecidos e
para o desenvolvimento socio-econdmico. As estratdgias de desenvolvi
mento rural so poderao produzir os seus frutos se a populapao — concretamente as suas camadas mais desfavorecidas — estiver motivada,
activamente empenhada e organizada na base".
IIIIllllIllliminniHl!.1
mente inaceitaveis t: cu
comum a todos os parses
trate de programas agricolas ou sanitarios, os resultados parecem serfracos
e esporadicos.
npriarapao de Alma-Ata
TrrnTnrnTuHTTnnnmn^^
Ja pouco menos de um ano antes, a Conference Internacional sobre os
Cuidados Primdnos de Saude, organizada em Alma-Ata (URSS) pela OMS/FISE em Setembro de 1978, tinha sido muito explicita sobre este assunto.
Oscu idados primdrios desaiide, foientaodec la rado, saoomeiodeassegu rar
a todos os povos um nivel de saude que lhes permita levar uma vida social e
economica me nte produtiva: estes sao "cuidados de saude essenciais, ba seados em mdtodos aceitaveis. universalmente acessiveis a todo o ind/viduo e a
todas as famlhas da comunidade. com a sua plena participapao e a um custo
que a comunidade e o pals possam assumir".
Tres.quatroanosse passaram sobre estas dec la racbes E no entanto perto
de 500 milhoes de seres humanos, na sua maioria rurais, continuam a sofrer
de fome e malnutripSo, e este numero nao esta em decrescimo Sem duvida
que a produtividade agricola aumentou em algumas regioes, mas istodeu-se
em geral em culturas de exportapao e nao em culturas destinadas ao consumo interno, assim, na maior parte dos casos, os rurais nao beneficiam
deste progresso. A medida que asantigasestruturasagrarias se vaodesintegrando. as vantagens precarias que o modo tradicional de vida podia mesmo
assim assegurar aos camponeses desapareceram, deixando uma multidao
de pessoas sem terra, sem emprego e sem subsistence — a menos que
trabalhem em condicbes de explorapao e miseria extremas.
Ainda que, de vez em quando, se tenha registadoalgum exito, o panorama
geral e sombrio. Muitas vezes, os proprios esforqos feitos no sentido de criar
um processo de desenvolvimento sao mais negativos que positives' para a
populapbo rural. Os programas para melhorar a produpao agricola trazem,
em alguns casos, outras consequencias menos agradaveis. 0 balance de
programas de grande envergadura destinados a melhorar ascondipoes sanitarias das populapoes rurais e, frequentemente, decepcionante.
Estes reveses comepam a ter consequencias negativas, que se traduzem
num crescente desencanto pela participaqbo popular. "Isto naovai" Querse
Resta saber se se deu efectivamente uma oportunidade 3 participapao
popular nestes dominios. Nao nos cansamos de repetir: e raro fazer-se desta
participapao o motor principal do desenvolvimento rural, e apoiar-se na
comunidade para orgamzar a aepao sanitaria. Muitas vezes, esta ultima fica
isolada de outros programas de desenvolvimento. tanto como, quer na sua
fase de formulagao quer na sua fase de execugao, os programasdedesenvol
vimento rural ignoram os problemas samtcirios.
E dificil para aqueles que trabalham na agricultura, na saude ou na
educapao traduzirem na pratica conceitos como "colaborapao intersecto
rial", "cooperapao, coordenapao ou integrapao". Oscamponeses, esses, nao
fazem estas distinpoes e o trabalho, a saude, a educapao fazem parte integrante do seu dia a dia.
Se n3o conseguirmos responder 3s necessidades das populapoes rurais,
isso deve-se, em grande parte, ao facto de termos sido incapazes de as
mobilizar de forma efectiva Se este numero de "Ideias e Acpao" puder
contribuir, ainda que modestamente, para que isso seja compreendido e
assim a participapao comunitaria se intensifique, terd cumprido a sua missao. Comeparemos por estudar alguns mitos e obstdculos, ilustrados sempre
que possivel com exemplos extraidos da realidade. Tentaremos, em seguida,
apresentar algumas sugestoes para a elaborap3o de programas de saude
rural no quadro dos cuidados primaries de saude. Por ultimo, este numero
contem ainda (sobretudo no Anexo) numerosas referencias a fontes bibliograficas e a organizagoes/grupos que se ocupam de saude rural. Esperamos
promover uma troca de informapbes entre aqueles — e s3o muitos — que
empenham todas as suas forpas em conseguir "a saude para todos no ano
2000".
dos niveis de desenvolvimento e da distribuipao dos reAdesigualdade
cursos e o principal obstaculo a uma melhoria das condipoes de saiide
— e de vida em geral — das populapbes ruraisdoTerceiro Mundo Doenpas.
benignas noutro contexto, podem tornar-se fatais em vitimas subalimentadas. Infecpbes. facilmente evitaveis ou curaveis na cidade, sao de muito ma is
dificil tratamento no campo, onde as distancias sao maiores e os servipos
sanitarios escassos. Doenpas e mortes reiacionadas com a gravidez e o parto
sao muito mais numerosas nas zonas rurais, onde as mulheres gravidas se
entregam a duros trabalhos fisicos ate ao momento do parto e onde nao ha
assistencia medica a que se possa recorrer em caso de surgirem
complicapoes.
Por outro lado, em quase todos os paises, os recursos disponiveis ficam
concentrados nas cidades, ao servipo dos seus habitantes que gozam de
melhores condipoes econdmicas.
Por isto mesmo, torna-se ainda mais urgente ajudar as comunidades
rurais a tomar a seu cargo, na medida do possivel, os seus prbprios cuidados
de saude, e afirmar a necessidade de dotar as populapbes rurais de recursos
sanitarios nacionais em mator proporpao
Tres grupos de afecpbes estao espalhados nas regioes rurais dos paises
pobres. Primeiro, as que sao propagadas atraves do ar (pela tosse, espirro,
respirapao) como o sarampo, a tuberculose, a tosse convulsa e a pneumonia
Seguem-se as que sao transmitidas pelas fezes: diarreia, amibioses, parasi
toses. poliomielite Em ambos os casos e possivel lutar contra estas doenpas
atraves do saneamento basico, o que esta ao alcance da maior parte das
comunidades rurais.
0 terceiro grupo de afecpbes e mais dificil de combater: trata-se do
paludismo, da bilharziose, da doenpa do sono (tripanossomose). Manda a
verdade que se diga que estasdoenpas recrudescem.com frequencia. com as
medidas adoptadas para fomentar o desenvolvimento rural.
— 0 paludismo, a bilharziose e a tripanossomose tern progredido com
os trabalhos de irrigapao, enquanto a utilizapao de pesticidas produziu
uma espbcie resistente de parasitas.
— A rdpida urbanizapao teve como consequencia o aparecimento de
barracas densamente habitadas.
— As barragens facilitam a proliferapao de mosquitos, moscas e caracbis, todos eles portadores de doenpas. e a mosca que transmite a oncocercose (cegueira fluvial) reproduz-se, entre outros lugares, nos esgotos
sanita rios.
— A construpao de estradas, as valetas, sarjetas e condutas subterraneas propiciam a reprodupao de moluscos e mosquitos, o mesmo acontecendo com as minas de pouca profundidade.
— A expansao da criapao de gado em regioes infestadas pela mosca
tsb-tsb faz correr o risco de transmissao da doenpa do sono aos pastores e
suas families.
Os mais pobres sao assim os mats vulneraveis, enquanto osbeneficiosdo
desen volvimento sao sempre encarados sob um a ng u Io 'nacional", o que de
facto significa que acabam sempre por privilegiar a elite nacional.
Contributes exteriores: mais uma imposiqao?
Como se nao chegasse o combate que tern de empreender contra as tres
principals causas de doenqa (malnutriqao, infecqoes e condiqoes precanas
na gravidez e no parto), as populaqoes rurais tern ainda de se defender contra
as intervenqoes exteriores Estas, nao so nao fomentam necessariamente a
iniciativa local, como muitas vezes a desencorajam. E o caso, entre outros,
das que se situam nodominioda educaqao nutricional.da "ajuda alimentar",
do planeamento familiar e dos "programas verticals" de combate a certas
doenqas.
A ideia de que a subnutriqao se deve, na maioria dos casos ou pelo menos
em grande parte deles, a ignorancia quanto ao valor nutritivo dos alimentos e
falaciosa. Somos levados a pensar que os habitantes dos paises ricos nao
distinguem o que e bom do que e mau para a sua saiide e no entanto nao
sofrem de subnutripao (ainda que se possam encontrar muitos malnutridos).
Nos paises pobres, e muito provavel que os habitantes da cidade saibam,
menos do que os do campo, o que lhes convdm e no entanto ha menos
subalimentados. Estudos levados a cabo na Africa Oriental demonstram, de
forma inequivoca, que os camponeses conhecem os alimentos necessarios
aos seus filhos. Eles nao tern e, infelizmente, os meios necessarios para os
obter em quantidade suficiente.
Ha ainda muito boa gente que pensa que para alimentar a fome no mundo
basta ir buscar alimentosaos lugaresonde elesabundam e distribuf-losonde
eles nao existem, atrav^s de programas de ajuda alimentar.
Mas a comida ocupa espaqo e deteriora-se, o que significa que a sua
conservaqao, transporte e distribuicao sSo caros.
Ainfraestrutura que e preciso montar corre o riscode custar maiscara que
o propno valor real dos alimentos. Como qualqueroutra forma de assistencia,
os programas de ajuda alimentar podem niSo ser apropriados ou devidamente
utilizados; por outras palavras, a sua accSo sobre a produgSo alirbentar local
e, frequentemente negativa. Os projectos "comida em troca de trabalho"
acabam muitas vezes e ironicamente por empregar pessoas que, de outra
forma, estariam a cultivar a sua propria terra, garantindo com isso a sua
sobrevivencia. Devido S necessidade constante de alimentos, a relaqao entre
o dador e o receptor gefa facilmente vinculosde dependencia. Torna-se facil
levar os beneficiarios a seguirem os "conselhos” dos dadores, ja que uma
interrupcao da ajuda alimentar provoca efeitos imediatos. E embora os pro
gramas multilaterais estejam mais isentos deste problema que os bilaterais,
tendem ainda assim a fomentar a dependencia.
0 planeamento familiar 6 outro exemplo duma intervenqao que nao altera
nada ao nivel de raizda pobreza. Ouve-se muitas v ezesdizerque a subnutricao e as infeccoes subsequentes resultam da contradiqao entre poucas
disponibilidades e demasiada gente. 0 planeamento familiar propoe-se
assim limitar a populacSo, ja que, para se passar a dispor de alimentos
suficientes para a populaqao existente, teriam de ser levadas a cabo alteraqoes radicals no sistema de propriedade da terra e no controlo da produqao
alimentar
O planeamento familiar pode, por outro lado. ter um efeito libertador para
as mulheres que o adoptam (o que nao acontece quando ele reveste um
caracter autoritario, como sucede em alguns paises). A questao esta em
saber quern decide da sua aplicaqao: sao as mulheres? ou os agentes de
planeamento, que formam em seguida o pessoal encarregado de convencer
os camponeses da necessidade de planeamento familiar?
A campanha mundtal contra a variola e muitas vezes
citada como um exemplo de intervenqao exterior bem
sucedida no dominio da saiide rural. E verdade que ao
primeiro sinal de um caso de variola diagnosticado, o mundo inteiro fica alertado,
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o que representa — sem sombra de duviPROBLEM*
da — um progresso para a humanidade.
HORROMTAL!
Mas o sucesso de um programs tern
tambem um lado negativo. E-se levado a
pensar que outras doenqas podem ser
vencidas da mesma maneira: pelavacinaqao. E infelizmente nao e sempre assim.
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A campanha contra a variola pode ser descrita como um programa verti
cal. Peritos mternacionais foram convidados a desenvolver uma tecnologia
em lugares muito distantes daqueles onde ela iria ser aplicada e a former
pessoal capacitado para a por em pttica. Este mbtodo tern, naturalmente,
implicates politicas. Parte do seguinte pressuposto: "Deixem os peritos
agir, eles e que sabem o que vos convbm". E se um programa vertical 6 um
redondo fracasso e nbo consegue diminuir os casos de uma qualquer doenqa,
ha sempre uma desculpa para os peritos.
A saude, explicam eles, b como um barril feito de v^rias pranchas. Se uma
falta, a agua escapa-se. O remhdio set pois criar mats programas verticals
integrados e coordenados (mas sempre de cima para baixo) para melhorar a
saude. Infelizmente na vida nunca 6 assim: ha sempre uma prancha que
falta.
nos de saude, deve ser a propria populat0 a identificar os seus problemas, a
determinar o que pode fazer — e FAZE-LO.
0 proprio conceito de cuidados primaries de saude e a experiencia adqui
nda nesta matdria provam que o desenvolvimento nbo brota de nenhum tipo
de colaboraqao intersectorial. As pranchas de um barril fabricadas pelos
peritos respondem mal bs necessidades das populates rurais. Mas seria
ainda mais errado confiar o seu fabrico a um qualquer departamento na
capital, para serem depois unidas umas as outras naz zonas rurais.
Muitas dificuldades tern ongem no factode o "desenvolvimento rural” ser
encarado pelas administrates nacionais e internacionais como um "projecto", enquanto que para as populates rurais se trata de um "processo".
Os programas verticais correm assim o risco de, apenas muito longinquamente, terem alguma coisa a ver com este processo, ou mesmodeo entravar.
Seria utopico esperar que a comunidade empreendesse colectiva e espontaneamente uma analise do desenvolvimento rural em todos os seus aspectos Algumas tecnicas sanity rias exigem conhecimentos que os camponeses
nao podemadquirirsozinhos. Comodizia umperitointernacional.a participacao nunca curou um epilbptico. O importante set ir fornecendo regularmente os rembdios apropriados. 0 problema tern portanto dois aspectos:
fomentar a participacSo e aplicar a tecnologia do desenvolvimento.
Levou muitos anos de investigate at se descobrir por exemplo. que se
podem tratar algumas formas de epilepsia pela administrate regular de
fenitoina sodica. Descoberto isto, nada mais simples que divulgar esta informato pelas aldeias.
Mas n3o set talvez t§o tcil fornecer os medicamentos e set muitas
vezes necessario efectuar acordos administrativos especiais para que sejam
estabelecidos sistemas de abastecimento eficazes. N3o queremos com isto
dizer que as decisbes tenham de ser tomadas por uma instancia superior ou
deixadas aos peritos. Uma vez estabelecidos os circuitos de abastecimento,
as pessoas que tern o mesmo problema — as familias de epilepticos, por
exemplo — podem juntar-se para verem em conjunto o que podem fazer. E a
isto que chamamos mbtodo horizontal, por opositoaos programas verticais.
N3o aos programas verticals
As desilusdes criadas pelos programas verticais fizeram nascer um maior
interesse pela participate da comunidade local. No campo dos cuidados
primaries, esta evoluto levou £ elaboraqSo do conceito de cuidados print-
6
Neil Andersson
que um antropdlogo extraterrestre, oriundo por hipotese
Sdeuponhamos
Jupiter, teria de apresentar um relatorio do seu trabalho de estudo
de campo levado a cabo no nosso planeta. dual seria a tese central do seu
relatorio? Muito provavelmente a "desigualdade". As pessoas na terra
dividem-se. diria ele, de tai modo que um punhado de gente possui riqueza
mas a grande maioria e pobre. Alguns tern poder, outros nSo tern nenhum. E
esta situacao mantdm-se assim, nao so atravds de uma repressao as Claras,
como ainda devido a subtis mecanismos de dependencia.
A desigualdade e predominante em todos os sectores da vida social,
incluindo oda saude. Frequentemente, uma pequena fracqaode uma popula
cao goza de boa saude e tern acesso a dptimos services, enquanto que todos
os restantes. a grande maioria, vegeta na miseria, privados de qualquer
serviqo eficaz. Nao e portanto um problema de inexistencia de bons services
de saude mas da sua injusta repartiqao Na minha opiniao, e va qualquer
estrategia de cuidados primaries de saude se nos limitamos a proprocionar
um sistema de services essenciais aqueles que os nao tern — tai como no
passado, a chamada estratdgia do "desenvolvimento comunitario" n3o conseguiu dar resposta as necessidades fundamentais dos camponeses pobres.
Para que possa dar resultados concretos, a noc3o de cuidados primaries de
saude tern de ser encarada como um conceito dinamico que tenha como
objective assegurar uma redistribuicSo do poder e dos recursos em favordos
pobres.
A historia ensina-nos que esta redistribuicao nunca se dara de uma forma
espontanea. Os pobres terao de se orgamzar para obrigara que reconhecam,
ou melhor, para impor os seus direitos. Os cuidados primaries de saude
podem, e devem, contribuir para uma organizacao eficaz da comunidade.
Gostava de analisar alguns factores que facilitam ou entravam a adesaoe
participacao da populacao aos cuidados primaries de saude. As minhas
conclusoes tiveram como base a minha propria experiencia neste dominio e
aquilo que pude observar no trabalho dos meus colegas.
Devido a situacoes socio-culturais diferentes, as comunidades podem
reagir de formas muito diversas a introduce do mesmo programa de cuida
dos primaries de saude. Os principals factores que entram em jogo na
determinacSo de uma resposta sSo a organizacao e capacidade de iniciativa
da comunidade, experiencias anteriores de lutas colectivas, conhecimento
dos problemas sanitarios e, mais que tudo isto, o modo como a economia
local se integra na economia nacional.
projecto de cuidados de saude de Quispicanchis constitui um bom
exemplo. Quispicanchis e uma provincia andina do Peru, que seesten-
O MITO DOS CUIDADOS
raWARIOS DE SAUDE:
estudosX
de
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COSOS
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de a sul de Cuzco, antiga capital dos Incas. A parte menos elevada (situada
ainda assim a uma altitude de 3.200 m)e constituida pelo vale de Vilcanota,
que a percorre de norte a sul. Bern irrigada e fertil, e atravessada por uma
importante estrada que une Cuzco a Puno. As principals culturassaoo milho,
a cevada, a batata, o feijao e fruta, algumas das quais chegam a dar duas
colheitas por ano.
A maior parte da provincia e, noentanto, constituida por altas montanhas,
com picos que ultrapassam 6.000 metros. Ai o solo 6 arido e rochoso; a erva
que ai cresce serve para alimentar.os rebanhos de lamas e ovelhas. As
parcelas ma is produtivasdao a penas batatas, e so de tresem tresou decinco
em cinco anos. A populacao, essencialmente India, viveem lugarejos disper
ses. E composta por agricultores de subsistencia, camponeses sem terra e
pastores. Apesar de estes camponeses (campesinos) produzirem a maior
parte dos bens de primeira necessidade. nao conseguem mesmo assim
sobreviver com as suas parcas colheitas. Ha por isso fortes migracbes sazonais para a selva amazonica, onde e possivelconseguirtrabalhoassalariado,
e um escoar migratorio permanente (sobretudo de jovens) para as grandes
cidades da costa.
A provincia divide-se em distritos. Nas capitals de distrito (entre 1.000 e
4.000 habitantes) vivem os mesticos, descendentes de Indies e espanhois.
S3o eles que controlam o comdrcio, a administracao e os transposes.
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Tradicionalmente, a terra pertencia a grandes proprietaries rurais, os
hacendados, que arrendavam pequenas parcelas ds familias de camponeses,
em trc-ca de m§o-de-obra gratuita. A Lei da Reforma AgrSria de 1969 veio
substituir os hacendados por uma burocracia de funcionarios, sem trazer
grandes melhorias 3 vida do campesinato. 0 nivel de desenvolvimento 6
muito baixo: a taxa de mortalidade infantil e, por exemplo, de 22,5% e a taxa
global de analfabetismo 6 de 85% (a quase totalidade da populapao feminina
ndo sabe ler nem escrever).
A atitude face aos problemas de saude 6 ainda tradicional em toda a
regido. Considera-se que a saude depende do equilibrio existenteentre duas
forgas opostas: quente e frio (todos os a lime ntosestSoclassificados segundo
este critdrio), homem e mulher.descendentes e antepassados. Se esteequilibrio (ayni em quechua, a principal lingua India local) se quebra, fica-se
doente. E o que acontece, por exemplo, quando um homem ndo cumpre os
seus deveres para com os antepassados, ou uma mulher prepara uma refeiqdo composta apenas de pratos frios. A cura s6 poderd chegar se o equilibno
for restabelecido graqas a ritos magicos ou a ofertas praticadas por pessoas
dotadas de poder sobrenatural. Mas, na prdtica, os tratamentos mddicos
levam-se a cabo sem recorrer muito a esta teoria mdgica, que 6 mais uma
filosofia tradicional da saude do que um entdrio prdtico. Com o decorrer dos
seculos, a populaq3oaprendeu a tratar muitasdoenqasetodaa gente tern um
certo conhecimento de medicina empirica. Alguns, fazendodisso uma profiss3o, tornam-se curandeiros (curanderos), comadres(comadronas) e endireitas (hueseros).
m grupo de padres jesuitas, que dirige uma escola para adultos nessa
Uarea,
convidou-me a organizar em Quispicanchis um sistema de cuida-
dos primdrios de saude. Fui contratado como medico distrital pelo Ministdrio
da Saude, a pedido das autoridades locais.e comecei a trabalharemOutubro
de 1974.
0 programs tinha por base um centro de saude com 6 camas situado em
Urcos (a capital da provinciate uma escola de educaqdo de adultos. Durante o
primeiro ano pusemos de pd um service de medicina curativa e o niimero de
consultas cresceu rapidamente. O enfermeiro ou eu prdprio iamos 3s comunidades rurais ver os doentes e discutir problemas sanitdrios com a populaqdo (da equipa faziam ainda parte dois auxiliares e um motorista-intdrprete).
Para muita gente este foi o primeiro contacto com a medicina ocidental.para
aldm dos medicamentos que se vendiam, ao domingo, no mercado. Submete-
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mos todas as crianqas da escola a um controlo mddico e organizdmos um
sistema de diagndstico comunitdrio; 3 excepqdo de um unico, todos os habitantes participaram; nos finais de 1975 tinhamos estabelecido contacto com
cerca de quarenta comunidades e tinhamos uma ideia muito clara dos pro
blemas sanitarios da regido, bem como do modo como a populaqSo local os
encarava.
Os dois anos seguintes foram consagrados 3 criaq3o de uma rede de
auxiliares de saude. Em quatro cursos de dez dias cada, foram formados 44
auxiliares, em representaqdo de 35 comunidades, designados pela prdpria
assembleia comunal, segundo um costume tradicional que vem do tempo dos
Incas. Entre os estagi3rios cont3vamos apenas com uma mulher, por ser
obrigatdrio ler e escrever. Os programas constavam de trabalhos prdticos,
discussSo critica dos problemas da saude e ainda de aulas de administraqdoe
teoria mddicas. Esta ultima consistia numa andlise das vinte doenqas mais
correntes: descriqdo dos sintomas, diagnostico, tratamento e prevenqdo. A
este respeito, a medicina ocidental proporciona os meios contra doenqas
transmissiveis (higiene, vacinas, antibidticos...) bem como meios de despiste
de doenqas por carencia (desidratapSo, malnutriq3o, avitaminose, etc.).
O sucesso deste programa, mais do que 3 formaqdo, deve-se 3 supervisee
exercida sobre osauxiliaresde saude. De 6 em 6 semanas recebem a visita do
enfermeiro que passa a noite no prdprio local; por outro lado, organizamos
periodicamente reunites para as quais s3o convocados. Durante estes
encontros, que duram dois ou tres dias, discutimos em conjunto os proble
mas que cada um tern em m3os; escolhemos ainda um tema mddico especial
(a tuberculose, por exemplo) e tentamos visualizar os problemas atravds de
"psicodramas". Uma boa parte do tempo 6 consagrada a comermos, bebermos e tocarmos musica juntos. Estas reunioes tern trazido um grande estimulo aos auxiliares de saude.
Uma vez implantado o programa de medicina curativa pelos auxiliares de
saude (de facto, de que serve falar de profilaxia enquanto nSosomoscapazes
de tratar das doenqas?), Ianq3mos programas de acq3o preventive a uma
escala modesta. Estes consistiam em campanhas de vacinaq3o, de luta
contra a tuberculose, de melhoramento dos pogos (para 3gua pot3vel), de
tratamento de hortas individuals ou em escolas, etc.
Fizemos questao em que a comunidade ndo sd escolhesse ela-mesmo o
seu auxiliar de saude, mas que fosse proprietdria do material medico fornecido e dos medicamentos distribuidos e que fosse ainda ela prdpria quern
avaliasse o trabalho dele, ao longo de reunioes periddicas.
Na pratica esta avaliapao deu-se muito raramente, mas estabeleceram
uma especie de compensapao para o tempo em que ele faltava ao seu
tr aba I ho. dispensando-o dastarefascomumtarias(faenas). Era ainda a aldeia
que fixava o prepo que o auxiliar de saude podia cobrar pelo seu trabalho
pao local. Estas diferenpas. a que se junta a experiencia ganha por Pinchi
muru durante a luta contra o grande dominio vizinho de Lauramarca (60.000
ha), explicam a razao pela qual as duas comunidades reagiram de modo tao
diferente ao mesmo programa.
Infelizmente. nos finais de 1977, dos 48 auxiliares de saude formados,
apenas 20 se mantinham ainda no seu posto. Os outros tinham-se visto
obrigados a procurar trabalho remunerado na selva amazonica.
Em Occoram, os habitantes nao manifestaram qualquer interesse pelos
cursos de formapao de auxiliares de saude. Nao tinham nenhuma vontade de
gastar os 7.000 soles (ceroa de $ 1 2 dolares USA) exigidos para eonstituir um
(undo rotativo destmado a compra dos primeiros medicamentos; ninguem se
sentiu atraido pelas reunifies publicas Ao contrario, Pinchimuru elegeu logo
um aldeao para o primeiro curso de formapao. Os problemas sanitariosestao
frequentemente na ordem de trabalhos das reunifies eomunitarias onde as
actividades do auxiliar de saude foram avaliadas varias vezes. Os seus
servipos sao frequentemente pedidos, tanto mais que ele e o filho do curandeiro local e que aplica uma mistura de medicina tradicional e de medicina
ocidental. Mesmo assim, quando ficou decidido que era preciso proteger os
popos, ninguem se apresentou para trabalhar, a exceppao dos membros da
sua propria familia.
interessante ainda do que as caracteristicas do nosso programa de
Mais
cuidados primaries de saude, foi o modo como reagiram as diversas
comunidades. Seleccionnamos tres a titulo de exemplo. Uma delas — Occoram — recusou toda e qualquer colaborapao Uma outra — Pinchimuru —
colaborou com o nosso programa. A terceira — Pampaccamara — tomou
algumas iniciativas no sentido de o dar a conhecer. Como e que se explicam
reacpoes tao diferentes?
Em primeiro lugar e preciso ter em conta a diversidade das condipoes
econdmicas. Occoram, onde o programa foi recebido com uma completa
apatia, e. de longe. a mats pobre das tres comunidades Dir-se-ia que ha um
limite abaixo do qual o numero de intervenpoes susceptiveis de mobilizar a
populapao e extremamente reduzido Os camponeses de Occoram tinham
sido ate 1972 os colonos das terras de Mollabamba. Recusaram aderir a
cooperativa recentemente fundada no quadro da reforma agraria, por temerem cair sob o predominio dos camponeses de Mollabamba, onde a terra e
mais fertil.
O solo onde eles cultivam e muito arido Para comunicar com o mundo
exterior, tern de descer durante horas uma vertente escarpada ate ao vale de
Vilcanota. A regiao e de tai maneira pobre que a maior parte dos adultos a
abandonam durante alguns meses por ano para irem trabalhar na s^lva
amazonica e muitos jovens a abandonam definitivamente.
Em Pinchimuru, a populapao nao vive muito melhor. Em 1965, os campo
neses tomaram a iniciativa de comprar terra ao proprietario rural para a
repartirem em partes iguais entre as 69 familias. Estavam organizados e
tinham uma direcpao. Enquanto que em Occoram a comunidade tinha vivido
ate 1972 sob um representante do hacendado, o dono da terra, cuja unica
preocupapao era que se cumprisse com o trabalho da hacienda, Pinchimuru
tinha uma forte tradipao de auto-responsabilidade: reune-se frequentemente para discutir os seus problemas e possui uma elite dirigente que
organizou a retomada das terrase se mantem emoontactocom a administra-
Popos melhorados — com pouco dinheiro — construidospor tres familias de
Quispicanchis.
9
Em Pampaccamara a resposta da comunidade foi ainda mais entusiasta.
Os habitantes tinham ouvido falar do programa e quiseram saber mais
informapdes. Por sua iniciativa, escolheram urn seu representante para
participar do curso de formaqao de auxiliares de saude. Antes mesmo de o
programa se iniciar, a comunidade tinha construido com muito esforqo e
pesados gastos um dispensario e uma casa para o agente de saude. Os
chefes da comunidade, envolvidos nos seus ponchos, foram atd Lima, a
capital, pedir ao Ministro da Saude o envio de um medico para
Pampaccamara.
Por que razao tera sido tao diferente a atitude de Pampaccamara da de
Occoram ou de Pinchimuru? Em primeiro lugar, em Pampaccamara o solo e
mais rico e cada famiha dispoe de mais terra. E possivel, por isso, comercializar uma parte da colheita Metade dos homens, aproximadamente, sao
comerciantes. Segundo, enquanto em Occoram e Pinchimuru as familias se
veem obrigadas a vender um carneiro ou parte das suas provisoes quando
tern grande precisao de dinheiro, os habitantes de Pampaccamara tern aparentemente as suas economias. Ha ainda outras diferenqas. Pampaccamara
era ja uma comunidade India antes de 1923 (uma comunidade India e uma
forma especial de organizaqao comunitaria fundada segundo tradicoes
ancestrais e que foi reconhecida pelo Governo a partir de 1920 — varios
textos legislatives modelaram o seu estatuto jun'dico). Pampaccamara tern
uma grande tradiqao de luta, por vezes violenta, contra osgrandes proprieta
ries vizinhos, muito especialmente contra o dominio de Ccamara. Tudo isto
contribuiu para constituir uma comunidade solidamente enquadrada e
cimentada
Nas tres comunidades em questao, a interpretaqao dos problemas de
saiide e essencialmente tradicional, mesmo que tenham havido diversas
influencias na forma como cada uma acolheu o programa de cuidados prima
ries de saiide Em Occoram apenas se pratica a medicina tradicional e muito
raramente se tenta aplicar a medicina ocidental. Em Pinchimuru, a situaqaoe
mais ou me nos identica, mas ha um maior contacto com a medicina ocidental
e os camponeses tern maisconfianqa na sua eficacia. Vaofrequentemente ao
dispensario, que fica distante, e que funciona sob a dgide do Ministerio da
Saude.
Em Pampaccamara, em virtude das relaqdes estabelecidas com os meios
urbanos, a populacaocomeqa a ter uma concepcao mais moderna dos proble
mas samtSrios. Assim. sem rejeitar completamente as crenqas tradicionais,
foi praticamente opiniao unanime entre os aldebes que era necessario poder
contar com os serviqos de um hospital e de um medico para os seus 1.200
habitantes.
A
interpretaqao dos problemas de saude parece, sem duvida, ser um
factor importante no tipo de resposta de uma comunidade ao programa.
Nos casos em que a interpretaqao e apenas de ordem tradicional. nao so sao
de muito dificil aplicaijao os programas de cuidados primaries de saude, mas
aparentemente so saoaceites soluqoes individuals. Se uma pessoa adoece, a
culpa e dela, de nao ter mantido o equilibrio tradicional essencial a saude.
Perante tais atitudes e de facto dificil levar avante um programa de cuidados
primaries de saude, para o qual e essencial a forma como a comunidade
reage.
10
As reaccoes de uma comunidade dependem principalmente das suas
proprias caracteristicas, mas dependem tambem do conteudo que the e
proposto enquanto ajuda concreta.
equipamentos e ao desenvolvimento do programa, a comunidade esta a
fortalecer o seu controlo sobre os factores que determinam as suascondipbes sanitarias. Esta seria a minha definiqao de participapao.
Em muitos paises. a estratdgia dos cuidados primarios do saude pode
provocar um confiito entre medicina tradicional e medicina ocidental. Conf litos anteriores na America Latina, a introdupaodocristianismo ouda tecnologia agraria por exemplo, provaram ser repressive® e destruidores dos
sistemas pre-existentes. 0 aparente optimismo das alias esferas internacionais do poder, quanto as possibilidades de integrar a medicina tradicional na
ocidental. nao parece ter qualquer razao de ser. pelo menos na America
Latina. Integrar estes dois sistemas de cuidados de saude pressupoe algum
nivel de respeito mutuo e igualdade basica entre as pessoas, o que de facto
nao acontece. A medicina tradicional corresponde a "cosmovisao'da comu
nidade: os seus membros compreendem os seus metodos e a comunidade
possui um alto grau de controlo sobre ela. A medicina ocidental, bem pelo
contrario. nao so nao e compreendida, como e controlada por burocratas de
fora e estrangeiros. Sendo assim, nao e para admirar que a reaeqao das
comunidades seja cautelosa — pronta a fazer dela uso se houver nisso
vantagens, mas relutante em assumir responsabilidades por ela.
ilia el Salvador, um bairro de lata a cerca de 13 km do centro de Lima.
™ constitui um bom exemplo do que pode ser feito. Aqui, como em outras
cidades da America Latina, afluem periodicamente autenticas ondas humanas, a medida que as economias rurais se afundam, e ocupam "ilegalmente"
os baldios
Outra causa de desconfianpa e reserva por parte das comunidades reside
no extraordinario autocentrismo de alguns projectos de cuidados de saude,
pelo menos dos 7 que eu estudei. Os agentes encarregues dos cuidados
primarios de saude estao intimamente convencidos de que sabem o que
melhor convem as comunidades Nao se preocupam nada em estudar com
seriedade as prioridades existentes. Nem sequer admitem que as comunida
des lhes exponham as suas proprias conceppoes dos problemas. 0 cinismo
dos burocratas da saude torna-se, neste aspecto, ingenuo. Aos seus olhos, a
"participapao" consiste em obter das comunidades o financiamento dos
projectos concebidos & distancia. Ora nunca havera um programa de cuida
dos primarios de saude verdadeiramente eficaz se a comunidade nbodefiniu
as suas proprias prioridades. se nao foi ela propria a escolher entre as
estrategias possiveis e se nao tomou em maos a sua execupao.
Os agentes de saude tern um papel especifico a desempenhar, ja que as
comunidades nao possuem os conhecimentos tecnicos que lhes permitam
prever todas as consequencias das suas oppoes. Ao analisar os problemas
com os trabalhadores da saude e coIocar questoes quanto a prioridade dos
Desde o primeiro ano de existencia de Villa el Salvador (isto e, em 1972),
os seus habitantes uniram-se para resistir ao cerco das forqas da ordem e se
defenderem contra os ladroes. Criaram "comites de vizinhanpa" e construiram cabanas de esteira, escolase um dispensario, puseramde pe um sistema
de estrumeiras e resolveram o problems da agua.
A saude tornou-se um assunto importante nas discussoes semanais dos
"comites de vizinhanpa", pois nao havia nenhuma assistencia oficial para os
primeiros 50 000 habitantes da zona. As mulheresdavama luzsem qualquer
assistencia medica. Muitos recem-nascidos morreram de diarreia, calor
abrasador, falta de agua e ausencia de condipbes minimas de higiene.
Os "comites de vizinhanpa" chegaram a conclusao de que necessitavam,
antes de mats, de um hospital Por cada quarteirao de 24 casasfoi designado
um representante responsavel pelos problemas da saude e encarregado de
levar a cabo manifestapbes sociais: bailes, quermesses, etc., com o objective
de recolher fundos para a construpao do hospital. Colectivizaram e centralizaram medicamentos nas "farmacias populates" onde, em caso de necessidade, se podiam obter gratis. As queimadasdas estrumeiras e a limpeza das
ruas deviam fazer-se aos domingos. Estas foram as primeiras iniciativas
espontaneas da populaqao no dominio da saude.
Mais tarde, foi oonstituido um conselho de saude, formado por 60 representantes dos quarteiroes que, com o apoio de professores e estudantes de
Medicina da Universidade de S. Marcos de Lima, estabeleceu um programa
sanit^rio.
Este piano tinha como base um diagnosticodoestadode saude da comuni
dade, estabelecido pelos prbprios vecinos (vizinhos, moradores).
11
e no comercio (lojas e mesmo um banco comunitario), tinham interrompido
temporariamente as suas actividades.
Yiy ste artigo tern por titulo: "0 mito dos cuidados primaries de saude". Os
mitos nao resultam, em geral, de acontecimentos histoncos precisos.
O importante e a mensagem que transmitem. £ o mesmo com os cuidados
primaries de saiide. Como no caso dos mitos, podemos por a sua existencia
em questao. Um sistema de cuidados sanitarios, concebido expressamente
para os pobres.d poucodesejivel, poiscorre-se oriscodecriar para ospobres
um sistema "a baixo custo" e de manter um service caro e tecnicamente
complexo reservado para os ricos. Ora, o que deveria existir era um unico
sistema de cuidados de saiide para todos.
A desigualdade no que se refere a saiide e ao acesso aos servipos de saiide
e uma consequencia da desigualdade da estrutura do poder, a qual resulta
por sua vez da permanente apropriapao dos recursos dos pobres pelos ricos.
Assim, a atenpao dada aos cuidados primaries de saiide deve-se avaliar nao
so pela sua eficicia no piano medico, mastambem pela sua eficacia no piano
politico.
Quando travel conhecimento com o projecto em 1978, ou seja, 6 anos
apos a fundapao de Villa elSalvadorfcujo niimerode habitantes ultra passava
por essa altura os 130.000), a maior parte dos representantestinha recebido
uma formapao de auxiliares de saiide. Tinha sido construido urn centro de
saude comunitaria e diversosprogramastinham sido levadosa cabo. Embora
ai trabalhasse um pequeno grupo de medicos e enfermeiros profissionais,
continuava a ser a comunidade a responsavel plena pelos programas.
O projecto tinha gerado um vasto debate sobre a saiide entre os habitantes
do bairro de lata. Um deles afirmou-me que, segundo ele, "a saiide consiste
em dispor de todos os meios necessities para lutar vitoriosamente contra a
injustipa social". E nao era nem um politico nem um agente de saude.
O programs nao so sensibilizou a populapio para osproblemassanitarios,
mas ensinou-a a organizar-se por si propria. 0 centro hospitalar veio a
tornar-se o principal centro das actividades comunitirias; na altura da minha
estada, os outros sectores, principalmente a produprlo (empresas colectivas)
12
As comunidades que ati aqui so muito marginalmente tinham acesso a
servipos sanitarios condignos comeparam a perceber o seu impacto libertador. E possivel que elas nao conhepam o vocabulario apropriado para o
exprimir, e possivel que elas nao falem, por exemplo, de "redistribui?ao"ou
de "emancipapao”, mas a sua tomada de consciencia e evidente, atraves do
acolhimento prestado aos programas de cuidados primaries de saiide. Se
estes sao elaborados e dingidos por elementos exteriores, nao iriodesaguar
de certeza na emancipapao; a comunidade permancera "passiva". O pessoal
sanitirio fa la r a entao de "resistencia a mudanpa", mas na realidade a passividade nSo 6 outra coisa senio osinal de que a comunidade naoesta a contar
tirar nenhum proveito concrete dos programas.
Pessoalmente, enquanto parte do pessoal de saiide, sou levado a crer que
ascomunidades tern uma intel igencia maisaguda das implicapdes doscuida
dos primaries de saiide, do que a maior parte dos meus colegas e de eu
proprio. •
Neb reg;des tropicaise subtropicais. o tempo ma;s dificil do ano para os pastores e a estacyc seca em que pouca agua encontram para os animais Mas para todosos outros cam
poneses. a maioria. o periodo mats duro e a estacSo humida. entre o inicio das chuvas e o
fim da colheita Os alimentos escassciam e o seu custo e muitoelevado, aseconomias esgotam-se e o trabalho agricola e dificil. As chuvas tropicais favorecem a proliferacao de transmissores de doencas. como os mosquitos, e a propagacao de infeecdes provocadas por fungos e bacterias Multiplicam-se os casos de diarreia quando as chuvas arrastam as fezes
para reservas de agua nao potavel Muito frequentes sao ainda os casos de paludismo, a
febre "dengue", o verme da Gume, as infeecdes cutaneas. Sob o efeito do calor e da humi
da de. os alimentos contaminam-se com facilidade A populaqao enfraquecida pelos trabaIhos penosos e pela subahmentacao a que esta entretantosujeita oferece ainda menos resistencia a doenca.
As mulheres e as criancas tornam-se particularmente vulneraveis As camponesas costumam deixar de amamentar quando chegam as primeiras chuvas. o que leva a que a dieta
mfantil se tome menos nutritiva. Muitas mulheres chegam ao fim do seu periodo de gravidez nesta altura. pois a grande maioria dos bebes e concebida nos meses que se seguem a
colheita. Executar trabalhos pesados 6 perigoso nao so para a mae neste estado adiantado
da gravidez. mas para o propno bdbe que vai nascer
Sao os camponeses pobresque acarretam com o pesodasestacdes.Temdeassegurara
sua subsistence para o futuro; os camponeses sem terra aceitam qualquer trabalho a troco
de algum salario Esta e a epoca do ano em que os pobres se tornam ainda mais pobres
Basta que a reserva de alimentos se esgote ou a doenca bata a porta para que tenham de
vender tudo o que possuem ou endividarem-se.
Sabe-se pouco dos problemas relacionados com a estacdo humida. porque a maior parte
dos inquentos de saude rural s3o efectuados durante a estacdo seca. quando as deslocaCdes sdo mais faceis. Os agentes-de saude. formados na sua maioria nas cidades, apenas
tern uma ideia muito vaga do que 6 cadaestacdodoano. Algumasdas medidasa tomar, para
atenuar a sua incidence sobre a saude, s3o bem conhecidas. a questSo e que algumas levantam por sua vez outros problemas. A irrigacSo permite regulanzar o abastecimento de
agua O trabalho migratdrio permite aumentar as reservas para a estacSo humida, mas os
beneficios obtidos ndo compensam automaticamente os inconvenientes que provocam.
Entre varias medidas uteis, citemos a instalacSo de creches temporaries para as criancas
cujas mdes tern de trabalhar, e todas as tecnicas susceptiveis de aliviar a mulher dos varios
trabalhos gratuitos que lhe incumbem, como por exemplo a tarefa de ir buscar dgua Seria
muito desejavel que os agentes de saude tomassem conhecimento das particularidades de
cada estacdo do ano e abastecesem os seus centros de saude no meio rural em funedo das
epocas mais dificeis
ni a Guine-Bissau, mobilizar o povo para nao aceitar ascondicoesde vida
111 que lhe tinham sido impostas pelo colonialismo, foi a chave da luta
conduzida pelo movimento de libertacao e contribuiu muitlssimo para o
acesso do pais& independencia em 1974. Maistarde, no prosseguimentodas
estrategias de desenvolvimento, a mobilizacSo popular manteve-se na ordem
do dia para a alteraqao das condipoes do pals, principalmente no sector da
saude.
Os responsSveis pela saude na Guin6 Bissau lanparam urn programa
nacional, no ambitodo qua I os agentes de saude ajudariam os camponeses a
resolverem eles proprios os seus principals problemas sanitarios. Perante
taxas de mortalidade infantil de criancas de menos de 5 anos que atingiam o
limiar dramatico de 40 a 50%, seria facilfortalecera adesao popular £ politica
governamental e conseguir que a mobilizapao se estendesse a outros dominios, uma vez que estas taxas alarmantes fossem reduzidas. Em contrapartida, services e projectos de saude que nao tragam resultados visiveis,
arriscam-se a criar novos problemas em vez de resolver os existentes, por
mais bem intencionados que sejam. Umfracasso nesta materia levara facilmente os camponeses a pensar que as autoridades nao estao realmente
interessadas em resolver os seus problemas. Nao e pois possivel mobilizar
energias para urn projecto de saude se nao se atingem as causasda deteriorac3o da saude e de uma mortalidade elevada.
13
Ora precisamente para melhor conhecer estas causas, o Ministbrio da
Saude da Guine-Bissau elaborou um project© de investigacao ir.terdisciplinar com o apoio financeiro da SAREC (Agencia sueca de cooperspao em
investigacao com os paises em vias de desenvoivimento). Foram efectuados
inqueritos sobre o valor nutritive do regime alirnentar numa cidade e em 5
regioes rurais, representatives dos principaisgruposetnicos ezonasecologicas do pais. Com o firn de obter urns estimative precisa das taxas de mortalidade infantil, bemcomodo impactode algumas medidasde accaopreventiva,
iniciou-se o estabelecimento de estatisticas oficiais de nascimentos e obitos
nestas mesmas regibes.
O projecto centrou-se, inicialmente, nos problemas relacionados com a
produpao e o abastecimento e os habitos alimentares, pois pensava-seque a
gravidade das infecpbes que levava a uma tao forte mortalidade infantil era
devida a subnutripao. Mas cedo se constatou que se tornava dificil determi
ne r exactamente a incidencia de qualquer alterapao nas prbticas de alimentapao. Acabou por se concluir que, dadas as actuals condipoes da
Guine-Bissau, nao se ganhava muito em melhorar os habitos de nutripao,
como introduzir rapidamente uma alimentapbo complementar ou fazer
aumentar o numero de refeipoes por dia. Em contrapartida, infecpbes frequentes tern uma influencia evidente no estado de nutripao das crianpas e
assim tornava-se urgente combater as causas das altas taxas de infecpbes.
Estas eram particularmente elevadas em familias numerosas e em lares
poligamicos com muitas crianpas pequenas, o que levava a supor que uma
superlotapao habitacional 6 prejudicial b saude. Esta opiniaofoi confirmada
pela elevada taxa de mortalidade nesses lares.
Uma terrivel epidemia de sarampo que vitimaria 18%dascrianpasatingidas viria pdr em evidencia, no decurso do inqubrito efectuado, a importancia
relativa do excesso de povoamento e de subnutripbo. 0 estado de nutripbo
anterior b epidemia tmha pouca ou nenhuma relapao com a probabilidade de
sobrevivencia. Significative foi o facto de a taxa de mortalidade ser muito
ma is elevada nas casas em que varias crianpas tinham contraido sarampo ao
mesmo tempo. Paralelamente, verificou-se que uma vacinapao sistembtica
contra o sarampo provocava uma diminuipbo sensivel na mortalidade
infantil.
Das investigapoes efectuadas concluia-se assim que muito provavelmente seria preferivel combater em primeiro lugar a superlotapao habitacio
nal, antes de introduzir prbticas de nutripao melhoradas. Nao hb duvida de
que se torna dificil modificar a morfologia da familia e as normastradicionais
14
da construpao de habitapoes, e mais estudos teraode ser levadosa cabopara
definir de uma forma precisa os factores que tern um efeito negative sobre a
saude Todavia, do ponto de vista da participapao popular, e mais racional
promover alterapbes que tragam resultados visiveis — mesmo se o processo
for longo e arduo — do que divulgar inovapoes facilmente aceitaveis mas que.
na verdade. tenham um impacto minimo.
As conclusoes deste projecto contradizem, pois, a tese segundo a qual
intervenpoes a nivel da nutripao tern um papel muito importante na redupao
da mortalidade. Do ponto de vista metodoldgico, as investigapoes efectuadas
neste projecto sao mais seguras do que algumas outras realizadas sobre o
mesmo tema (ver na bibliografia abaixo, Gwatkin e col.) Contudo, pode
sempre argumentar-se que as condipoes deste pais sao, porventura, diferentes, que a subnutripao e possivelmente inferior e que portanto se torna
menos importante enquanto factor determinante.
Seja como for, a principal conclusao mantem-se v^lida. Se se quer mobilizar uma comunidade para melhorar o seu estado de saude, esta mobilizapao
tera de se centrar em questoes cruciais, em que esteja em jogo a vida e a
morte. Reduzir a participapao da comunidade a ritos ea intervenpoes que nao
arrastam consigo mutapoes profundas explica aquilo a que chamamos "fracasso da participapao popular na aepao sanitaria". Para determinar quais
sao, em cada caso, as chamadas questoes cruciais, ha que analisar as
necessidades locais. Estatisticas locais dos nascimentos e obitos podem
servir de ponto de partida para esta anilise. Pormenoressobre os metodosde
elaborapao podem ser pedidos aos autoresdo relator io (ver bibliografia, Aaby
e col.). •
Extracto de um estudo
Referencias bibliogrdficas
Gwatkin, D.R.. e col., "Que esperar das intervenpoes no dominio da saude e da
nutripao?". Forum Mundial da Saude. OMS, Geneve. Vol.2. n° 1, 1981 (editado em
trances, ingles, arabe, chines, espanhol e russo).
Aaby P„ e col.. Child Mortality in Guinea-Bissau: Malnutrition or Overcrowding?. Insti
tute of Ethnology and Anthropology, Copenhagen Univesity. Frederikholms Kanal 4,
DK-1220 Copenhague K, Danemark. 1981 (apenas em ingles; prepo: EUA S6)
(e d.e^eaw'olvixn.ento rural
O objective das instalapoes sanitarias e permitir a evacuapao dos excrementosem condipoesde higiene. Nos paises pobres.tresemcada qua tro pessoas nao possuem instalapoes sanitarias, sendo a percentagem de
90% no meio rural e de 50% no meio urbano. Nos ultimos 20 anos, oritmodo
aumento populacional e superior ao niimero de pessoas que pela primeira
vez dispoem de instalapdes sanitarias. Segundo dados da OMS, o numerode
pessoas que vivem sem condipoesde saneamento passou de 1.350 milhoes
em 1975 para 1.730 milhoes em 1980
Condipoes sanitarias impr6prias e doenpas
Mais de 50 doenpas estdo relacionadas com mas condipoes sanitarias.
Elas s3o transmitidas quer por mSos, alimentos ou utensilios de cozinha mal
lavados, quer pela ingestao de dgua contaminada ou pelo contacto com a
pele. Algumas moscas e mosquitos, transmissores de infeepoes, podem
reproduzir-se nos excrementos.
As doenpas ma is correntes transmitidas pelos excrementos sao as parasi
toses intestinais (e outras variedades especificas de certas regioes); ascomplicapoes diarreicas, pnncipalmente a colera, febre tifoide, paratifoide.
salmonelose e amibiase; e outras, tais como a bilharziose, a hepatite infeciosa, a leptospirose e o tracoma.
por Piers Cross e Mell Andersson
Segundo a OMS, 80% destas doenpas sao provocadas pela agua ou por
mas condipoes sanitarias. Na India, onde mais de metade da populacao nao
possui instalapoes aceit^veis para evacuar os desperdicios, afalta de higiene
e responsevel, de uma forma ou de outra, por 40% das doenpas, tratadas nos
dispensaries publicos. Na Nicaragua, com uma populacao de 60%de camponeses e em que 60% nSo tern condipoesde saneamento ou nao dispoe delas
em numero suficiente, 80% dos habitantes tern parasitas intestinais. No
Panama, mais de metade da populacao nSotem qualquer sistemade evacua
pao de excrementos e a mortalidade deve-se, na mesma proporpao, a doenpas transmitidas at raves da agua. As diarreias e as enterites causadas por um
ambiente poluido sao a principal causa da morte das crianpas, com idade
inferior a 5 anos, na maior parte dos paises do Terceiro Mundo.
15
A relaqao entre a higiene e a saude e bem mais profunda do que a
transmissSo de infecqoes. A ausencia de higiene 6, como a subnutriqSo, a
dependencia e a impossibilidade de ter acesso
fontes do saber, um dos
aspectos da pobreza. ,A conjugaqao destes factores est£ bem documentada
no exemplo que se segue, da Africa do Sul, sociedade tristemente conhecida
pelas suas desigualdades minuciosamente regulamentadas. Os services
sanitarios e sociais, em que se englobam os services de higiene, reflectem
essas desigualdades.
Tomemos o caso de uma cidade qualquer -Vereenigmg, por exemplo); 98%
das habitaqdes ocupadas por brancos tern acesso a um sistema de eliminaqao de aguas residuals, caro e eficaz. Mas 93%dasfamilias negrastem de se
contentar com o sistema de despejo & distancia, o que 6 insatisfatorio e
anti-higienico. As consequencias samt^rias sao facilmente previsi'veis: nas
regides urbanas, 99% das crianqas negras tern parasitas, contra apenas 6%
entre as crianqas brancas da mesma idade. Iniciativas locais susceptiveis de
constituirem uma ameaqa a esta situaqSo de privildgio dos brancos s3o
reprimidas sem piedade.
Existem, noutros paises, exemplos deste tipo, porventura menos flagrantes, da repartiqao desigual dos recursos, especialmente evidentes entre o
campo e a cidade.
Saneamento e saude publica
Apesar da bem documentada relaqao entre fezes nSo convenientemente
eliminadas e doenqa, o impacto exacto do melhoramento das condiqoes
sanitSrias nSo 6 muito fScil de determinar. Estudos recentes efectuados em
vcirios paises assinalam uma sensivel regressSo da doenqa: por um periodo
de 15 a 20 anos, casos de tifdide teriam diminuido de 60 a 80%, de colera de
80%, de ascardiose e parasitose de 50%, de bilharziose cerca de 50%. 0
saneamento e pois uma das condiqoes indispens^veis para a melhoria da
saude e deveria ser um dos elementos essenciais do desenvolvimento rural.
Na pratica, pordm, os paises do Terceiro Mundo veem-se obrigados a repartir
os poucos erdditos por vSrios sectores e a estabelecer prioridades. As princi
pals medidas de saude publica que entram em concorrencia com o sanea
mento sao os programas de abastecimento de £gua e de vacinaqSo. 0
abastecimento de 3gua 6 em geral mais dispendioso do que o saneamento e
implica habitualmente o apoio de t6cnicos estrangeiros. Os trabalhos de
saneamento, embora saiam mais baratos e dispensem a utilizaqSode t6cnicos estrangeiros, muito raramente se lhes atribui importancia no desenvolvi
mento rural. Ensaios controlados, levados a cabo nas Filipinas entre 1968 e
16
1972, demonstraram que os riscos de colera foram 3,1 vezes inferiores em
locais onde havia saneamento, 3,7 inferiores em locais servidos por abasteci
mento de agua e 4,2 inferiores em locais onde as duas medidas tinham sido
aplicadas em conjunto. Este inquerito prova que o saneamento pode contribuir para a melhoria da saude a uma escala identica a do abastecimento de
agua e a custos inferiores. Osprogramasde abastecimentodeagua levantam
outros problemas: para reduzir substancialmente os riscos de propagaqaode
doenqas e precise provavelmente instalar canalizaqoes; ora se estas nao
ficam bem instaladas e nao forem bem conservadas podem produzir-se
fugas, as instalaqoes podem poluir-se e mesmo aproximar dos habitantes os
focos de mfecqao.
A vacinaqao e outra concorrente do
saneamento quanto a obtenqao de fundos, nos programas de luta contra as
doenqas infecciosas. E um facto que, por
exemplo, a vacinaqao em massa contra a
febre tifdide, que imuniza durante alguns
anos, traz vantagens a longo prazo e tern
efeitos imediatos. O saneamento, porem,
tern vantagens a mais longo prazo e efei
tos multiples. A sua tecnologia e talvez
mais facilmente dominada e adaptada a
situaqao local. Ele pode assim reduzir progressivamente a dependencia em relaqao
ao Governo nacional ou aos organismos
internacionais e representa uma contnbuiqSo substancial para o desenvolvi
mento rural.
T6cnicas de saneamento
Graqas ifs mutaqoes sociais, os dispositivos indigenas de eliminaqao das
fezes tornaram-se antiquados e impraticaveis em muitos paisesdoTerceiro
Mundo. 0 desenvolvimento e a expansao demografica criaram novas concentraqoes populacionais que tern necessidades diferentes em materia de
saude publica: a escolarizaqao obrigatoria, por exemplo, ao concentrar as
crianqas, torna indispensaveis sistemas melhorados de evacuaqao. E necessario lanqar mao de tecnicas mais complexas, pois as soluqoes tradicionais,
como retretes ao ar livre, sao completamente inadequadas.
Icttrinos vertUo®s
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rentam voar pa<a
Mefl.aoru'aBem
melhoradas. A «u*
°orta e Me.
oseucu5toMn-
,de^8M.Harare,Z—denea.
A tecnologia do saneamento foi durante muito tempo dominio dos engenheiros. Atb ha po.rco tempo, achava-se normal que as instalaqbessa nitarias
dos paises doTerceiro Mundo copiassem o modelodasdos parses indust ria lizados onde, logicamente, se tinna optado por sistemasde diluipao hidraulica.
A transferencia destas tecnicas para os paises em vias de desenvolvimento
foi um desastre. Os modelos exportados exigiamgrandes investimentos, nao
tomavam em conta nem as necessidades nem os recursos das economias
locais e pressupunham uma infraestrutura moderna, cuja manutenqao
implica profundos conhecimentos tecnicos. Por volta de meados dos anos 60,
tornou-se evidente que as solucoes ocidentais nao se adaptavam nada a
cidades como Calcuta na India, por exemplo, onde os esgotos abrem conti-
nuamente fugas, transbordam, entopem, queimam crbditos preciosos a
saude publics para fornecer um serviqo que 6 mediocre e que co’ntempla
apenas uma pequena fracqbo da comunidade Nas regibes rurais esta inadaptaqbo 6 ainda mais patente.
De hb uns anos para cb. surgiu um fluxo de tecnologias "apropriadas" ou
"intermbdias" que tentaram ocupar o vazio existente entre as tbcnicas indi
genes e as tbcnicas importadas de custos mais elevados. Algumas trazem
grandes esperanqas para as regibes rurais do Terceiro Mundo. Existe hoje
uma gama de sistemas de evacuaqbo de matbrias fecais: fossas, latrinasde
poqo, retretes que transformant as fezes em adubo, sistemas de transpose e
estabilizaqbo dos despejos, produqbo de algas e plantas aqubticas, produtores de biogas e fbbricas de adubo (os trabalhos citados no anexo content
informaqbes mais completas sobre tbcnicas e metodos de construqbo).
As tecnologias intermbdias caracterizam-se pela exigencia de um alto
coeficiente de mbo-de-obra, dbo prioridade bs iniciativas de pequena escala,
sbo simples e acima de tudo pouco dispendiosas. Esta ultima caracteristica,
no entanto, apoia-se numa noqbo que b falsa: a de que a melhor forma de os
camponeses participarem b cavar buracos na terra. Verificou-se que o entusiasmo suscitado por este tipo de sistemas coincidiu com a recessbo econbmica dos finais dos anos 70 e principio dos anos 80, em que a primeira
preocupaqbo daqueles que detinham os cordbes da bolsa era apertb-los. N3o
temos nada contra as tbcnicas de baixo custo e elaspodem ter, muitasvezes,
uma vantagem substancial em comparacbo bs que exigem custos muito
pesados, mas nbo b apenas reduzindo a exigencia de capitals que se encontra
uma resposta para as necessidades dos camponeses. As grandes questbes
que se pbem sbo: quern escolhe a tecnologia? quem a desenvolve? quem
controla a sua aplicaqbo?
Participaqdo comunit^ria
Grosso modo, podemos agrupar a participaqbo comunitbria no sanea
mento rural em tres categorias. Primeiro, hb as grandes obras publicas de
saneamento, nas quais a participaqbo popular mais nbo b do que uma figura
de estilo. Hb, em segundo lugar, os projectosde saneamentoque englobam, a
diversos niveis, uma participaqboda comunidade, com o objective de conseguir que a colectividade colabore na extensbo das instalaqoes sanitbrias. Hb,
em terceiro lugar, os projectos de saneamento queconstituem em si prbprios
um meio de mobilizar a populaqbo local com vista b transformaqbo radical da
sociedade.
17
Uma participapSo comuniteiria meramente formal
O indice excepcionalmente elevado defracassosem muitos programasde
saneamento poe em evidencia as deficiencies das solupoes t6cnicas planeadas nos servipos centrais e apresentadas com um lindo discurso. No que
respeita a participap3o.comunit£ria, n3o se preve, na maior parte dos casos,
qualquer financiamento (supde-se que a m3o-de-obra sera sempre gratuita,
logo a participapSo popular esta conotada com um sistema de baixo custo).
Em certo pais afncano, um programa de saneamento das escolas prima
rias. cuja execupSo foi confiada a populapSo local, redundou num enorme
fracasso. 0 piano dos trabalhos, elaborado sem estudo pravio do terreno,
baseava-se numa estimativa exterior das necessidades, sem ter em conta as
opinioes dos camponeses e dos alunos, nem mesmo os preconceitos locals
quanto 3 utilizapdo de latnnas. E no entanto contava-se que os alunos e os
camponeses trabalhassem gratuitamente neste projecto. No final da primeira fase do programa, estava previsto que 60% das escolas estivessem j£
apetrechadas com latrinas, mas apenas 8% estavam nestas condipoes dois
anos ap6s o final desta pnmeira fase, Ao fim de algum tempo a maioria das
instalapoes estavam num estado lastimdvel e, mesmo as que se mantinham
em bom estado, s6 eram utilizadas por uma pequena percentagem dos
alunos.
Muitos outros programas de saneamento, aplicados segundo o mesmo
m6todo, acabaram da mesma maneira Este processo leva & adoppSo de
tecnicas desapropriadas, descuida o enquadramento local e pode provocar
movimentapoes sociais imprevisiveis. No sub-continente indiano, por exemplo, ao difundir os sistemas de biogas entre os lavradores ricos, estava-se a
privar os pobres (que nSo possuem animais) de um precioso combustivel
domdstico que eles obtinham gratuitamente. Por outro lado, em muitas
culturas, o acto de defecpSo deve estar envolvido em segredo e 6 objecto de
tabus profundamente enraizados Nas Honduras, e h^bito as mulheres nSo
utilizarem as mesmas latrinas que os homens; e ainda em casa sb as mulhe
res podem ira retretefamiliar. Em muitasregioesafricanas.osogro nSopode
utilizar as mesmas instalapoes que as noras. Noutras sociedades 6 indecente
uma pessoa "aliviar-se" sobre as fezes de outro. As f6rmulasde desenvolvimento em que a participapSo local 6 apenas fachada, passam ao lado destes
factos.
Participapflo comunitdria — uma tdctica para favorecer a utilizapSo das
instalapdes
Uma outra perspectiva que, ali5s, 6 a do Decenio Internacional da Agua e
do Saneamento Bcisico (1981-1990), reconhece que um projecto tern mais
18
hipbteses de ser aceite se a populapao esta associada a ele e considera
importante a participapao da comunidade na sua elaborapao e execuqao. A
participapao popular e, neste caso, considerada como um meio e o saneamento como um fim
O programa de fornecimento de agua as aldeias do Malawi constitui um
dos raros programas nacionais com exito e beneficia do apoio activo da
colectividade. Serviu de modelo a programas analogos de abastecimento de
agua e saneamento noutros paises. A sua forpa reside no facto de ter sido
levado a cabo por pessoal bem treinado, constituido sobretudo por assistentes de terreno e inspectores que discutem com as comissdes de camponeses
e fornecem apoio t^cnico a construpao e manutenpao dos trabalhos.
No Paraguai, a descentralizapao levada a pa bo desde 1 972 permitiu por de
pe um processo de exeoupao de projectos relatives a agua e saneamento que
oonstam de visitas de campo, debates e inqueritos publicos, estabeleeimento
de uma infraestrutura operacional, promopao e realizapao de projectos. Na
Guatemala, seguindo o mesmo principio, criou-se um quadro de tecnicos de
hidraulica rural, encarregados de desenhar os pianos, mstalar e manter a
canalizapao de agua e as latrinas.
Uma das caracteristicas deste processo e contar com a educapao sanitaria
para complementar o desenvolvimento tecnico. No entanto, a educapao para
a saude e muitas vezes recheada de paternalismo e acaba por promover a
dependencia. A pategoria de inspector sanitario, herdada do colonialismo
britanico. e cuja funpao e "levar os camponeses ignorantes, pela persuasao,
a modificar a sua maneira deagir", esta ainda muito espalhada por Africa. No
Gana, a sua imagem e a de um fiscal, sendo uma das suas funpoes aplicar
sanpoes contra os que violam as normas sanitarias melhoradas (de facto, a
palavra local e "samansamar" que significa "fiscal")
Uma educapao sanitaria que se baseia num troca de conhecimentosentre
parceiros que se reconhecem iguais, e mutuamente enriquecedora, e sem
duvida a mais fecunda Existem metodos criativos, nao autoritarios, para
promover a higiene publica. Emissoes radiofonicas de divulgapao seguidas
por grupos de estudo. tiveram um impacto consideravel. Um teatro popular
que tinha como objective sensibilizar a populapao para varies problemas,
sobretudo o saneamento, teve muito sucesso no Botswana. Uma variedade
de metodos pedagogicos foram introduzidos com exito na Nigeria, para encorajar a utilizapao e emprego de instalapoes pubheas (retretes, banhos e
lavadouros).
Estes exemplos mostram os excelentes resultados que podem advir de
uma participapao organizada da populapao.
Nao deixa de ser significative que muitos programas bem sucedidos
tenham reconhecido que a participapaocomunitaria nao pode substituir uma
boa administrapao. E sempre necessario examinar cuidadosamente como e
que vao ser geridos os recursos e qual sera a estrutura e as funpoes da
administrapao local. Para associar eficazmente uma populapao a gestao de
um programa e necessario, provavelmente, levar a cabo sob responsabilidade de urfi organismo exterior, um trabalho profundo de divulgapao.
Noutros casos, os progresses foram mais esporadicos, pois um processo
deste tipo tern sempre os seus problemas. Muitos exitos aparentessao ainda
mais recentes e nao passaram ainda a prova do tempo. Por outro lado, os
poderes publicos fazem-se caros no financiamento de despesas renovaveis
ligadas £s tarefas de promopao de um programa de saneamento. Osesforpos
concertados levados a cabo para estimular a participapao comunitaria aca
ba m por vezes por aumentar excess jvamente os custos reais de uma tecnologia barata. Mais umacritica grave: os poderes publicos.depoisde elaborarem
um programa complexo e caro para permitir as comunidades participar na
execupao de um projecto, recusam-lhe muitas vezes o direito de cooperar na
conceppao e na escolha da tecnologia a adoptar.
19
os programas nacionais se adaptem a todas as situapoes. Pelo contrario, e
possivel orientar todas as iniciativas locais na mesma direepao.
A investigapao participativa vem adquirindo uma importancia crescente
no dominio da saude publica. Mais uma vez, trata-se de saber quern escolhe,
executa e supervisiona as tecnologias, se elas fortalecem a independencia e
se a participapaoe elitista ou popular. A uma previa analise local das prioridades, e depois de um exame das solupbes possiveis, segue-se a execupaode
um programa de aepao reahzavel
Muitos outros obstaculos tern, naturalmente, de ser considerados. As
elites locais podem bloquear ou esvaziar a participapao popular. Os promotores do projecto podem deixar que os seus proprios interesses de classe
influam nas suas relapdes com a comunidade local. Os preconceitos desta
Participaqao comunitaria e mudanpa social
Uma terceira perspectiva, raramente mencionada nos meios que mexem
com desenvolvimento sanitario. baseia-se em premissas segundo as quais o
saneamento e um instrument eficaz para mudar asestruturasda sociedade.
Ele consegue ao mesmo tempo melhorar a saude da comunidade efavorecer
transferencias de tecnologia em seu beneficio Este torna-se assim um polo
de mobilizacao dos recursos rurais, um met de intensificar a mteracqao e as
mudanqas sociais.
Existem precedentes histoncos deste processo na China, em Cuba e no
Vietnam. Poucoconhecidos no Ocidente.estesgrandes programasde sanea
mento dao aparentemente melhores resultados que os programas classicos
de obras publicas. Nasceram no brotar de uma revoluqao social e constituem
um dos aspectos dos esforqos feitos para eliminar asdesigualdadestradicionais do campo. Outro exempt e o de Mozambique, onde a construqao de
latrmas foi uma das primeiras iniciativas samtarias tomadas a escala das
aldeias e que foram objecto de uma intensa propaganda a seguir a independencia. Tambem no Z i mbabwe, a construcao de latrinas e um ponto importante do desenvolvimento sanitario. (Ver pag. 17)
E evidente que o saneamento pode obrigar a populaqao a assumir as suas
responsabilidades, mas esta acqao deve basear-se nos principles da participaqao democratica e de uma administracao local bem estruturada. As sociedades nao evoluem todas ao mesmo ritmo, nao podemos por isso esperar que
20
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podem, por sea vez, ter uma acqfio paralisante e os tabus serem um entrave
concrete ao desenvoivimento da tecnologia (por exemplo, o estatuto da
mulher. da crianpa) A escassez de fundos pode fazer abortar um projecto.
Alguns erros de metodo por inexperiencia podem levar a que todo o projecto
fique desacreditado. Finalmente os interesses comerciais que entram sempre neste jogo de programas de desenvoivimento podem inflectir-lhe a dinamica, de modo a torna-los rent^veis
Ignorando as formulas classicas da participaqao comunitaria, uma equipa
em trabalho com indios de lingua cree no Canada tentou empenhar a comunidade no see conjunto na analise dos problemas e na formulaqao de um
programa de accao. O tema em causa era a poluiqaodo Lago Big Trout, donde
os indios extraem a maior parte da sua alimentacfio, poluiqao essa causada
pelo fluxo de evacuacaode um outro povoado prfiximo’No decurso do traba
lho, foram postos em pratica vcirios principles da investigapao participativa.
A investigapao inicial teve, como objectivo central, estabelecer o inventario pormenorizado das tecnologias locals existentes e determinar quern teve
acesso a este ou aquele tipode instalacao. Estas tecnologias, a par deoutras
que nao sendo locals eram apropriadas, foram apresentadas para estudo e
reflexao; elas constituiram o tema de reunifies publicas, grupos de estudo,
entrevistas individuals e questionanos colectivos, seminaries, documentaqao visual (fotografias. desenhos, etc.), mesmo de psicodramas. Partilhando
e enriquecendo os conhecimentos locals, foi possivel romper o monopolio
dos agentesde fora. Sucessosdestetipo, mesmo que modestos, conseguidos
com este metodo. permitem que a populaqao local se afirme e desenvolva as
suas capacidades.
As tecnicas que sao aplicadas no saneamento local das zonas rurais
permitem, muito particularmente, um tai processo (alguns principles funda
mentals a ter em consideraqao nos pianos de saneamento rural vem enumerados no anexo).
Conclusdes
A adesao da populapao local, o seu apoio efectivo e a sua criatividade sao,
sem sombra de duvida, elementos absolutamente essenciais para que um
piano de saneamento rural seja um exito. Muitas vezes o saneamento e
exclusivamente olhado sob o angulo da higiene do meio, considerado este no
sentido mais estrito do termo. Nenhum esforpo e feito no sentidode eliminar
os vinculos de dependencia ou de encorajar as iniciatlvas locals. E no entanto
’Ver Ideias e Acgao N°. 124 {pig. 19-26).
um mau estado de saude e, muitas vezes, uma das sequelas da pobreza e o
saneamento faz parte de um processo bem mais vasto de desenvoivimento e
transformacao social, mesmo que isolar os pianos de saneamento do seu
contexto seja um caminho mais facil para os financiamentos externos. 0
saneamento sistematico, com participaqao popular, tera um efeito positive
na salubridade do ambiente com a condiqao de que aqueles que o planifiquem tenham, politica e financeiramente. completa liberdade para, paralelamente, levar a cabo pianos mais vastos.
A investigaqao participativa no dominio do saneamento e uma forma de
ajudar a comunidade a quebrar o monopolio do saber (sempre na posse do
exterior) e a tomar iniciativas. Os obstaculos sfio imensos e possivelmente
sera precise tempo para colher os frutos deste metodo. em materia de saude,
mas o impacto que ele podera ter sobre o desenvoivimento rural 6
incalculavel. •
NB. No anexo podem encontrar-se muitos endereqos relatives a este
artigo.
21
community health cell
*7/1, (First Floor) St. Marks Road,
Bangalore - 560 001.
Zq) A produqao alimentar ao serviqo do
do desenvolvimento sanitario (India)
A Associaqao de Produqao e Investigaqao da Soja (SPRA) foi fundada eni
Uttar Pradesh em 1972. Nesta epoca, a soja era cultivada pelos agricultores
nas montanhas circundantes. As sementes utilizadas eram de ma qualidade
e tanto o dleo extraido como os residues ricos em proteinas eram exportados
como racao para gado.
Na sua forma natural, a soja tern urn sabor desagradavel, mas e suscepti
ve! de ser submetida a uma cosedura que lhe da o aspecto e o sabor de outros
legumes A SPRA espera assim incentivar a produejao de proteinas vegetais
de baixo custo e investir os lucros das vendas em projectos de desenvolvi-
(Q) A forma<;3o professional (Bangladesh)
0 "Gonoshashthaya Kendra" (GK) (Centro de Saude Publica) de Savar
(tambem mencionado no anexo) adotpou nos anos 70 um metodo original
para financiar os trabalhos sanitarios e o desenvolvimento em meio rural. 0
programa de formapao profissional nao visa apenas desenvolver os servipos
de saude, assegurar formapao e emprego a populapao local e garantir a
autosuficiencia em produtos de primeira necessidade, mas tambem procura
dotar as mulheres de instrumentos necessaries que lhes possibilitem
desempenhar um papel efectivo na sociedade. Por estes, entende-se uma
oficina de trabalho em meta is, uma carpintaria, um atelier de costu ra (profissao ainda reservada aos homens, nesta regiao), uma fabrica de calpado e
uma padaria. Na oficina de trabalho em metaisfabricam-se, a preposconcorrenciais, camas de hospital, cadeiras, caixilhos de janela e varies instrumen
tos agricolas. Na carpintaria, fazem-se moveis em cana e madeira. Em 1979,
vinte e tres mulheres fundaram uma cooperativa de objectos de artesenato
em bambu com o apoio do G K., que vai de vento em popa
Na escola local, o programa contemplou varios projectos destinados a
adaptar a educapao as necessidades regionais, especialmente um de avilcutura. Todos os membros do pessoal, sem exceppSo, ligadoaoprojectodo G.K.,
trabalham duas horas por dia na horta colectiva. Produzem os legumes que
22
mento sanitario e agricola A AssociapaojDultiva actualmente 150 hectares
de soja. Financia varios programasde alimentapao suplementar em aldeiase
instituipoes, um programa de saude rural e um hospital.
Naturalmente a questao principal e a de saber quern dirige o projecto. Na
fase actual, sao sobretudo quadros que vieram de fora, embora exista um
piano de empenhar a populapao local, a longo prazo A ultima palavra pertence sempre ao director do projecto e a planificapao do desenvolvimento
sanitario fez-se bastante "de cima para baixo". Mas esta estrutura nao tern
de ser limitada noutros pianos tendentesa ligar produpaoalimentaredesenvolvimento sanitario
Para obter pormenores tecnicos sobre este projecto, pode dirigir-se a: Dr.
V. Erasmus, SPRA, P 0. Box, Bareilly — 243001, Uttar Pradesh, India.
consomem, vendem sementes aos agricultores e poem em pratica ideias
novas de melhoria de produpao e metodos de trabalho. Cultivam diferentes
variedades de arroz de grande rendimento e dedicam-se a piscicultura em
tres tanques. Utilizam adubos naturais (estrume de vaca) em vezdeprodutos
quimicos caros Os lucros apurados destinam-se a financiar emprestimos
aos agricultores mais pobres, de modo a torna-los livres dos grandes proprie
taries da terra e dos penhoristas
E desnecessario dizer que um programa sanitario tao ousado e moderno
como o G.K. nao vive sem problemas. Um dos incidentes, o mais dramatico
entre todos, foi o assassinate de um agente paramedico que lanpou o pro
grama dos emprestimos, por certas pessoas que sentiram a sua autoridade
ameapada. Apesar disso o trabalho continuou.
Este excelente projecto (P.O. Nayarhat), Via Dhamrai, Dacca) foi pormenorizadamente descrito em dois periodicos que podem ser requisitados: Nouvelles de I'dcoddveloppement (edipao francesa e inglesa), n° 1 6 Marpo 1981
(CIRED — Centre International de Recherche sur I'environnement et ledeveloppement — 54 boulevard Raspail, bureau 311, F-75270 Paris Cedex P6;
IFDA Dossier (edipao em frances, ingles e espanhol) n° 15, Janeiro/Fevereiro
1980 (Fondation Internationale pour un autre developpement (FIAD), place
du Marche 2 CH-1260 Nyon, Suipa).
A saude pelo povo — um sonho frustrado?
Nestes ultimos anos, o tema da "participapao das comunidades nos
cuidados primaries de saude” esteve na moda nos meios internacionais.
Hoje em dia, pelo contrario, sao muitos os peritos e tecnocratas, mesmo no
seio da OMS, que consideram a participapao comunitaria um sonho
abortado.
Nao ha diivida deque, na maior parte dos casos, os resultados dos grandes
programas governamentais que tinham como objective formar agentes
comunitarios de saude e incentivar a participapao popular sao
decepcionantes. Este fracasso, todavia, deve-se muito mais a obstciculos
colocados a nivel central que a nivel local. Preocupados em nao abdicar dos
seus poderes, os ministdrios, quadras e peritos, nao promoveram uma
participapao popular auto-gerida.
Nao se cansam de afirmar por todos os cantos que as decisoes tern de ser
tomadas pelos prdprios interessados. . mas a formapaodos agentes de saude
e a tarefa que lhes incumbe responde muito melhor aos desejos do poder
central e dos peritos estrangeiros que aos da prdpria comunidade local.
Teoricamente. existe participapao da comunidade quando os pobres
conseguem influir nas decisoes importantes e nas actividadesque afectam a
saude publica e as condipoes de vida colectiva. De facto, a maior parte dos
services de saude — seja o governo de esquerda ou de direita — acabam
sempre por considerar que levar a populapao a "participar" e leva-la "a fazer
o que os servipos ja decidiram"
A planificaqSo dos servipos de saude reflecte o
consenso social ou os conflitos de interesses?
Sempre que os planificadores dos servipos de saude falam de programas
comunitarios, julgamos muitas vezes — ao ouvi-los — que, de uma ponta a
outra da escala social, todos estSo interessados em trabalhar para o interesse
colectivo. Os responsaveis pela saude publica fazem oimpossivelparacobrir
adequadamente as zonas rurais. apesar das insuficienciasfinanceiras. Notaveis funcionarios locals congregam de boa vontade os seus esforpos no
sentido de responderem as necessidades dos pobres. A escolha do agenje de
saude faz-se segundo principles democraticos numa assembleia geral convocada para o efeito Em resumo, os programas estabelecem-se como se os
que detem as redeas do poder nao tivessem outro objective para alem da
prospendade generalizada.
23
Neste clima de harmonia comunitaria e nacional, o agente sanitario da
aldeia e. com optimismo, considsrado como "o elo entre o sistema sanitaria e
a comunidade local" Ensinaram-lhe a "conformar-se com o sistema e a
por-se ao service do povo" (por acaso. por esta ordem). E ja que aparentemenre nao ha nenhum conflito de interesses, o agente sanitariopoder^, em
boa consciencia, ser leal aos ricos e aos pobres e tudo correra bem.
Na realidade, surgem divergencies de interesses a todos os niveis, entre
ricos e pobres. fortes e fracos, entre as napoes — no seio de cada napao e de
cada comunidade Qualquer agente sanitario sinceramente preocupado com
o bem estar da populapao, mais cedo ou mais tarde tera de enfrentar:
— as exigencias ou "normas" rigidas que coincidem com as aspirapoes e
necessidades da populapao local
— irrealismo do programs central cujo fracasso se torna previsivel
— superiores mais preocupados com a discipline do que com inovapoes e
progresses
— problemas subjacentesao regime de propriedade, explorapao, violapao
de leis e direitos que afectam profundamente a saiide da populapao mas que
as autoridades se recusam a reconhecer ou mesmo contnbuem para os criar
— papelada interminavel, uma montanha de formularios a preencher,
uma burocracia que lhes devora o tempo e as energias
— conceppao paternalista do servipo publico que faz aumentar a depen
dents da populapao em relapao as instituipoes centra is, em vezde a ajudar a
afirmar-se por si propria.
ServiQos publicos e cuidados primaries de saude
O novo metodo comunitario de servipo de saude naotem nada de original.
Durante seculos, as pessoas trataram-se umas&soutrascom bons remedies
amigos. A novidade reside no facto de as organizapoes e os ministerios da
saiide se terem comepado a dar conta da importancia deste metodo. Mas,
paradoxalmente, e de temer que a importancia que os meios internacionais
dao 4 participapao comunitaria seja mais susceptivel de a destruir do que de a
ampliar.
Muito antes dos "cuidados de saiide para todos" se terem tornado o
objectivo reconhecido de todo e qualquer ministerio da saude, ja pequenos
projectos e programas de saiide comunitaria existiam na maior parte dos
paises. Alguns tinham sido postos em andamento pelos proprios aldeSos ou'
trabalhadores e serviam para cimentar a comunidade no sentido mais latodo
termo.
24
Com efeito, a ideia de associar cada vez mais a comunidade aos services
nacionais de saiide teve ongem, em larga medida, nestas iniciativas particu
lates, de pequena escala.
Porem, quando os ministerios da saiide comeparam a tentar copiar ou
"reproduzir" estes pequenos programas, encontraram sempre enormespro
blemas. A questao chave e saber quern controla.
Nos programas sanitarios restritos ha bastantes possibilidades (embora
nem sempre seja o caso) de a populapao local conduzir as operapoes. Em
contrapartida, nos grandes programas governamentais, a direepao e a decisao vem sempre do exterior Os planificadores e tecnicos em geral podem
apregoar bem alto que a responsabilidade cabe a comunidade. Mas nem a
populapao local nem eles proprios tern duvidas: toda a gente sabe muito bem
quern manda.
E claro que a situapao se altera de pais para pais e, nos casos em que o
governo esta dominado por pequenos grupos com grandes interesses, a
participapao popular corre o risco de ser mesmo muito limitada.
A caracteristica mais preocupante dos grandes programas sob controlo
governamental e a tendencia para se encarregarem de tudo e procurarem
tudo uniformizar Muitos pequenos programas, de autentica base popular e
que se desenvolvem ao logo de anos, encontram se agora abandonados ou
foram "absorvidos" pelos programas "verticals" gigantescos Aqui e ah, os
funcionariosdocorpode saude escolhem instalar post os de saude emaldeias
onde ja existem programas eficazes de base popular. E isto mesmo se outras
zonas se encontram completamente desprovidas de assistencia medica.
Mas. ao fornecerem gratuitamente os servipos e "a prestapao de saude para
todos", estes funcionarios vao tornar muito dificil a manutenpao de urn
agente de saude remunerado pela comumdade. E ao mesmo tempo eles sao
completamente mcapazes de motivar verdadeiramente a populapao ou de
melhorar efectivamente a saude publica
Nao sera assim em todos os paises nem em todas as regibes Mas sabemos, de fonte segura, que esta situapao e vulgar na America Latina, em
Africa e na Asia.
Ao formular estas observaqbes, a nossa mtenpao nao e. de maneira
alguma, argumentar contra a mtervenpao do Estado nos services de saude
comunitarios. mas sim lanpar urn alerta. tanto aos poderes publicos comoas
proprias comunidades. Experiences repetidas demonstram que programas
verticals de participapao comunitaria ou de saude. dirigidos do exterior.
nunca dao bons resultados. Consequentemente:
_ Os poderes publicos devia m para r de convidar as populapoes a participar em programas oficiais a cujas condipoes se opuseram.
mesmo modo. nem todas as comunidades tern capacidade para planificar e
organizar as suas proprias acqbes sanitarias. Se as comunidades estbo
preparadas mas os governos nao estao, a prudencia impbe-se Os liders das
classes desfavorecidas deverao ajudar estas a encontrara forma de cooperar
com os poderes publicos, sob a condipao de elas proprias se fortalecerem, Se
isto se preve impossivel, os dirigentes e os agentes de saude ver-se-ao,
provavelmente, obrigados a agir a margem dos poderes publicos. Ou seja,
pelo menos, poderao ajudar as pessoas a identificar os pontos de friepbo e a
decidir a que devem deitar maos para promover a transformapao...
_ ja e tempo de serem as comunidades a convidar os poderes publicos a
participar nos programas comunitarios que elas proprias decidiram
Os factores politicos podem influir na formaqao dos
agentes de saude
Os responsaveis pelas politicas oficiais e os dtrigentes das comunidades
tern um problema a resolver: e urgenteencontrar os meiosquepermitam aos
governos incentivar e apoiar as actividades de saude comunitaria sem tomarem conta delas
Tomemos o caso de agentes de saude de uma determinada aldeia a quern
foi ensinada uma gama respeitavel de tecnicas. Foram encorajados a reflectir, a tomar iniciativas e a estudarem por sua propria conta. As suas opinioes
sao ouvidas. Eles empenham-se na medida dos seus conhecimentos, das
suas capacidades, das necessidades da sua comunidade e dos recursos de
que pode dispor. Elesapoiam e educam. V3o, muito provavelmente, dedicarse b sua tarefa com energia e dedicapbo. Irbo transformar a sua comunidade
e ganharbo a confianpa e o afecto da populapao. 0 seu exemplo levara a que
os vizinhos se convenpam de que tambbm eles poderao adquirir novos
conhecimentos e assumir novas responsabilidades, de que uma pessoa com
esforpo se vai aperfeipoando. Os agentes de saude da aldeia tornar-se-So,
Ajudar sem dominar tern a ver com qualquer organizapao ou "animador"
enviado do exterior para uma determinada actividade ou aldeia. Este princi
ple destina-se, do mesmo modo, aos dirigentes, organizadores e agente de
saude autbetones.
E claro que nem todos os governos estarao dispostos ou aptos a colaborar
com os servipos de saude postos em marcha pelas proprias comunidades; do
25
deste modo, "promotores da transformapao" em todos os dominios, pois a
sua acpao levara os aldeaos a tomarem consciencia das suas possibilidades
no piano humano... e por fim, dos seus direitos enquanto seres humanos.
Todos aqueles que ja viveram em aldeias ou bairros de lata sabem bem
que a politica e os grupos de pressao, a repartipSo de terras e dos recursos,
sao factores que tern uma incidencia muito mais decisiva sobre a saude
publica do que o tratamento e a prevenpao das doenpas.
Pelo contrario, numa regiao em que as reformas socials e agrarias sejarn
terrivelmente necessSrias, ou em lugares onde se considera natural que os
pobres sejarn oprimidos e as riquezas desigualmente distribuldas, onde os
"baroes" da medicina e da politica defendem ciosamente os seus privilegios,
a formacao dos agentes de saude e uma musica muito diferente. Os agentes
de saude do primeiro caso sabem demasiado, sao excessivamente activos e
reflectem exageradamente. Tais homens e mulheres sao perigosos Sao
potenciais agitadores. Dal que, em muitos programas de saude, o agente de
saude receba uma formacao muito diferente. 0 numero de tecnicas que lhe
sao ministradas e muito reduzido Os agentes — na maior parte dos casos,
mulheres — nao aprendem a reflectir masa aplicar uma lista dedirectivasou
"normas” determinadas. Com urn lindo uniforme e munidas de um vistoso
diploma, trabalham num centro de saude, de pedra e cal. Adisciplma 6 rigida
e ha regras fixadasque indicam oque pode e nao pode serfeito. A maior parte
do tempo e gasta a preencher formul^rios...
Para melhor compreender os limites e possibilidades dos agentes de
saude comunitaria — o que eles estao autorizados a fazer e o que de facto
eles poderiam fazer se tivessem autorizagSo — e melhor analisar osfactores
sociais e politicos que entram em jogo.
Na maior parte dos paises, as causas que explicam as elevadas taxas de
mortalidade e doenpa entre os pobres sao, entre outras, a subnutricSo, uma
higiene deficiente, o analfabetismo e a gravidez nao desejada. Pordm, a razao
subjacente e global deste estado de coisas e uma cruel desigualdade na
repartiqao da riqueza, das terras, do acesso a educacSo, da representacao
politica e dos direitos humanos fundamentais
Os detentores da riqueza debruqam-se sobre o destino dos desprotegidos
com paninhos quentes. Eles fornecem-lhes "gratuitamente" instrucao, ser
vices. suplementos alimentares... e uma chusma de "bons" conselhos. Mas
nunca lhes darao nem terra suficiente, nem salaries suficientes que lhes
permitam tornarem-se autonomos e autoresponsaveis. 0 pobre torna-se,
deste modo, em alvo politicamente silencioso de assistencia e explorapao.
Apesar da ajuda externa, dos pianos de desenvolvimento e dos projectos de
participaqao comunitaria, os ricos nSo param de enriquecer e os pobres
continuam a empobrecer.
26
Os programas de formacao raramente preparam os agentesde saude para
analisar ou resolver os conflitos fundamentals de interesses entre os diversos grupos Pelo contrario, e-lhesensinado a entrar no jogo, sobopretexto de
que os governos sao generosos e que estes conflitos nao existem, o que os
leva a fechar os olhos sobre as necessidades mais prementes dos seus
clientes. Este tipodeformapaodcapazde minar a integridadee a vocapaodos
agentes de saude. Em vez de defenderem corajosamente a saude publica,
tornam-se autenticos burocratas — pecas de uma maquina impessoal e
centralizada, cuja funpao e a de pacificar e regulamentar os pobres.
Depois queixamo-nos de que os nossos agentes de saude nSo tern iniciativa, so pensam em ganhar dinheiro, desinteressam-se pelo seu trabalho ou
se deixam corromper. No fundo, eles apenas se integraram no "sistema".
Nao, nao e surpreendente que tentativas ambiciosas e teleguiadas de
participapSo comunitaria venham a dar num fracasso. Para que a acpSo
sanitaria seja eficaz e necessario descentralizar a administrapSo publica da
saude — redistribuir os poderes — servir os desfavorecidos em vez de os
dominar; mas a realizapSo destes objectivos levaria a uma profunda transformacao da sociedade que so pode vir da base.
A A EXO
do Adonerc eop^clal
sobre saude rural
BOLETIM IDEIAS E AC QAO N° 145
1982 I 1-2
M/P7533/S/Anexu
r 0 sumario deste anexo encontra-se na t>£g. 23 A. |
2a
UM "REPORT0RIO" das tecnologias apropr: ac as
"Apropriada" significa adaptada" "Apropriar-se"quer<a:z._ 'antrar na
posse de" Para que uma tecnologia seja adaptada a acpao sanitaria nas
regioes rurais tem de ser possuida pelos interessados e deve,
este
efeito, preencher algumas condipoes
As mais importantes sao as seguintes
— contribuir para melhorar substancialrnente a vida rural.
Demasiadas vezes convida-se os camponeses a adoptar uma pratica
porque e "simples e acessivel a todos ", A simplicidade e uma vantagem
mas nao e tudo;
— reforpar a autosuficiencia: acontece em geral que as populapoes que
adoptam uma tecnologia tem tendencia a ficar dependentes dos organismos internacionais. Elas chamam a si as suas forpas criadoras e nao
se contentam em copiar cegamente o modelo. E preciso pois que a
tecnologia em questao seja adaptavel e extensivel;
— prescindir sistemStica e progressivamente das contribuipoes exteriores. E uma das vias a percorrer para se chegar a autosuficiencia e e por
consequencia uma das condipoes de aplicabilidade. Entra tambem em
linha de conta a medida na qual uma tecnica reforpa a confianpa da
populapao em si propria e nas suas capacidades.
Uma das tecnicas apropriadas (TA) mais conhecida e geralmente mais
apreciada e a fita metrics de Shakir. Trata-se de uma fita graduada que se
enrola em volta do biceps das crianpas. E um instrumentobarato, que permite
comparar o grau de malnutripao de duas populapoes, ou da mesma populapao antes edepoisde uma intervenpao. Evita-se assimo recursoa especialistas externos e da-se aos rurais a possibilidade de serem eles proprios a fazer
as avaliapoes. A fita serve sobretudo para as maes controlarem o crescimento dos filhos. Mas nao seria preferivel saber se a crianpa esta doente ou
se se desenvolve convenientemente? Aplicada pelas maes, a sua conta e
risco, esta tecnica apropriada substitui os criterios ancestrais por novas
escalas. menos exactas, a partir das quais se vai decidir a acp3o a
empreender.
— Quais sao os principals beneficiirios da TA? Os rurais. osagentesde
saiide ou uma empresa comercial? Uma tecnologia so e apropriada aos
camponeses pobres se sao eles a dela tirar o maior proveito. Pelo contrario.
se ela beneficia sobretudo os trabalhadoresdos serviposde saiide ou empresascomerciais, aTApodeser apropriada aos primeirosou aos segundos, mas
nao forposamente aos rurais. As fichas ' o caminho da saude sao um
exempio bem demonstrativo. Registos de saiide individuals, muito praticos
para o agente sanitario, mas que ultrapassam em geral o entendimento das
maes; ora e delas que depende, em definitivo. o desenvolvimento das criancas. Se se coloca isto a frente da comodidade do agente sanitario. entaosera
melhor estudar com grupos de maes os criterios que possibilitem mostrar se
a cnanqa vai bem e o que ha a fazer, individual e colectivamente, para que ela
continue assim As explicapoes que acompanham as fichas de crescimento
sao escritas em termos cientificos, sem qualquer relapao com o grau de
conhecimentos dos interessados na saude.
Conta-se que na Africa Ocidental houve maesanalfabetas.que penduraram as fichas de crescimento ao pescopo dos filhos, convencidas de que se
tratava de um amuleto destinado a protege-los contra os efeitos da
malnutripao.
A TA tem por vezes uma conotapao exclusivamente comercial. Assim,
uma f^brica multinacional de leite em pd forneceu gratuitamente go Zim
babwe “fichas de saiide" que recomendavam o uso do seu leite artificial
como complemento alimentar das crianpas.
— Uma vez respondidas estas questoes, ha que proceder a uma comparaptSo de custos. fazendo entrar em linha de conta os gastos ocorridos
localmente sob a forma de tempo de trabalho, despesasacessorias. amortizapao e manutenqao. A TA nSo e forposamente ba rata mas implica o minimode
desperdicio. Outra razao que faz com que a escolha de tecnologia deva ser
local e que exteriormente nao e possivel ter uma ideia aproximada das
despesas que seraotributadas a populapao. Para ascalcular, ha que proceder
a uma consults o mais alargada possivel, a fim de detectar se nao seria
possivel encontrar, nos locals, o financiamento necessano.
— A receptividadee um corolariode tudooquejafoiditoeoexempiodo
saneamento rural descrito na p£g. 22 deste boletim esta cheio de ensinamentos a este respeito. Qualquer tecnica tem de respeitar, ate certo ponto, os
costumes tradicionais, sob pena de ser rejeitada. Quando ela e escolhida pela
propria populapao nao hi, geralmente. problemas.
Para responder a estas questoes tem de se coIocar a tecnologia no
contexto em que ira sem aplicada. Estas podem ser discutidas pelo agente
sanitario e pela comunidade a proposito de muitos outros assuntos (por
exempio, tecnicasapropriadasde saneamento rural). 0 a ng u Io sobo qual se
abordam e muito importante, ja que nenhum dominio e estritamente "compartimentado". As diversas condipoes embrincam de tai modo umas nas
outras que a escolha a fazer implica uma reflexaoaprofundada. Por exempio:
3*
1.
Esta tecnica trare o maximo de vantagens a comumdade? Ouais saoas
outras opcoes?
2.
Sera necessano impdr o modode fazer ascoisas? Atequepontosedeixa
espaqo para a miciativa popular?
3.
Em que medida, se aceitamos esta tecnica, nos vamos tornar dependen
ces de terceiros?
4 Serao os mais necessitados quern mais vai beneficiar? Quern mais
beneficia?
5. Sera esta a opcao mais economical Que outroscustosestaoenvolvidos?
A DESIDRATAQAO E A DIARREIA
A diarreia e, como se sabe, uma das principals causas de morte de
criancas pequenas. Em geral. as pessoas malnutridas, especialmente as
criangas, morrem devido a perca de grande quantidade deagua durante uma
diarreia grave. Muitos podem salvarse temporariamente (ate uma proxima
crise) com a condipao de substituir os liquidos perdidos. Isto levou a produpao
em larga escala de sais rehidratantes e preparados endovenosos. So em
1979, a UNICEF distribuiu mais de 20 milhoes de sacos de sal rehidratante.
No entanto. a rehidratapao constitui uma mera tregua. Apos 20 anos de
discussbes internacionais sobre a importancia da prevenpao, nbo se conta
com nenhumacura mas apenas com solupbes provisorias. Asmedidastomadas nao eliminam as causas subjacentes nem da malnutripao que torna a
diarreia fatal, nem das infecpoes que a provocam. Salvar vidas ja e positivo,
mesmo se nao se consegue prolonga-las para alem de alguns meses Mas
isto nao pode implicar uma major dependencia em relapao a ajuda exterior,
sempre que as comunidades possuam os elementos necessaries para produzir os rehidratantes.
0 principal argumento em favor dos sacos fabricados como os de "oralite" reside no facto de eles conterem uma quantidade de sal ja medida e
controlada Com efeito, se a solupao rehidratante contiver demasiado sal,
pode apresentar alguns riscos e, quando e a mae a prepara la em casa,
especialmente quando a mae mede o sal com os dedos, a dose pode ser
forpada. Porem os sacos custam muito caro e no campo nem sempre se
encontram quando sao necessarios E no caso da diarreia o tempoe determinante. Tambem tern de se ter o cuidado de diluir o saco numa quantidade de
agua suficiente. Seja qual for o metodo seguido, aqui tern um bom criteno: o
liquido nao deve ter um sabor mais salgado que as lagrimas. Numa comuni
dades das Filipinas, as maes juntam sal e apucar a um cha a base de plantas
locais e dao frequentemente esta bebida, em pequenos goles, as crianpas
desidratadas.
“A nossa aldeia precisa
" "Oh isto nao estava previsto nos nossos pianos..."
Outra critica as solupbes rehidratantes preparadas em casa incide no
facto de estas nbo terem sido sujeitas a um "estudo controlado" Para
combater a ausencia de informapao a escala mternacional. um grupo elaborou um programs de investigapao. Este grupo gostaria de reunir dados sobre
as experiencias levadas a cabo com solupbes preparadas no domicilio e com
os sacos preparados. Pode contactar-se para "The Hesperian Fondation"
(cuja morada e dada na pag. 7A deste anexo).
4k
Solupdo rehidratante "sal-acucar" preparada em casa
Esta quantidade de sal
e
aciipar
INDEPENDENCIA EM RELAQAO AOS MEDICAMENTOS
Um dos problemas sempre presente no desenvolvimento da saude rural
e o dos medicamentos. Mais de metade dos produtos farmaceuticos, que sao
vendidos no Terceiro Mundo a prepos exorbitantes, podem considerar-se
ineficazes. Entre 30 e 40% deles sao vitaminas e fortificantes, a maior parte
das quais a base de dlcool e por vezes enriquecidas com antibidtico. Pelo
menos um quarto destes medicamentos foram retiradosdos circuitos comerciais nos paises industnalizados, por ter expirado o prazo de vahdade ou por
se tratar de combinapoes antiquadas, ou por provocarem efeitossecundarios
verdadeiramente perigosos, Mesmo assim, o montante total das despesas
em medicamentos dos 67 paises mais pobres e inferior a soma dispendida
em tranquilizantes nos 5 paises mais ricos.
Os mercados do Terceiro Mundo estao dominados pelas firmasfarmaceuticas. No Bangladesh, por exemplo, oito dessas firmas (entre as 150 registadas no pais) controlam 80% do mercado. Sao elas que decidem o que se vai
fabricar, o que se vai exportar e qual o prepo de venda. Hoje em dia ha tres
medidas possiveis para romper com o monopolio das multinacionais. Em
primeiro lugar, ha que estabelecer uma "lista de medicamentos essenciais"
que regule as hcenpas de importapSo. Na pagina seguinte encontra-se uma
lista deste genero. Os medicamentos UNIPAC produzidos pela UNICEF
podem servir de base. Um outro passo e, naturalmente, fabricar localmente
os produtos farmaceuticos.
Apariir de 1 978, a produqaode medicamemos baratos e de quahdade faz
parte das actividades do "Gonoshasthaya Kendra" (GK) (Centro de Saude
Publica) em Savar no Bangladesh (ver pag. 22 do boletim). Munos dos seus
empregados sao camponeses e todas as etiquetas e modos de emprego sao
escrnos na lingua local, o bangali Metade dos lucros sao reinvestidos na
empresa e o restante financia projectos de desenvolvimento rura I, especialmente pesquisas sobre plantas medicinais indigenas. Finalmente o tercetro
passo consiste em recorrer aos inumeros remedies tradictonais locais, muito
baratos. e cuja eficacia se pode testar de um modomuito objectivo. Acontece
todavia que os curandeiros indigenas guardam ciosamente o segredo dos
seus preparados e. nesse caso, temos de nos meter em negociapoes altamente diplomaticas.
LISTA DE MEDICAMENTOS ESSENCIAIS PARA DISPENSARIOS RURAIS
(dezoito medicamentos essenciais “gerais")
1.
2.
3
4.
5.
6.
7.
Acido acetilsalicilico
Paracetamol
Hidroxido de aluminio
Metronidazol
Mebendazol
Piperazina
Ampicilina
Comp. 100 & 500 mg
Comp. 100 & 500 mg
Comp. 100 mg
Comp. 200 & 500 mg
Comp. 100 mg
Comp. 500 mg
Comp. 250 & 500 mg
8
9.
Tetraciclina
Cloroquina (sob a forma
de sulfato
Isoniazida
Estreptomicina
forma de sulfato)
Ergometrina (maleato)
Iodo
Sal ferroso (Sob a forma
de sulfato de fumarato
Neomicina + bacitracina
(pomada para a pele)
Acido benzoico acido
salicilico
Benzoato de benzilo
Tetraciclina
Comp 250 mg
Comp. 1 50 mg e
xarope 50 mg/ 5 ml
Comp. 100 & 300 mg
(sob a
Inj. 1 g
Comp. 0,2 mg
Solucao (2,5%)
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
60 mg
5 mg + 500 Ul/g
respectivamente
Pomada para a pele
(6% * 3%)
Locao (25%)
Pomada ocular (1%)
Febre (em caso de paludismo
Calmante
Antiacido
Amebicida
Antelmintico
Antelmintico
Antibacteriano
(de uso geral)
(de uso geral)
Paludismo
Tuberculose
T uberculose
Ocitocico
Desinfect.ante
Anemia
Infeccoes cutaneas
Fungicida (para a pele)
Escabicida
Infeccoes dos olhos
(seis medicamentos essenciais — segundo as condiqoes ambientes)
19.
20.
21.
22.
23.
24.
Etambutol
Suramina sodica
Citrato de dietilcarbamazina (DEC-C)
Melrifonato
Estibogluconato de sodio
Pentamidina
Comp. 100 & 500 mg
Inj. 1 g frasco
Tuberculose
Oncocercose
Comp 50 mg
Comp. 100 mg
Inj. 38% em 3 ml
Inj. 200 mg
Filarsiose
Esquistosomiase
Leishmaniose
Leishmaniose
Notas para a utilizaqtlo desta lista
Os medicamentos essenciais "gerais" sao, na medida do possivel, fornecidos sob a forma de comprimidos. Paraadministra-los&scriancas.dissolve-losem agua aqucarada. 0 modode empregode todos
os medicamentos essenciais deve ser escrito na lingua local; os efeitos secondaries e a posologia tern de
vir indicados. Para os medicamentos injectaveis (11,20, 23, 24), tern de se dispor de seringas esterilizadas. Isto aumenta o custo e a complexidade do tratamento. Para alemdisto, os dispensaries ruraisdever3o estar abastecidos de algodao hidrdfilo e ligaduras para responder Ss necessidades correntes.
Sempre que possivel convem testar os remedies locais e utiliza-los Na maior parte dos paises do
Terceiro Mundo existem, por exemplo, laxantes naturals e encontra-se quase por todo o lado o sal e o
aciicar. Misturados em proporqdescorrectas(ver a pagina 34 doanexo), estesdois ingredientes evita m a
compra de sais rehidratantes. Pode ser util conservar um stock bastante importante de produtos farmaceuticos de usocorrente.quando houverdificuldade de reabastecimento. pode limitar-sea: 2,3.6.8, 11,
12, 14, 17.
6*
EXPERlENCIA COMUNITARIA E PROGRAMAS DE FORMAQAO DE AGENTES SANITARIOS
Exemplo: No quadro de urn programa desenvolvido num bairro de lata
Alguns programas centrados na populapao encontraram meios de a
perto da cidade do Mexico, os alunos comeqaram por visitar 15 familias dos
fazer participar na formagfio do agente sanitdrio. Vamos indicar algumas
bairros mais pobres. Eles procuravam ajudd-las a resolver os problemas o
dessas formulas experimentadas:
melhor que sabiam — se possivel peloauto-tratamentoouentaoenviando-os
1. Implantar o centre de formagdo num aglomerado ou comunidade semepara dispensaries ou centrosdesaude publica. Eles travavam assim conheciIhante aqueie para onde os agentes sanitarios irao trabalhar. Esta formula
mento com a populapdo e com as suas dificuldades. Descobriram tambem os
exige a coiaboraqao dos membros da cornunidade.
pontos fortes e os fracos dos services de saude e sociais da cidade. Alunos e
professores elaboraram em seguida o programa do curso tendo em conta as
Exemplo: 0 proiecto Piaxtla, no Mexico (Estadode Sinaloa), instalou urn
necessidades e os problemas identificados durante as visitas ao domicilio.
centre de formagdo numa aldeia de 950 habitantes. A sala de reunifies dos
trabalhadores agricolas, uma velha construgao em tijolo, e usada come sala
Outro exemplo: As visitas ao domicilio sao tambem o prato forte da
de aula sempre que os aldeoes ndo precisam dela para as suas assembleias.
formapao dos agentes sanitarios no projecto Piaxtla. Todos os sabados, os
O facto de todos os instrutores serem da aldeia (ou de aldeias vizinhas)
alunos estabelecem os objectivos que esperam atingir e depois consagram
contribuiu muito para associar mais estreitamente a comunidade ao prouma metade do dia as visitas as familias. Cada aluno visita de 8 a 10 familias,
grama de formagdo.
sempre as mesmas. A sua missao e ouvir. Fazem perguntasfis familiassobre
2. Tomar medidas para que os agentes de saude pernoitem e tomem as
as actividades comunitarias, incintando-as a dar a sua opiniao e a participar.
refeigoes nas casas dos habitantes do local, durante o seu periodo de formaMuitas vezes dao sugestoes sobre o modo de prevenir ou resolver problemas
gao. Esta formula traz muitas vantagens:
de saiide. Mas evitam, a todo o custo, ditar ds pessoas o que devem fazer.
Talvez por esta razdo, e tambem porque raramente empregam uma questio— as familias locals interessam-se pelo programa de formagdo Sdo elas
nario oficial, eles sao bem acolhidos na maior parte dos lares
que assumem a responsabilidade do bem-estar dos agentes sanitarios
e nao o contrario.
4. Encarregar os futuros agentes sanitarios de actividades nas comunida
des locals durante a formapao. Alguns programasde formapao tern prevista a
— os alunos misturam-se com a populapao em vez de viverem em ghetto,
participapdo dos estudantes nas seguintes actividades ou em algumasdelas:
como acontece quando moram juntos;
— projectos referentes aos menores de 5 anos e a malnutripao. Os alunos
— os estudantes tern oportunidade de conversar diariamentecom asmaes,
vao ds aldeias prbximas, tern reunifies para organizar as actividades.
os pais, os filhos. Podem deste modo observar os hdbitos, asatitudes, as
explicam como se deve preparar a comida e aplicar programas de all alegrias e as dificuldades das familias com quern partilham os problementapdo para criangas, etc.:
mas. Por seu lado, as familias tiram partido das ideias novas que os
agentes sanitarios lhes transmitem.
— construpao, em colaborapao com os habitantes locais, de latrinas, des
cargas para evacuapdo de detritos, sistemas de condutas de agua, sisteNo principio do curso, e desejdvel que os professoresreunam as familias
mas de armazenamento de cereais ao abrigo dos ratos;
de acolhimento, lhes expliquem os objectivos da formapao, lhes pegam que
ajudem os estudantes e que os incentivem a ensinar-lhes o que eles apren— campanhas de vacinapdo nas aldeias vizinhas (acompanhadas de urn
deram. As familias tambem podem formular sugestoes ou criticas. Elas vao
programa de educapdo de pais e filhos);
sentir-se orgulhosasde contribuir para a formapaodos agentes sanitdrios qie
—
actividades para criangas. Os agentes sanitdrios organizam reunifies
irdo servir outras comunidades. A aprendizagem torna-se, deste modo,
reciproca.
com as criangas alunos da escola, bem como com as nao escolarizadas;
3. Organizar visitas ao domicilio. Certos programas de formapao prevem
estas visitas regulates (uma ou duas vezes por semana).
— campanhas de limpeza levadas a cabo nas aldeias com a participapdo de
criangas e adultos;
7a
— participacao nos trabalhos dos camponeses em hortas familiares ou da
comunidade;
— colaboraqao na administracSo de uma cooperative local;
— orgamzapao de festejos populares de saude,
— dramatizapao e sessoes de fantoches com as mfies e as crianpas.
5. Apoiar a participapSo da comunidade nas sessoes de formapSo. Os
aldeoes ou a populapao da vizinhanpa podem entrar nSo so nas actividades
programadas mas eventualmente tamb6m nas aulas.
Tern aqui algumas sugestdes a este respeito:
— uma politica de porta aberta. Certos programas de basecomunitaria tern
como ponto de honra abrir de par em par portas e janelas das salas de
classe. Maes, pais, trabalhadores agricolas, criancas (especialmente
adolescentes) podem a quaiquer momento entrar ou vir sentar-se no
parapeito da janela para ver o que se passa. 0 recurso a auxiliares
pedagogicos vivos, ao psicodrama e a linguagem simples para expor as
ideias novas excitando a curiosidade dos espectadores, a quern de vez
em quando se pede a opinido ou se convida a tomar parte no psicodrama.
nos jogos e nas demonstrapoes;
— urn convite feito aos curandeiros tradicionais, aos herbanarios, iscomadres e a outros membros da comunidade para tratarem nas aulas os
temas da sua competencia;
Uma das aulas que mais me impressionou foi uma em que uma comadre
(parteira tradicional), numa aldeia, trapou com urn grupo de futures azgentes
sanitarios uma lista de inforrpapoes precisas e de conhecimentos que as
comadres locals lhes podiam transmitir e vice-versa.
— Convidar as maes e as crianpas de uma comunidade a colaborar em
psicodramas e noutras actividades. Para bem servir este grupo da populaqao, os agentes sanitbrios precisam de prStica. Ospsicodramas podem
ser para eles uma boa ajuda. Mas estes nSo sSo nada convincentes se o
papel das crianpas 6 desempenhado por estagicirios. Tornam-se mais
plausi'veis quando se consegue convencer as mSes a vir pessoalmente
com os filhos para expor os seus problemas de saude. As aulas tornamse entao mais vivas e interessantes.
— convidar os membros da comunidade para projeepdesdediapositivosou
de filmes. Quase toda a gente gosta destas projeepoes. Quando estao
Este texto foi tirado (com autorizaqao) de Helping Health Workers
Learn (Ajudar os agentes de saude a aprender) de David Werner e Bill
Bower, um manual de grande valor contendo uma selecq^o de mdtodos, auxiliares pedagogicos e ideias di rig ida aos instrutores a nivel de
aldeia. 0 manual divide-se em 5 grandes capitulos. Comenterios e
cn'ticas provenientes sobretudo de agentes de saude de aldeia e de
comunidades serSo benvindas pelos autores. Publicada em Janeirode
1982 (em ingles) por The Esperian Foundation, P.O. Box 1962, Palo Alto,
CA 94302 USA, estando em curso a sua traduqao para espanhol,
bengali e uma lingua das Filipinas.
0 Doutor Werner e ainda autor de um manual precioso de cuidados de saude a nivel de aldeia, Ondo nao hd medico, publicadopelo
ENDA (Environnement et developpement du Tiers Monde) B.P. 3370
Dakar, Senegal, 1981, que tambem recomendamos vivamente aos
nossos leitores (PreqoiFCFA 1100; FF 22; US $ 5.50). AI6m da ediqSo
francesa existe uma em crioulo (Gid travaye santd), S. Birkey B.P.
15301, P6tionville, Haiti; em ingles (Where there is no doctor). The
Esperian Foundation, 2a. ediqSo, 1979, e Macmillan, 1980, (Preco; £
RU 2.95); em versSo original espanhola (Donde no hay doctor).
Editorial Pax-M6xico, Mexico, 3a ediqao, 1976, em arabe (Institute for
Arab Reserch s.a.r.L, P.O.B. 135057, Beirute, Libano); em Kmer, em
hindi, em indondsio, em swahili, em vietnamita e em muitas outras
linguas (para informapdes, contacte The Wespenan Foundation).
Referimos ainda aos leitores um manual de saude comunitdria
que acaba de sair no Zaire. Trata-se de Infirmter, comment batir la
santh de D. Fountain e J. Courtejoie, editado pelo Bureau d'etudes et
de recherches pour la promotion de la sa.ite, P.P. 1977, KanguMayombe, Zaire. Este manual este dividido emquatro secures: promoq3o da saude, protecc^o materno-infantil, saneamento do meio e
controlo de algumas endemias e melhoria do estado de nutriq9o, e
destina-se, entre outras fun^bes, & formacSo de enfermeiros. (Preqo:
zaires 50; US $ 9; FCFA 2500; FF 50, FB 350). 0 Bureau d’dtudes et de
recherches de Kangu-Mayombe edita tambdm em ingles e portugues.
inscritas no piano do curso 6 aconselttevel convidar a populaqSo a
assistir e associates aos debates que as seguem. Se os agentes de
saude vivem em casas de familias, temos de os lembrar a convidS-las
para estas sessoes.
8a
— empregar urna linguagem, auxiliares pedagogicos e metodos claros.
simples eacessiveis a todos. Istoe urna coisa d qua I os instrut ores tern de
estar muito atentos. SenSo. os agentes sanitdrios terdo de "traduzir" o
que lhes esta a ser ensinado em termos acessiveis aos camponeses. No
caso dos membros da comunidade assistirem a algumasclasses, tere
mos de os incitar a pedir explicates cada vez que nao compreenderem
bem a palavra. Instrutores e alunos evitarao assirn cairem no
pedantrsmo.
ALGUNS PRINClPIOS FUNDAMENTAIS DO SANEAMENTO RURAL
Generalidades
Os sistemas de saneamento do meio sao extremamente variados. Ao
escolher o que melhor se adaptar a vossa situacao, convem entrar em linha
de conta com os seguintes factores:
— os habitos locals;
— os utensilios e materials de construqao disponiveis no proprio local;
ALGUMAS REFERENCIAS BIBL1OGRAFICAS
(Relacionadas com o artigo sobre o saneamento)
Kalbermatten J M. e col. Appropriate sanitation technology: A field
manual World Bank Staff Working Paper. Banco Mundial, Washington
D C. e Paris 1980 (somente em ingles)
Feachem R. e col. Sanitation am disease: Health aspects of excreta
and waste water management. Johns Hopkins University Press, Balti
more, USA. 1981 (somente em ingles).
Feachem R e Cairncross S. Small excreta disposal systems. Ross
Institute Bulletin n°8, Ross Institute for Tropical Hygiene, London School
of Hygiene and Tropical Medicine, Londres, 1978 (somente em ingles).
Jackson T "Techonologie d'assainissement en milieu rural — Les
lecons de la recherche-participation '. Les Carnets de I'Enfance, n°
45/46. FISE, Geneve, verao 1979 (edirjoes francesa e inglesa).
Van Wgk-Sijbesma D Participation and education in comunuty
water supply and sanitation programmes, a selected and annotated
bibliography Sdne de boletins n° 13. 1979, (somente em ingles); e a
literature revivew. Sdrie de documentos tdcnicos n° 12, 1981 (emfrances, ingles e espanhol). Centro Internacional de Referenda (OR) para o
aprovrsionamento de dgua colectiva e saneamentofem colaboraqdocom
a OMS). Rijswijk. Holanda
Pacey A Rural sanitation: Planning and appraisal. Documento da
Oxfam, publicado por Intermediate Techonology Publications Ltd., Lon
dres. 1980 (somente em ingles).
I
- ---------------------------
— as quantiasque as pessoas estao dispostasa gastar tanto no iniciocomo
ao longo de um periodo rnais lato, para melhorar os sistemas de
saneamento;
— o numero de pessoas dispostas a construir latrinas;
— a compreensao a nivel local da relaqao existente entre a saude e a
eliminaqao dos excrementos.
Para por em andamento um projecto de saneamento comunitario. e
indispensdvel dar solucao aos seguintes problemas:
— e necessario sensibilizar os interessados para os perigos querepresenta
a acumulacao de excrementos e para a importancia do saneamento;
— a saude de urna comunidade so melhora se cada casa de familia tiver
acesso a latrinas privadasou publicasemcondiqoes: as latrinasprivadas
sao, em geral, ma is confortdveis, mas sao tambem maisdispendiosas; as
latrinas publicas podem ser mais baratas para o utente, mas supdem um
sistema bem organizado e permanente de manutenqao e limpeza;
— 6 preciso organizar o trabalho de recolha de materials deconstrucdode
fossas e de retretes;
— e preciso ensinar os utentes, as crianqas em particular, a utilizar correctamente as latrinas;
— e preciso vigiar a limpeza periodica das latrinas;
d preciso vigiar para que elas sejam periodicamente inspeccionadas,
mantidas e reparadas;
— sempre que necessdrio. deve cobrir se as fossas cheiase instalaroutras
retretes, ou esvaziar os poqos.
9a
Latrinas de fossa
As latrinas tie rossa constituem a tnstaiagao sanitaria mais comum,
men ,-s cara, ma is simples, mais bem adaptada e geralmente a mais utilizada
em mtse rural. com algumas pecuenas inovagces podem tu.nar-se higienicas •? confortaveis
As latrinas de fossa estao menos mdicadas nas secumtes situagdes:
— nos casos em que, devido a densidade populacional, nao se disponha de
esoaco suficiente para cavar e recavar as fossas;
— nos casos em que a agua subterranea se enccntre muito perto da
superficie,
— nos casos em que o terreno for mais pedregoso ou pouco consistente;
— nos casos em que as fontes de agua corram o nsco de virem a ser
poluidas.
Tomar as seguintes precaugoes:
— de um modo geral, cavar as fossas a uma distancia minima de 6 metros
— se possivel a mais de 30 metros — das habitagoes;
— no caso em que a agua subterranea se encontre a pouca profundidade,
torna-se indispensavel construir as fossas em cimento ou tijolos;
e necessario garantir que os bordos da placa de fecho estejam hermeticamente seladas. Para proteger dos insectos e vermes, cobrir o terreno
que circunda a base.
- para impedir que as moscas se reproduzam no poco, deve colocar-se
debaixo dos lados da base e no terreno a volta umas bolsas empapadas
em oleo de motor;
— os utentes. em especial as criangas, nao se aventurarao a usar as
latrinas se a placa nao estiver fixa. Pode talvez ser preferivel nao a
coIocar directamente sobre o buraco,
— de uma maneira geral. este tipo de latrinas nao deve ser colocado num
terreno de nivel superior a qualquer fonte de agua; a qualidade da agua
dos pogos instalados nas proximidades tern de ser penodioamente
controlada.
Ha varios elementos extra que podem melhorar as latrinas de fossa. Um
tubo de ventilagao de plastieo negro, de 10 a 20 em de diametro. partmdo da
fossa e elevando-se a um metro aoima do tecto, oonduzos mauscheirospara
fora. Numa latrina bem ventilada havera menos moscas. Uma defesa contra
as moscas. colocada na parte superior do tubo de ventilagao. evitara que as
moscas escapem para o exterior. Podem construir-se latrinas, comoestruturaspermanentes. de duas fossas: quando a primeira estiver complete, utilizase a segunda e apos um ano, no minimo, deita-se o Iodo na primeira A
mistura de despejos organicos e cinzas, quando se fecha a primeira fossa.
produzira um composto utilizavel nas hortas e nos campos.
_ em casos de solos pouco consistentes e necessario reforcar as paredes
das fossas;
_ em geral, uma fossa deve ter um metro de largura e 3 a 7 metros de
profundidade, no entanto cavadores inexperientes nao deveriam descer
a mais de 3 metros;
_ quanto possivel, escavar asfossasdedimensbesgrandes. Se tern menos
de 2 metros de profundidade. as fossas provocam a propagagao de
doengas em vez de as evitar, pois as moscas reproduzem-se ai com
facilidade;
— o melhor material para a base da retrete e o cimento. mas deve alisar-se
bem a superficie superior para garantir uma boa higiene; se se utilizar
madeira e necessario que esta seja resistente as termitas (formiga
branca);
Esvaziamento
Esvaziar manualmente as latrinas e um processo barato mas pouco
higienico e nao e, em geral. adequado a uma comunidade
Instalagoes com obturador hidrdulico
As retretes com obturador hidraulico sao mais higienicas do que as
instalagoes sanitarias a seco mas torna indispensavel uma fonte de aprovisionamento de agua nas proximidades, pois e necessario jorrar no sistema
dois baldes de agua por dia para assegurar o funcionamento do sifao. Esta
solugao nao esta indicada quando nao ha agua em abundancia. Estas retre
tes tern ainda de ser construidas por tecmcos experimentados e ficam caras.
10*
Fosses septicas
As fosses septicas tambem devem ser instaladas por aiguern ©speciali
zed©. Cusiam bastante, todavia pode ser construida uma fossa p .blica. E
necessa. io prever um sistema de canalizaqao de agua, vigia-loregularmente
e mante-Jo em bom funcionamentc.
Retretes a escoamento de &gua
As retretesa escoamento de ague saoespecialmenteadaptaveisa casos
em que se utiliza a agua em banhoscie imersao. masdevem ser montadas por
um tecmco e supdem um abastecimento de agua suficiente. Asua instalaqao
e dispendiosa.
Mota da Redacqao
Gostariamos de iembrar aos leitores o artigo inclin'd© em Iddes et
Action n° 143 que explica detalhadamente o processo ate aqui utilizado
prmcipalmente na China de fabrico de gas metano (biogas) a partir de
!
excrementos e despejos vegetais introduzidos em digestores. Ai reside um
j
grande potencial de energia a disposicdo dos paises do Terceiro Mundo.
i_____________________________________________________________—
problemas relacionados com a agua. saneamento e doenpas; prob emas
ligados com o abastecimento de agua e saneamento em meio urbano e
rural; a necessidade de uma educapao para a saude.; esperanpas que a
Decada faz erguer e as possibilidades de as ver concretize das. Foi pubiicado pelo Institute Internacional do Meio e do Desenvoivimento (IIED);
pode obter-se na seguinte morada. Earthcan 10 Percy Street, Londres
WIP ODR. (Prepo £ RU 2.50: US S 6.25, versao em trances, ingles e
espanhol).
— InformapSo sobre a D6cada e um boietim informative que apresenta os
objectives da Decada, os investimentos no sector da agua, a tecnologia
(bombas manuais nas latrinas). content tambem estudos no Bangladesh,
na Colombia, em Marrocos, no Nepal, no-Niger, Paquistdo e SudSo. Para
obter-se pode requisitar-se a: Divis§o de Informapao do PNUO, United
Nations Plaza, New York. NY 10017. (versao em frances, ingles e
espanhol).
Fossas para fertilizantes
Para alem das latrinas cujo conteudo deve estar a repousar pelo menos
um ano antes de ser utilizado como fertilizente das hortas, asfossasdestinadas a receber os despejos caseiros podem igualmente constituir uma fonte
preciosa de elementos fertilizantes. 0 calor da fermentacao mata todos os
parasitas que se poderiam tornar perigosos ao poluir as hortas. Cobrindo os
despejos com uma camada fma de terra, reduzimos a proliferapao de moscas,
ao mesmo tempo que eliminamos os odores desagradaveis. Ao cabo de 6
meses de fermentacao, temos a nossa disposicao um excelente adubo.
SelecqSo de referencias
(Ddcada da Agua das Naqoes Unidas)
Preparam-se varias publicacdes
para a Decada Internacional da Agua
Potavel Seguem-se alguns titulos:
— Agua e saneamento para todos? Perspectivas para a Decada Interna
cional para a Agua Potavel e Saneamento, 1981-1990(Agarval A e col.).
Apos explicar as razbes que motivam o lanqamento da Decada, este
documento para a imprensa (n°. 22, 1980) de 20 paginas, analisa: os
- New Internationalist. n° 113, Setembro 1981: "Pure and simple, water
and the fight for life
editor D. Taylor. Em resumo: os problemas gerais
de acesso a agua e as desigualdades sociais; proiectos hidraulicos no
Senegal e na Indonesia. Abastecimento de agua a margem ocidental no
Jordao em Israel, doencas relacionadas com a agua. construpao de
latrinas. as mulheres e o transpose de agua. Enderepo: New Internatio
nalist. Montagu House, High Street. Muntmgton PEI8 6EP. Cambrigesshire, Remo Unido. Mensal; prepo do exemplar £ Ru 0.75; assmatura
anual £ RU 8,70 (igualmente disponiveis nas mstalapoes da revista na
Australia, na Nova Tailandia. no Canada e nos Estados Umdos)(somente
em ingles).
11A
— Waterline s' O primeiro numerode uma nova revista sobre as tecnologias
indraulicas apropriadas apareceu erri Julho passado. A citada revista e
eiaborada por "Intermediate Technology Publications Ltd”, 9 King
Street, LondresWC28HN Trimestral,assmaturaanuai £RU8(USS 16)
para instituipoes; £ RU 7(US $ 14)para particuiaresfsomenteem ingles).
A SAUDE DA MULHER E O DESENVOLVIMENTO RURAL
Actualmente. 260 milhoes de mulheres sofrem de anemia noTerceiro
Mundo, a maior parte devida a carencia de ferro. Os casos de mulheres que
morrem de parto sao de 100 a 200 vezes mats numerosos nas regioes rurais
do Terceiro Mundo do que nas regioes mdustrializadas, metade das quais
devido a abortos clandestmos. Normalmente. as mulheres gravidas trabaIham quase ate ao ultimo momento do parto. o que compromete ao mesmo
tempo a sua saude e a dos filhos. Em certas sociedades, especialmente
durante os periOdos de carencia. mulheres e crianpas ficam apenas com os
restos de cornida. A clitorectomia nas mulheres pode provocar um grande
numero de problemas de saude e ilustra o seu estatuto de completa subordi
nate nas sociedades onde ainda a praticam (ver tambbm p£ig. 13 do
boletim).
As mulheres desempenham um papel essencial em todos os dominios
que dizem respeito a saude: procnapao, educapao basica dos jovens, produqao e preparapao dos alimentos. transpose de agua e cuidados de saude
"tradicionais".
Pode pedir-se um dossier de material pedagogico: Mulheres, saude e
desen vol vimento (versdes em frances, ingles e espanhol, prepo FS10ou US
$ 5) escrevendo para Centre d'Education pour le Dbveloppement, FISE,
Bureau pour I'Europe, Palais des Nations, CH-1211 Geneve 10. Recomendamos ainda aos nossos leitoreso Repertoire Internacionalsur les Femmeset
la Santd (em frances. alemao, ingles, espanhol e Italiano), trabalho publicado
em conjunto por Boston Women's Health Book Collective (Box 192, West
Somerville, MA 02144, USA), e ISIS — Service Feminino Internacional de
informapao e de comunicapao (Caixa Postal 301, CH-1227 Carouge, Suipa,
ou Via Santa Maria dell'Anima 30,1-00186 Roma, Italia). Prepo US $ 5 ou (por
aviao) US $ 8.
AS DOENQAS E SUAS CONSEQUENCES EM MEIO RURAL
PALUDISMO
No minimo. um milhao de crianpas africanas com menos de 14 anos
morrem todos os anos de paludismo e a curva das mortes nao para de subir.
Segundo estimativas. 1800 milhoes de pessoas estao expostas a esta
doenpa. a qual voltou a aparecer em zonas de onde ha via sido erradicada. Os
mosquitos que a propagam tornaram-se resistentes a muitos pesticidas,
especialmente ao DDT e. em certas regioes. o mesmo parasita resiste a
medicamentos de uso muito corrente tai como a cloroquina.
Nas regioes onde ele grassa. o paludismo provoca acesso de febre.
Considerando que a maioria das vitimasde todasas idadessaorurais pobres.
entra-se num circulo vicioso, a doenpa reduz a capacidade de trabalho e
agrava a pobreza A febre e acompanhada por dores de cabepa e uma
sensapao de fadiga. Se nao e atacado, o paludismo pode provocar convulsbes, o coma e mesmo a morte. Se os parasitas existentes na regiao nao
desenvolverem resistencias ao medicamento, o tratamento com cloroquina
fazbaixar a febre. Uma unicadosede4pomprimidosde 1 50 mgegeralmente
eficiente para os adultos que habitam nas zonas infestadas. Para as crianpas
e mulheres gravidas, o tratamento deveria prolongar-se por 4 dias A ser
admimstrado do seguinte modo:
idade
+de 1 ano 1 -4 anos
5-8 anos
9-14 anos mulheres
gravidas
Primeira
dose
1/2 dose
1 comp.
2 comp.
3 comp.
Doses
seguintes
1 /4 comp. 1/2 comp. 1 comp.
4 comp
1 1 /2 comp 2 comp.
2-’ Dose: 6 horas depois da 1°. A 3a, 4a e 5a dose: Nos 2°. 3 0 e 4° dia
PROTECQAO CONTRA A POLIOMIELITE
A poliomielite propaga-se por contacto ou absorpao de alimentos
ou bebidas contaminados. Na maior parte das vezes, esta doenpa esta
associada a mas condipoes de higiene. Primeiro sente-se dores e
depois uma rigidez nas costas e nos membros inferiores. Cerca de 15%
das crianpas afectadas morrem e 50% ficam paralisadas. A vacma
pode-se administrar por via oral, em tres doses, e e eficaz.
12a
Se posjsve; deve fazer-se uma rp.-dbse ao sangue enias de uuc:ar o ira-^stico =
de paludisnw podem ser confirn atiGS nor
exame n'icroscopio r’occ '.'fr.'?
.?t iji<' *< 'j*<imenlo comp!3;'ic”‘'tdr p.:t.f-3
curar completer-iente a doanc.i
Ou uaiudismo existcnts n,< rec ao
resists aos medicamemos. deve cqqir- -t aiuda a peritos para d:‘!s:>.«nar <>
traramento apropriado. No entanto, tomar reguiarmenie cloroquinrr. um
med.camento barato, pode ajudar err m.nlas regibes
Mas nao chega diagnosticar a tuberculose. nem de a tratar ou mesmo
preveni-la vacinando as criancas O que faz com que algumas pessoas
contraiam a doenqa e outras sejant poupadas t a subrutripao cevida as
carencias alimentares.
Para a'em disto. ha varies merlidas -.iteis que podem ser iomadas evitar
as picadelas de mosquitos protegendo se com mosqudeiros ou uti'izando
produtos quimicos que os afastem, drenar e secsr, sobretudo no ambito de
projectos agricolas ou de construqao, os charcos de agua estagnada onde os
mosquitos se reproduzem. Mas o essencial e. evidentemente. assegurar um
traramento rapido a o doente Pulverizar ascasascom insecticidas para matar
os mosquitos pode dar resultados, desde que se conhega os habitos dos
mosquitos locaise a sua sensibilidade aosdiferentes produtos quimicos. Este
tipo de investigaqao e caro e exige uma alta competence; na maior parte dos
casos so se pode levar a cabo no qqadro de um programa orgamzado de luta
anti-paliidica. A maior esperanqa reside na descoberta de uma vacina que
podera ser aplicavel dentro de uma decada, se os esforqos que estao a ser
feitos forem coroados de exito Ate a data, como os tipos desta doenqa variam
muito de regiao para regiao, e aconselhavel consultar os agentes de saiide
que conhecem as variedades locals de paludismo, em ordem a determinar o
tratamento mais adequada para cada regiao.
A propagacao desta doenqa e uma consequenc.-a directa do desenvolvimento rural: a construcao de barragens e canais de irrigaqao criam vastas
zonas de aguas paradas, o que constitui um meio ideal para a reproduqSodos
parasitas. Mais de 200 milhoes de pessoas. nos paises do Terceiro Mundo,
sofrem de uma infeegao crdnica por vermes minuscules que se encontram
sob diversas formas nos seres humanos. nos moiuscos e na agua. A doenqa
passa por varias fases Quando uma pessoa toma banho em agua contaminada pode notar uma erupqao logo no dia segumte. Entre 3 e 7 semanas mais
tarde.declara-se uma febre alta, acompanhada de grande fraqueza. doresde
cabetja. diarreia e tosse. O figado e o baqo ficam inchados e no sangue —
quando examinado ao microscopic — encontra-se um grande numero de
eosinofilos. A febre pode manter-se ao longo de varias semanas. Quando a
doenqa se torna crdnica. os vermes depositam os ovos em diferentes partes
do corpo. Praticamente qualquer parte do corpo pode ser afectada e os
sintomas stlo, em geral, vagos: fraqueza, fadiga e falta de energia. Existe um
tipo de esquistossomose que provoca o aparecimento de sangue nas urinas:
a necessidade de urinar torna-se, nestes casos, urgente e o acto de micqao
doloroso.
TUBERCULOSE
No mundo existem 20 milhoes de tuberculoses, no minimo, e todos, e
todos os anos surgem 2 milhoes de novos casos. Em cada ano mor rem entre 1
e 2 milhoes de pessoas atingidas pela doenqa. A fraqueza e a tosse crdnica,
os dois principals sintomas da tuberculose, tornam muitas vezes o doente
incapaz de trabalhar.
A aeqao da comunidade pode facilitar a luta anti-tuberculose. sobcondiqao de se dispor de medicamentos suficientes; a tosse que propaga obaciloe
um sinal que nunca mente. Com alguma formaqao e a ajuda de um bom
microscopic porta til, o diagnostico pode ser confirmado na propria aldeia. 0
tratamento pode ser aplicado.em casa, masprolonga-se por varios meses. Ha
tambem que utilizer diversos medicamentos para evitar que o bacilo ganhe
resistencias.
ESQUISTOSSOMOSE (BILHARZIOSE)
Actualmente descobriu-se um medicamento que trata todo e qualquer
tipo de bilharziose: trata-se do praziquantel (uma dose unica por via oral de 40
mg por kg de peso) mas e bastante caro. Na Africa e no Medio Oriente. o
metrifonato e muito acessivel e eficaz contra o tipo urinario (3 doses por via
oral de 7,5 mg/kg com um intervalo de 14 dias. Na America Latina e nas
PROTECCAO CONTRA O SARAMPO
Dois milhoes de criancas com menos de dois anos morrem por ano
com sarampo, doenqa geralmente benigna nas criancas de familias
remediadas. As raizes do mal s3o a malnutriqao e as habitagbes superlotadas. A vacina que se descobriu contra o sarampo reduz o numero de
casos fatais, mas n3o se atacam as causas mais profundas que geram
as complicagbes mortals.
13a
l'ara'D°s^P00e -JtMzar-se oxamniquii-.g (uma unica dose par via oral de 15
TS, J' rara cilf!Cuitar 0 contagio e muito importante tratar das pessoas
3'ectadas.p0's 08 verlT>es saoexpulsos atraves da urinae das fezes atingindo
■ uca -_e. : r.
.U*.aos ou coi itaminando as ctguas. Ainda nao se deter mi no u
Sc e manor, em tamos de custos » beneficios. tratar todos os membros de
u na ,omunidade, on aqueles em quern a doenpa toi despistada, ou ainda os
gropes sociais mats vulnerdveis, como as mulheres a quern cabe a maior
parte eos trabaihos de lavagem o de transports de aguas.
No caso de existirem prograrnas eficazes de saude publica, estas diversas opcoes podem ser discutidas, eventualmente com os parses vizinhos. e
experimentadas. Na China foram as proprias comunidades que organizaram
a Iota contra a bilharziose e conseguiram ehminar os moluscos e seus
parasitas; no entanto esta soluqao so deu resultado nos casos em que a
popuiapao teve uma participaqao plena nodesenvolvimentosanitario. V^rios
pest ic idas foram expert me ntados nocombate a os moluscos, mas sem grande
exito. Com a secagem e drenagem dos canais de irrigaqao — onde os molus
cos proliferam — consegue reduzir-se a sua quantidade ate um maximo de
90% Mas torna-se necessario repetir esta operaqao durante os trabalhosde
manutenqao. Estudou-se a possibilidade de modificar a temperatura, a acidez. o grau de salinidade, a vegetaqao e o caudal de agua nos canais de
irrigaqao. Mas estas medidas nem sempre correspondent & verdade de muitas situaqoes, especialmente quando o processo de desenvolvimento e desigual e as condiqoes de vida da populaqao nao sofrem melhorias reais. O
proprio Banco Mundial esta decepcionado com estes resultados e investe
agora nas pesquisas sobre quimioterapia e molusquicidas.
Mas mais importante que tudo isto seria que as proprias populates
ameaqadas desenvolvessem um metodo adaptado & sua situaqao. E possivel,
com um minimo de formaqao, despistar a bilharziose atravds da microscopia
classics. A UNICEF vende os medicamentos contra a bilharziose a um preqo
relativamente baixo. Medidasde saneamento podem reduzir a contaminacao
das fontes de agua infestadas por vermes. Conversas sobre a doenqa podem
incentivar a populaqao a evitar a utilizaqao de agua contaminada.
DOENQAS DE CHAGAS
Aqui temos um exemplo tipico de doenqa que ataca os rurais pobres. Na
America do Sul. mais de 10 milhoes de pessoas sofrem deste mal. Adoenqa
comeqa na infancia e produz perturbaqdes cardiacas que levam & invalidez
por volta dos 40 anos. Os empregadores recusam frequentemente dar traba-
Iho a pessoas com esta doenqa, pois estas veem-se obrigadas a interromper
com frequencia o seu trabalho e morrem novas Os pobres estao mais
expostos a esta doenqa transmitida pelos percevejos que vivem nas gretas
das casas que habitant.
Nao existe nenhum tratamento eficaz. 0 DDT nao mata os percevejos
mas o "Gammexane" da bons resultados. E necessario pulveriz^-lo nas
casas, de duas em duas ou quatro em quatro semanas, no entanto, estas
pulverizaqoes comportam outros riscos, tanto para os que as electuam como
para os habitantes das casas desinfectadas. Uma solucSo consiste em mobilizar a populaqao com vista a levar a cabo uma campanha para rebocar as
paredes interiores das habitaqoes e calafetar as gretas nas quais os perceve
jos abundant.
VERME DA GUINE
Calcula-se que este verme filiforme vive debaixo da pele de 20 milhoesde
habitantes das zonas rurais da Africa, da peninsula arabica, da India e do
Paquistao. Em certas regioes, metade da populaqao atingida sofre ainda de
invalidez, o que se torna particularmente grave na epoca das colheitas,
quando a mao-de-obra e mais necessaria. A doenqa contrai-se atraves da
^gua que se bebe e que esta contaminada por outros nela terem lavado os pes
infectados. As larvas acumulam-se num organismo aquatico microscbpico
chamado ciclope.
Para elimmar o verme da Guine basta instalar canalizacdes ue agua, mas
este meio a caro. As comunidades podem, com custos acessiveis, construir
poqos rodeados de muros de cimento ou tijolo, o que ja impede que as
pessoas contaminem a agua. Foi este o metodo adoptadoem Andhra Pradesh
e Rajasthan na India. 0 processo queconsiste em filtrar a agua atraves de um
pa no antes de beber, deu bons resultados na Africa Ocidental. Aplicando-se
estas duas tecnicas, consegue-se prevenir a doenqa. A femea do verme da
Guine aloja-se muitas vezes por cima do tornozelo provocando um inchaqo.
Podemo-nos ver livre dele apanhando a cauda do verme, enrolando-a a um
pauzito (do tamanho de um fdsforo) e puxando-a devagar para fora, aos
poucos O tratamento com medicamentos e dificil edemorado Foram experimentados 4 medicamentos mas, Segundo a QMS, "nenhum e satisfatorio
para uma terapia massiva".
Parece que o unico meio de fazer desaparecer o verme da Guine e conseguir que a comunidade tome algumas medidas de saneamento de £gua.
14a
FILARIOSE
Mais de 250 milhbesdehabitantesdoTerceiroMundoest3oafectadospor
estes vermes. Mintos nem seqtier o sabem: os mosquitos, depots de picatem
as pessoas portadoras da doenga. v8o picar outras que estSo sas,
transmitmdo-lhes deste mode a doenca. Para estabelecer o diagnostico e
necessano examtnar o sangue ao microscopic. As pessoasatingidaspodem
ter acesscs repetidos de febre e as glanduias dolorosamente inchadas. Uma
perna ou um bracoafectados tambem podem inchar Trata-se a filanose com
citrato de diletil carbamazma em compromidos de 50 mg; a posologia e de 6
mg/ kg durante 1 2 dias. Noiniciodo tratamento. pode acontecer q ue o doe nte
tenna acessos de febre a medida que os parasitasmorrern Se osdoentes nao
sabiam que estavam atmgidos (o que acontece com aqueles que so sao
identificados durante uma campanha de despistagem) tern tendencia para
incriminar o tratamento. Na India este problems tornou quase impraticaveis
algumas campanhas massivas. Pode tambem administrar-se o DEC-C em
pequenas doses repartidas ao longode varios meses. Ha vanos problemasde
enriquecimento do sal de mesa com o DEC-C (0,3% durante um ano) que
tambem resultaram bem (e possivel levar as populapbes a participarem em
programas deste tipo).
A luta contra os mosquitos transmissores e geralmente inoperante. 0
emprego de insecticidas tern rnais inconvenientes que vantagens e para que
surtam efeito as operacbes tern de realizar-se continuamento ao longode 15
anos A coIocacao de mosquiteiros a volta das camas ou das janelas e portas
das casas custa caro e so muito relativamente se revelam eficazes.
VACINA ANTITETANICA
A bacteria do thtano penetra atravbs dos golpes e outras feridas; a
pessoa afectada sofre dificuldade em deglutir, convulsoes (que podem
provocar a fractura da espinha dorsal), paragens cardiacas eventualmente mortals. Calcula-se o numero de um milhSo de vitimas do tbtano
por ano, tendo a maior parte dos casos sido contraida durante o parto
efectuado em condiqoes n3o higidnicas. £ possivel inocular as gravidas
com anatoxinas tetanicas (duas doses com um intervalo de duas semanas por altura da 35a e 37a semanas de gravidez). Os recdm-nascidos
deviam ser vacinados pelo menos uma vez durante os primeiros meses e
depots deveriam ser revacinados por diversas vezes.
LEISHMANIOSE
Aproximadamente meto milhao de novos casos de mfeepoescausadaspor
flebotomas sao detectados em cada ano. Ha dois tipos principals de letshmaniose: um cutaneoe outro visceral. Os dots tipos clinicos podem encontrar-se
no mesmo perimetro geografico. No caso da leishmamose cutanea, o primeiro sintoma e um nodulo que se forma no local da mordedura do insecto
(flebotoma) e que depois itlcera. As ulceras formam-se em geral na parte
inferior da perna. Na maior parte dos casos elas acabam por curar-se num ou
doisanos, masse entretanto infectarem podem causar outros problemas. Por
vezes todo o corpo fica coberto de borbulhas sem que estes entrem em
processo ulcerativo. 0 kala-azar. o tipo visceral de leishmaniose, provoca o
inchaco dos orgaos infernos e a anemia. Aproximadamente 3/4 das pessoas
afectadas acabam por morrer se nao sao tratadas. Ainda um tipo, descoberto
no Brasil, e a leishmaniose muco-cutanea, ela provoca sequelas graves e
pode mesmo mutilar o doente. Nao existe uma terapeutica eficaz
Para combater os tipos curaveis de leishmaniose e conveniente fazer o
despiste dos seus sintomasclinicos e transportsr osdoentes para locaisonde
possam receber cuidados apropriados.
0 exame microscopico exige grande competencia, pois esta infeccao e
mais dificil de diagnosticar do que o paludismo ou a tuberculose, O trata
mento naoe muito agradavel: longoedoloroso, e administrado por injecebes.
As pulverizacbes com DDT durante a execucao de programas anti-paludicos
tern um efeito espectacular sobre o kala-azar. Apos a sua interrupcao as
epidemias de kala-azar podem trazer muito sofrimento. Uma medida eficaz
de saude publics e o exterminio de roedores, transmissores da doenca. Na
China, ela foi praticamente debelada pelo abate de c3es. Estes sao o principal
reservatdrio da infeccao na Africa do Norte. Como a doenca reveste formas
diferentes de regiao para regiSo, e necessario, antes de se empreender uma
campanha de abate, verificar se sao de facto os caes os transmissores da
infeccao (procedendo ao exame microscopico do sangue).
VACINA CONTRA A COQUELUCHE
80% das criancas n3o vacinadas contraiem a coqueluche e uma
cnanca em cada 50 morre devido 3s suas complicates As Z
vulneravets sao as cnancas malnutridas. E no entanto dispomos de
uma vacina eficaz.
punios ae
15a
’ fTiPAhJOSSOMOSE (DOENQA DO SONO)
LEPRA
. n'e
"" 9r3n':e diferenr,-a enire 3 tripanossomose que encontramos na
‘
Oiiental e na Atrice Gcacentsl. ernbora ambas sejam transmitidas por
A lepra, que remonta aos tempos mats longinquos. continua a fazer as
suas vitimas como na epoca biblica, so que agora, em vez de se espalhar pelo
mundo inteiro, esta circunscrita aos paises pobres (que riao se situam necessanamente sob os tropicos). Desconhece-se o numero exacto de leprosos e.
antes que o seu estado ten ha sidodiagnosticado, numerosos doentes teraoja
contagiado muitas outras pessoas. Calcula-se que existam na Africa
700.000 casos de lepra nao declarada e as estimativas sao analogas para a
Asia e America Latina. Devidoa perca de sensibilidade cutanea, sao frequentes nos leprosos as chagas, em particular nos dedos, nos pese noutras partes
do corpo de baixa temperatura. como ainda nos lobulos das orelhas e nas
sobrancelhas. Quando infecta. podem mutila-los. Existe um tipo de lepra
mais contagioso que os outros e que e reconhecivel mesmo num estado
relativamente pouco avancado. Toda e qualquer lesao nao dolorosa mas
persistente ou qualquer perda de sensibilidade do rosto, dedos. pes ou
orelhas deveriam ser consideradas como um possivel sintoma de lepra.
especialmente nos paises pobres. As lesoes sao irregulares e indolores e
muitas vezes a pele perde a sua cor natural. Para detectar nervos inchados.
outro smal de lepra, e necessario proceder se a exame microscopico das
lesoes cutaneas, o que exige uma certa competencia.
Me Anics Ocfdeniai, a tripanossomose ataca sobretudo as mulheres e as
cnan-ySS. Garacter iza-se por um inciraqodasglandulas, acessodefebre, uma
lassidao extrema; por frm ;> doente entra em coma Pessoas aparentemente
de excelente saude podem set portadoras da doenca. Na Africa Oriental, a
morte advem rapidamente se a doenca nao e tratada e as glandulas incham
menos Por outro lado, e raro que pessoas saudaveissejam transmissorasda
doenca.A chaga 'classica que se forma no local da mordedura uma semana
mais tarde, nunca se torna visivel para as pessoas que habitant petto das
regides infestadas. Ao fim de uma dezena de dias, os srntomas sao os
mesmos do paludismo e so quando se constata que o tratamento antipaludico nao esta a dar qualquer resultado e se descobre o parasita no
sangue e que se chega a um diagnd.stico correcto. Na Africa Ocidental pode
ser util anahsar o liquido glandular. Em casos em que a doenca entra ja num
estado avanpado a possivel que o parasita se encontre apenas no fluidc
cerebro-espinal. Deu-se um passo em 'rente com a descoberta de um comprimido que, diluido numa gota de sangue. toma uma coloraqao diferente
conforme se trata ou nao de uma pessoa afectada com o tipo oeste -africano
de tripanossomose. 0 unico tratamento v^ lido e a base de arsenico. No caso
de o parasita ter ja atingido o cerebro. o melhor medicamento e melarsoprol
(injectavel numa soluqao a 3,6%. E importante iniciar o tratamento com
doses muito pequenas (um decimo da dose completa) e ir aumentando
progressivamente Muitas vezes ha que recorrer a outros medicamentos
para que a preparapao de arsenico possa ser tolerada.
A razao principal de ocombate a tripanossomose conhecer progresses tao
lentos reside porventura no facto de esta doenca raramente atingir os habitantes dos paises mdustrializados ou as elites urbanasdos paises do Terceiro
Mundo. Por ano. ela mata "apenas" algumas centenas de camponeses
pobres em cada pais afectado. Por isso.as pesquisas em ordem a conseguir
novas terapeuticas nao saoconsideradas rentaveis. A limpeza dosarbustos
onde se encontra a mosca tse-tse, transmissor da tripanossomose da Africa
Oriental e muito cara, quer do ponto de vista financeiro pois e necessario
comprar pesticidas e pagar o trabalho. quer do ponto de vista humano pois a
mao-de-obra utilizada fica exposta as picadelas da referida mosca e aos
efeitos dos produtos anti-parasitas.
Para o tratamento deve combinar-se a aeqao de dois medicamentos'
geralmente dapsone e rifampicina. Se apenas se admimstra um deles —
quasesempre o dapnose — o tratamento tern dedurar pelo menos 5 anos, por
vezes a vida inteira A doenca mantem-se contagiosa durante grande parte
do tratamento. Esta e talvez uma das razoes por que nao se constatou uma
regressao consideravel da doenca. embora este medicamento tenha sido
fabricado em grande escala Os meios cientificos depositam grandes esperancas na elaboracao de uma vacina que (administrada em doses repetidas)
parece conseguir assegurar uma boa imunidade a lepra Ate que esta vacina
venha a ser produzida em grandes quantidades, as melhores arenas contra a
lepra continuarao a ser o diagnostico precoce e o tratamento prolongado.
Uma vez receitada uma terapeutica regular com umacombinacaode medica
mentos. as pessoas atingidas poderao sem perigo ser reintegradas nas suas
comumdades. Com efeito, esta reintegracao e altamente desejavel, pois a
comumdade aprende assim a conhecer melhor a doenca e odoente sente-se
encorajado a tomar os medicamentos com regularidade.
16a
AFECGOES dos olhos
Armazenamento das vacinss
.
At-.;; out? a-ctummente sc;a mais 'acil proceder fi,;
i ■:
o
transports e o armazenamento das vacinas em roeir-o ijra .t-juts
alguns problemas de ordem p>dtica. O "Appropriate Health .essand Technologies Actiori Group ■ ;d " (RHRTAG), 35 Marylehone . -<;r.
Street Londres W1M 3DE, acaba de publicar uma brochura qu-,: das
crave em termos simples como fazer a manutenpbo e rcoarar as .nstaiapoes frigorificas onde as vacinas sao guardadas.
BdCiO ENDEMICO
O bocio endemico. ou seja, o mchapo da garganta em consequencia do
mau funcionamento da tiroide, afecta, segundo se calcula, cerca de 200
milhoes de pessoas no mundo. Asjovensdas zonas rurais sao Ihe particularmente vulneraveis. 0 bocio tern como causa uma carencia em iodo; as suas
consequencias na mulher gravida sao muito graves, pois os filhos de mulheres por ele afectadas podem nascer atrasados ou surdos. O tratamento mais
eficaz consiste em juntar uma pequena quantidade de iodo ao sal da cozinha.
E melhor realizar esta operapao antes do empacotamento, sendo oaumento
de prepo desprezivel.
O bocio endemico constitui um tema muito adequado para uma participapao da comunidade local na investigapao. No caso de maisde 5% dos adolescentes apresentarem um inchago na parte da frente do pescopo, torna-se
urgente fazer pressao sobre os produtores de sal ou sobre o governo para
conseguir o sal iodado.
VACiNA CONTRA A DIFTERIA
A diftsria propaga-se pela
tosse e 6 em muitos casos
consequencia de uma urbanizap3o rbpida, "sub-produto” do
desenvolvimento rural. 0
doente sente dificuldade em
respirar e engolir. O pespoco
incha e os miisculos da garganta
contraem-se. Apesar de existir
uma vacina eficaz, ainda hoje
morre cerca de um dbcimo das
crianpas atingidas pela doenpa.
i
Nos paises industrializados, as principals causas da cegueira estao relacionadas com a idade (glaucoma, diabetes, degenerescencia ocular) e esta
doenpa nao afecta mais do que um ou dots individuos em mil. Nas regibes
rurais do Terceiro Mundo, a proporpao e dez vezes mais elevada, ora, em
muitos casos, os problemas oculares podiam ter sido evitados. As quatro
grandes" afecpoes dos olhos sao o tr acorn a. a xerofta Irma, a oncocercose e a
catarata.
Nos paises do Terceiro Mundo, 500 milhdes dos seus habitantes sao
vitimas do tracoma, sobretudo nas zonas superpovoadas onde a populapao
vive pobremente e em condipbes de higiene deploraveis. Quando tratado a
tempo e boras, o doente pode curar-se mas pode ter uma recaida nos meses
seguintes. Bastam algumas gotas de um antibibtico (cloramfenicol. por
exemplo) para se obter uma melhoria provisdria. No entanto, a infecpao
continuara a espalhar-se enquanto nao forem introduzidas meihorias na
higiene e nas condiqoes de vida em geral. E de toda a conveniencia associar a
comunidade a esta campanha.
A xeroftalmia (olhos secos) que pode ir atb a keratose pilar vermelha
atrofiante e perfeitamente evitavel se a alimentapao for rica em vitamina A,
que existe em alimentos como os legumes de cor verde escura ou frutos e
legumes amarelos (como a cenoura). Ainda neste dominio, a populapao local
deve ser associada numa campanha preventiva.
A oncocercose (cegueira dos rios) afecta cerca de 20 milhdes de pessoas
na Africa Oriental e na America Latina. Transmite-se por pequenas moscas
negras, que vivem perto doscursos de dgua e nas albufeiras das barragens. A
picadela destes insectos e muito dolorosa. Frequentemente, os primeiros
sinais de infecpao sao um prurido cutaneo, mas seguem-se complicapdes
mais graves quando os vermes atingem os olhos. O tratamento da oncocer
cose com DEC-C (citrato de dietilcarbamazine) nao se adequa verdadeiramente a campanhas massivas. E preferivel pulverizar com DDT nos locais
infestados por estas moscas.
A catarara, a opacidade do cristalino. e geralmente considerada uma
doenpa da velhice. Todavia, na Africa e na India ha muitos casos de jovens
cuja cornea foi afectada em consequencia de infecpbes ou feridas E necessSria uma intervenpbo cirurgica que. quando efectuada por um bom oftalmologista, 6 relativamente simples. Na India existe uma rede de dispensaries
oftalmologicos bem orgamzada, onde um cirurgiao ajudado por assistentes
competentes opera vanas pessoas por hora. O custo anda a volta de 5 dblares
por doente, a quern se db ainda um par de oculos de 3 ou 4 dblares
17a
PARA UMA MELHOR UTILIZAQAO OOS PESTICIDAS
Pressao e controlo gov-arnamental
Antes de adoptarem urn programs de utilizapaode pesticidas, os governos
dev.am estudar cuidadosamento as solupoes alternativas sem se deixarem
e!os meios
me
influenciar pelos
comerciais interessados 0 US Environmental Pro
tection Agency (EPA) de Washmgto. fornece informapoes sobre os pestici
das registados neste pais o os que nao for am admitidos, precisandoas razoes
da reteiqao.
Pode estudar-se a possibiltdade de criar um sistema de homologapao dos
pesticidas. no entanto. se os seus efeitos nao sao claramente assinalados,
este nao sera de grande utilidade Nos casos em que os pesticidas sao
reembalados ou ate produzidos localmente, os governos deviam tomar a
peito o controlo sobre os processes de fabneo Pode ser necessario que a
analise dos efeitos secudarios seja efectuada sem a participapao dos que
tiram proveito da venda desses produtos. Os governos podem ainda pressionar a OMS, a FAO. a OIT e outras insfituiqoes internacionais para que criem
um programs intersectorial com o objective de avaliar os efeitos dos pestici
das sobre os camponeses do Terceiro Mundo. Varias tentativas empreendidas neste sentido. no inicio de 1981, abortaram. Cabe aos Estados membros
das orgamzapoes internacionais retomar a iniciativa.
Pode conduzir-se uma campanha no sentido de fazer com que as normas
sobre o.uso de pesticidas na agricult ura sejam estabelec Idas em funpao das
suas repercussoes nao so na produpao mas tambem na saiide. E igualmente
necessario dar mais atenpao a procura de solupoes alternativas, como a
produpao local de anti-parasitas biodegradaveis. Neste momento, apenas
7,1% do programs de investigapao sobre as doenqas tropicais da OMS'Banco Mundial/PNUD se consagra a este tema. No piano nacional, os
governos podem tomar medidas que levem os interessados a saber manusear os pesticidas com toda a seguranpa, e divulgar informapoes sobre os
produtos toxicos e seus antidotos, bem como sobre oscuidadosa ter em caso
de acidente
Sera tambem conveniente restringir o emprego dos pesticidas, encorajando a "luta integrada'' contra os inimigos das culturas. Trata-se de um
conceito relativamente novo, fundado na convicqaodeque nao e automaticsmente necessario utilizar os pesticidas, mas apenas em caso de absoluta
necessidade quando uma planta esta doente. Casocontrario, e muito preferivel recorrer as tecnicas de luta bioldgica introduzindo os inimigos naturais
das pragas nocivas ao mesmo tempo que se recorre a pr^ticas de cultura
apropriadas, como uma rotapao de culturas A luta integrada pode ser sim
ples ou complexa, segundo as pragas e as culturas em causa, bem como
segundo a ecologia natural do pais.
Um exemplo interessante 6 o de Samoa, onde plantapoes de coqueiros
foram saivas pela introdupao artificial de uma doenpa que afecta o rinoceronte, um devastador feroz que ataca o corapSo da palma matando-a. Um
virus trazido da Malcisia dizimou o parasita e as plantapoes que constituem a
trave mestra da economia nacional foram poupadas
A FAO preconiza energiesmente a generalizapSo da luta integrada contra
os inimigos das culturas. que considera o meio mais seguro para destruir as
pragas, proteger o bem-estar dos homens e manter uma ecologia sa e
equilibrada. Alguns paises. nomeadamente a China, a India, a Mal^sia e o
Peru obtiveram bons resultados com a aplicapSo desta tecnica
Protecp3o dos utilizadores
Quando se utiliza um pesticida, convem escolher aquele que apresenta
menos riscos e nao o que se encontra com mais facilidade no comerciante
local; os utilizadores devem documentar-se sobre os diferentes grupos e
nomes de pesticidas. Depois de os ter utilizado, tern de se lavar cuidadosamente a pele a roupa de modo a reduzir as quantidades absorvidas. Uma boa
precaup§o e a de ensaboar as maos antes de comer, beber ou fumar.
Seria necessario, na medida do possivel, que os utilizadores participassem na avaliapao dos efeitos dos pesticidas. Sempre que utilizamos organofosforados (OF) pode ser indicado controlar as taxas de colinesterase no
sangue e no soro. Para tai existem instrumentosdecolrimetria que permitem
proceder a um milhar de analises (podem obter-se no Departamento de
biologia dos vectores e da luta anti-vectorial da OMS — cujo enderepo se
mdica na pag. 22 deste anexo.) Um operador com experiencia pode perfeitamente efectuar cerca de 40 analises por dia.
O que fazer em caso de intoxicap3o com pesticidas?
Em caso de intoxicapao, os conselhos que se seguem podem ser muito
uteis. E preciso evitar que a vitima se exponha novamente aos pesticidas, o
que poderia ser fatal, e delta -la de costas, voltando-lhe a cabepa de lado, boca
aberta. lingua para fora. Limpar a boca e a garganta com um pano limpo. Deve
evitar-se a reanimapao oral quando o veneno se introduziu pela boca, mas
podemos pratic^-la se a intoxicapao se deu por inalaqao.
18a
Se a vitima perdeu os sentidos ou se a matdria toxica provocou queimaduras ou dores na garganta ou no estomago, nao devemos faze-la vomitar.
Facamo-la beber leite ou, na falta deste. agua para acalmar as dores. Se a
vitima esta no seu estado de consciencia e ndo sente dores, devemos darlhe
leite ou agua e faze-la vomitar metendo lhe um dedo ou uma colher pela
garganta abaixo. A cabeqa deve ser mantida inclinada para a (rente, para
evitar que os pesticidas penetrem nos pulmoes enquanto a pessoa vornita. Se
a materia toxica entrou nos olhos, estes devem ser lavados com agua, no
minimo durante 10 minutos. A roupa e a pele tern de ser lavadas com sabdo.
Em caso de haver sintomasdeenvenenamentocom algum OP, enecessario dar uma .njeccdo intramuscular de 2-4 mg de sulfato de atropina e 1 -2 g
de cloruro de pralidoxina (PAM) ou uma mjecqao intravenosa, dada lentamente, de 250 mg de ciorurode obidoxima (doses para adultos). No caso de os
sintomas persistirem pode prolongar-se a injecqdo de sulfato de atropina. No
caso de envenenamento com carbonatos, deve dar-se uma injeccao intra
muscular de 1 -2 mg de atropina. mas nao de cioruro de pralidoxima (PAM).
Nao existem antidotos especificos para os outros pesticidas.
Para uma vigilancia iocal dos pesticidas:
participate na investigagao
A investigaqao participada pode ajudar a populacdo local a desenvolver os
seus conhecimentos e a "amadurecer as suas decisdes''. Ela d especialmeme util para os trabalhadores que se expdem. correndo por consequencia
grandes riscos 0 simples facto de estabelecer uma lista dos possiveis efeitos
dos pesticidas e discuti-los com os interessados para detectar as pessoas
afectadas. tern so por si um impactopedagogico. Informacdes iiteissdoassim
proporcionadas dqueles que tern necessidade delas. Por outro lado, e provdvel que a populaqdo aprenda assim a proteger-se melhor. E claro que terd de
se agir com muito tacto naquelas situaqoes em que as organizacoes de
trabalhadores nao sdo vistas com muitos bons olhos, mas uma campanha de
informaqdo pode ser muito bem conduzida junto das pessoas em causa. Os
resultados podem servir de base a uma auto-organizaqdodas pessoasque se
expbem, e levar a que melhorem as suascondiqdesde trabalho, quer directamente quer chamando a atenqdo para as condiqdes insatisfatdrias existentes. Hd alguns anos, na cidade de Quezon nas Filipinas, organizou-se uma
Junta de assistencia aos agricultores com o fim de estudar a utilizaqdo dos
pesticidas na zona. Na Malasia, a Associaqao de Consumidores de Penang
constitui outro exemplo de investigaqdo comunitdria (ver Ideias e Acgdo n°
116, pdg. 38-41 en° 132, pdg. 17-21). Durante os 10 ultimos anos descobriuse a presenqa de muitos residues de pesticidas (que tinham sido proibidos
nos Estados Unidos, alguns ha muito tempo) na dgua da chuva, na agua
potavel, no solo e nas culturas alimentares.
Para aqueles que se propbem empreender uma aeqao a nivel local,
recomenda-se as seguintes medidas:
1. Determinar o produto quimico empregue (OP, carbonatos. etc.).
2 Requisttar ao fornecedor, produtor ou ao empregador uma folha com
informaqbes.
3. Recusar confiar nas indicaqoes tipo "ndo houve provas de efeitos
nocivos.
4. Estabelecer uma lista de todos os efeitos possiveis, em referenda a
este artigo, as folhas de informaqdo. ds ideias expresses pela propria
populaqao
5. Quanto ds perguntas a coIocar aos fabricantes ou aos responsaveis
pela pulverizaqdo:
— Fez-se alguma coisa com o objectivo de obter provas dos perigos que a
longo prazo vem com a utilizaqdo dos pesticidas?
— Para alem dos efeitos imediatos, o que vird a acontecer a mais longo prazo
aos pesticidas e aos parasitas? Os pesticidas manter-se-3o activos? 0
parasita ganhard resistencias?
— No caso de uma campanha alargada de pulverizaqoes levada a cabo sem
qualquer consults h populaqdo, o que estd previsto quanto d avaliaqSo de
efeitos secunddrios a curto e mddio prazo sobre os seres humanos, os
animais e os vegetais da regido?
— Existirdo outros pesticidas menos tdxicos eventualmente com o mesmo
tipo de acqtSo? Ndo haverd outros meios de combate?
6. Discutir cada uma destas questdes com as pessoas expostas e determi
nar o numero das que foram contaminadas.
7. Estabelecer comparaqoes. Enumerar todos os casos de infecqdo que
foram diagnosticados na comunidade (por exemplo: problemas oculares
eczemas, abortos, malformaqdes congdnitas, impotencia). Investigate em
cada caso, o mteressado ndo tera estado em contacto com pesticidas e
determmar durante quanto tempo. Determinar a percentage™ da populacdo
que, embora tenha sido exposta aos pestic.das, ndo ficou contaminada Em
comunidades muito numerosas, podemos proceder por sondagens e fazer
por exemplo. um inqudrito numa escala de 1/10 ou 1/100 das habitaqbes'
19a
8. C Caicuio dos riscos das pessoas expostas pode ser feiio por uma
equaqao muito simples:
Numero de
pessoas
exposias e
contam madas
Numero de
pessoas
nao expostas
e nao contarninadas
Numero de
pessoas
contarninadas
mas nao
expostas
Numero de
pessoas
nao contaminadas
mas expostas
------------- - estimative do risco
Por exemplo. se em 36 pessoas que tenham procedido a pulverizacbes, 10
sofrem de problemas oculares contra 3% no restoda comunidade, a equacao
e a seguinte:
10
x
97
------------------------- = 12.4
3
x
26
97 obtem-se deduzindo 3 de 100 e 26 deduzindo 10 de 36. Noutros
termos, aqueles que procedem a pulverizacbes tem 12 vezes mais possibilidades de sofrer de problemas oculares que os outros. Nem sempre e muito
fact I determinar se estes problemas nos olhos sSoefectivamente devidos aos
pesticidas. Por outro lado, nos casos em que o numero de pessoas expostas 6
muito reduzido e em que os problemas sejam muito raros, 6 possivel chegar a
conclusao de que nao existe "qualquer risco", quando na realidade ele existe
mas o estudo foi demasiado limitado para o determinar.
Tipos de pesticidas
Organofosfatos IOP)
Os OP, em especial o paratiao, sao os pesticidas que provocam mais
mortes Em 1975 no Paquistao, onde se utilizou o malatiao num programs de
luta anti-paludica, em 7.500 pulverizadores 2.800 adoeceram e 5 morreram.
Apesar disto, tem havido ao longo destes ultimos anos uma progressao
espectacular do empregodos OP, em substituipaodos pesticidas "classicos"
como o DDT.
Os sintomas de intoxicacao benigna sao a lassidao, dores de cabeca.
vertigens. estados de confusao mental, engrossamento dos dedos das maos
e dos artelhos, nauseas e vbmitos. dificuldade em respirar, transpiracao
excessiva, dores abdominais e diarreia. Se a intoxicacao for mats seria. para
alem de todos estes sintomas a vitima deixa de andar, sente uma fraqueza
generalizada e tem dificuldade em falar. Em casode intoxicacao grave, perde
em geral a consciencia e respira com dificuldade. a paralisia atingeosbracos
e as pernas e as pupilas contraem-se. Um dos efeitos dos OPe reduzir o nivel
de um determinadoenzima.chamada colinesterase, no sangue; a concentracao pode ser medida para vigiar a exposiqaose dispusermos da aparelhagem
necessaria
Em caso de intoxicacoes com OP, o antidoto e o sulfato de atropina
injectbvel. 0 cloruro de pralidoxima (PAM) se for administrado a tempo apos
uma intoxicacao aguda pode contrariar alguns dos seus efeitos.
Pouco se sabe dos efeitos a longo prazo dum eventual envenenamento,
seja ele de tipo agudo ou cronico. Traumatismos emocionais, da memdria e
do comportamento foram detectados apbs seis meses, e as vezes mais, do
acidente. Tambem sabemos que os problemas causados a nivel do sistema
nervoso podem so se manifestar depots de algum tempo. Nos Estados Uni
dos, nos anos 30. milhares de pessoas foram atingidas por uma doenqa
chamada "ginger jake paralysis" apds terem consumidobebidascontamina
das a base de gengibre da Jamaica. Em 1 959, a venda como dleo culinariode
carburantes contendo OP, como azeite de cozinha, produziu varios milhares
de casos de intoxicacao em Marrocos. Em 1976, a "Occupational Safety and
Health Administration" (OSHA) do Ministerio do Trabalho em Washington
revelou que os operdriosde uma fdbrica de leptofos do Texas tinhamacusado
graves desordens do sistema nervoso central. Os seus camaradas tinhamlhe posto a alcunha de "Phosvel Zombies" ("Phosvel" e a marca da fabricado
leptofo). pois eles nao conseguiam coordenar os movimentos e eram incapazes de trabalhar, exprimir-se com clareza ou reflectir. Os operarios levanta
ram um processo contra a sociedade, que fechou a fabrica, mas que
continuou a exportar pesticidas para oTerceiro Mundo. Em 1978, ela levou a
cabo tres operacoes de exportaqao para a Costa Rica com uma licenca de
importacao oficialmente concedida pelo Ministerioda Agriculturadeste pais.
Na Colombia, o "Phosvel" foi proibido em Julho de 1977. Entao a sociedade
transfere os seus restantes stocks para uma zona franca, juridicamente
situada fora da esfera de competencia da Coldmbia e prosseguiu as suas
vendas aos paises vizinhos, onde o produto ainda nao fora interdito
20«
Podemos citar como exemplos de OP: o mevinfos, fosfamidao, paratiao,
malanao. etiao. triciorfone. crufomate, leptofos, ENP, clorpirifos e diazinon
Carbonatos
Uti lizamos os pesticides deste grupo contra os insectos e as ervas damnhas. A sea utilizacao e basrante corrente, embora numa escala diferente e
inferior a dos OP.
Os efeitos secundsnus sao mferiores aos dos OP. mas aparecem, sent
qualquar du ’id; . maiscodo. E de esperar que uma pessoa exposta procurers
proteger se assim i menus urovAvel que venha a absorver uma dose ;a
toxica. Em :.aso de intoxicaqao com carbonatos. recorrese tgualmente ao
sulfato de atropma, mas o ctorelo de praiidoxima (PAM) deva excluir-se
Alguns exemplos de carbonatos: manebe, zinebe. zirame. carbaril, metomil, EPTC a butilato
Hidrocarbonetos de doro
S§o os pesticidas como o DDT. a dieldrina, toxafene, clordane. Iindano e
hexaclorobenzeno (HCB).
Nao sabemos ao certo quais sao os efeitos nocivos destes pesticidas no
homem, mas provocam ansiedade, tremuras, excitabilidade e convulsoes;
podem mesmo levar a morte. Mesmo passadobastante tempo sobre a expos!
Cao a estes produtos, podem persistir lesoes cerebrals, hepatites, anemias e
uma gama variada de problemas de pele, rigidez das articulacoes e perca de
peso. Alguns causam esterilidade e cancro. Nao existe tratamento contra a
intoxicaqao causada pelos hidrocarbonetos dorados.
(especialmente b volta dos olhos) e afecta o figado, o metabolisms das
gorduras, a formaqao do sangue, a aprelho cardiovascular e as reacQbes e
imunizacao. A dioxina tambem e cancerigena e provoca deformacoes conge
nitas Ela afecta tambem o ouvido e o gosto; por outro lado. parece que ela
provoca ainda irritabilidade, insdnias, uma perca de energia e. em alguns
casos, impotencia. Manifestacoes psiquiatricas sao frequentes e amiude
graves.
DipiridHos
Sao herbicidas de contacto o paraquat, diquat e morfamquat.
Responsabiliza-se muitas vezes o paraquat por intoxicacoes mortais que
provocam a morte em poucas horas, ou ate tres semanas, apds a primeira
exposicao. NSo existe nenhum antidoto. Entre 1 962 e 1 981 registaram-se ao
todo 1 24 mortes devido ao paraquat, sobretudo em consequencia de lesoes
pulmonares.
Fumigantes
Tetracloreto de carbono, brometo de metilo, disulfureto de carbono DBCP
(1,2 dibromo-3-cloropropano).
Entre os efeitos secundbrios dos fumigantes podemos citar a ictericia,
insuficiencias renais, problemas psiquicos e esterilidade. 0 disulfureto de
carbono 6 muitas vezes responsavel por traumas cardiacos entre aqueles que
o utilizam com frequencia. Tambem neste caso nao existe qualquer antidoto.
Compostos de dorofenoxi
Entre os pesticidas (herbicidas) deste grupo, cujo numero ultrapassa os
150, os mais utilizadossaoo2,4-D eo2,4,5-T, o MPCA(oxido metilclorofenoxiac^tico) e o "Silvex".
SELECQAO DE REFERENCIAS
(relatives ao artigo sobre os pesticidas)
Os poucos dados de que dispomos sobre o 2,4-D e o 2,4,5-T indicam que
eles podem estar na origem de deformacoes congenitas, abortos espontaneos e cancro no figado.
Chapin G e Wasserstrom R., “Agricultural production and malaria resurgen
ce in Central America and India", Nature (vol.293, n° 5829, 1 7 de Setembro
1981), Londres. Seman^rio publicado em ingles; assinatura anual' £ RU 85
(ISSN-0028-0836).
Os pesticidas deste gru pos s3o misturados frequentemente com um
produto quimico muito toxico, a dioxina, que provoca problemas cutaneos
Weir D. e Schapiro M„ Pesticides sans front/eres. Publicado em frances e
ingles. Declarac3ode Berna, CU-1000 Lausanne, Suica, 1982. (Preco: FS 8).
21a
Bull D., A Growing Problem: Pesticides and the Third World Poor. Publicado
apenas em ingles por OXFAM e distribuido por Third World Publications,
Birmingham, Reino Unido, Julho 1982. (Preqo: £4.95).
Sa ha bat Alam Malaysia (Amigos da Terra — Malbsia), Pesticides Problems in
a Developing Country — A Case Study of Malaysia. Friends of the Earth
Malaysia Penang, Malasia, 1981 (apenas em ingles. Preqo: US $3).
ICAi 11, c studio de las consecuencias ambientales y economicas de! uso de
pfaguicrdas ■?/> la produccidn de algodon de Centroamirica. Relatdrio final.
Institute centroamericano de investigate e tecnologia industrial (ICAITI) e
Academia das Ciencias dos Estados Unidos (NAS), Guatemala e Washington,
Janet: p 1977. Em espanhol e ingles (prego. US $ 30)
OMS, Seguranga na utilizacao de pesticides. Serie de relatbrios tecnicos 51 3
OMS, Geneve. 1973 (em frances, espanhol, ingles e russo).
— Seguranpa na utilizagao de pesticidas. 3° Relatbrio do Cornitb da OMS
de pentos de biologia de vectores e da luta anti-vectorial. Shrie de Relatbrios
tbcnicos 634. OMS. Geneve, 1979 (em frances. ingles e espanhol).
BIT. "Dans la lutte centre la pauvrete rurale la croissanvce ne suffit pas".
Informations CUT. BIT. Vol. 16, n° 1, Fevereiro de 1980. Publicado 5 vezespor
ano em 15 idiomas.
•— Safe Use of Pesticides: Guideline. Sbrie seguranpa, higiene e medicina
do trabalho 38, Geneve. 1977 (apenas em ingles).
Metcalf R.L., "Integrated Pest Management", CRY California. California
■Tomorrow. San Francisco, USA. vol. 15, n° 1, inverno 1979-80 (trimestral,
apenas em ingles).
US Peace Corps, Pesticides — Resource Packet m2. Duasbrochuras, 1977 e
1978, publicadas por Information Collection and Exchange, US Peace Corps,
Washington (material educativo para um manuseamento dos pesticidas
exempto de perigos).
Os pedidos de informacdes relatives a publicacoes sobre os pesticidas
Ique sao em geral de natureza muito tbcnica) devem ser dirigidos ii Seccao
de distribuigao e vendas. Divisao de publicacoes. FAO. 1-00100 Roma.
O TABACO E O DESENVOLVIMENTO RURAL
Sem falar nos sofrimentos humanos ocasionados pelo vt'cio do tabaco,
fumar implica custos elevados tanto no piano social como economico, mas
tais incidencias so se fazem sentir a longo prazo. Mas, por outro lado, a
cultura do tabaco garante aos proprietaries das plantapoes um lucro imediato. Esta constitui igualmente uma fonte abundante de receitas e divisas
para os governos. As vantagens a curto prazo que os proprietbrios rurais e o
Estado retiramdela tern comocontraponto uma reduqbo das culturas alimentares de que os camponeses pobres se ressentem. Nos pai'ses industrializados onde os proprietaries rurais e o Estado nbo se interessam muito pela
cultura do tabaco; a grande preocupato com os perigos do tabaco estb
sobretudo orientada para o que ele represents para a saude dos fumadores.
Muitos destes paises chegam actualmente a exigir que os prbprios maqosde
tabaco contenham informaqbes sobre os maleficios do tabaco, com excepbo
daqueles que se destinam a ser vendidos no Terceiro Mundo.
A producao de tabaco estb em grande parte concentrada no Terceiro
Mundo; assim, em 1979, para uma producSo total de 5,5 milhoes de toneladas, 63%provinhamde paises em desenvolvimento, enquantoque na dbcada
de 60 esta proporqbo nbo ia albm dos 52%. Nos Estados Unidos e Canadb, a
produpSo de tabaco diminuiu a medida que a agricultura se diversifies; pelo
contrbrio, ela fornece mais de 50% das receitas de exportagoes agricolas do
Zimbabwe, do Malawi e da Zambia, mais de 25% das da Turquia e cerca de
10% das da India, Paraguai e Republics da Coreia. Nestes paises. muitos
pequenos agricultores substituiram em parte as culturas alimentares por
culturas de exportagbo e veem-se muitas vezes expulsos das suas terras
porque sSo incapazes de suster a concorrencia dos grandes monopblios no
mercado do tabaco. Deste modo, a produgbo alimentar no Terceiro Mundo
estb em regressbo, um numerocada vezmaior de agricultores sbo marginalizados, as receitas fiscais e de exportagbo sbo engolidas pelos burocratas
administrativos, o produto final b vendido sem restrigbes e a publicidade 6
livre.
Para albm de incitamentos pouco convincentes encorajando a diversificagboda
produgbo, nbo hb grande coisa a fazer
para melhorar esta situagbo b escala
internacional. Aofim e aocabo, so a populapbo rural estaria b altura de conduzir
uma aegbo eficaz, mas para tanto. 6 primeiro que tudo necessbrio que esta se
organize a nivel local.
22a
MORADAS UTEIS
(no que respeita ao saneamento s aos pesticidas)
Centro internacional de referenda (CIR) para o abastecimento colectivo de
agua e saneamento (em colaboracao com a OMS)
C P. 5500
2280 HM Rijsawijk, Holanda
Intermediate Technology Development Group
9 King Street
Londres WC2E 8HN
Rdss Institute for Tropical Hygiene
c/o London School of Hygiene and Tropical Medicine
Keppel Street (Gower Street)
Londres WC1E 7HT
WASH (Water and Sanitation for Health Project — USAID)
Coordination and Information Center
1611 North Kent Street. Suite 1002
Arlington, VA 22209, USA
Environment Sanitation Information Center
Asian Institute of Technology
P.O. Box 2754
Bangecoque, Tailandia
Centre international de reference (CIR) pour levacuation desdbchets solides
(em colaborapao com a OMS)
Ueberlandstrasse 133
CH-8600 Diibendorf, Sunja
Division de la biologie des vecteurs et la lutte antivectorielle
Organizapao Mundial de Saude (OMS)
CH-1211 Geneve 27.
(Podem dirigir-se a esta divisbo para obter o necessario para controlar as
taxas de clorinesterase no sangue e no soro quando duma intoxicate por
organofosforados. A dita DivisSo fornece igualmente, a pedido, fichas informativas sobre a maior parte dos pesticidas empregues correntemente, que
sSo muito tecnicas mas^completas e detalhadas).
Asia Monitor Resource Centre
2 Man Wan Road
17-C Kowloon, Hong-Kong.
(Centro de pesquisa sobre os perigos que representa a utilizaqao dos
produtos quimicos, incluindo os pesticidas. Possui documentapao de refe
renda disponivel; produz material educativo e encoraja a investigapao neste
dominio. Interessa-se prioritariamente na organizapao "de base" de estudo
das questbes de riscos quimicos).
Health Development Consulting Collective (BM HDCC)
Londres WC1N 3XX
(Colectivo que proporciona uma rede internacional de especialistas em
numerosos assuntos de medicina e saude publica. Ele pode dar conselhos
sobre os metodos a seguir se se quer fazer uma avaliapao dos efeitos de
envenenamento com pesticidas).
Acpao sanitaria internacional
c/o Bureau regional de I'lOCU pour I’Asie et le Pacifique(organizapao inter
nacional das unices de consumidores)
C.P. 1045
Penang, Malasia
(Rede oficiosa de grupos de consumidores, grupos profissionais, de acpao
para o desenvolvimento e outros grupos de interesse publico que se ocupam
de questdes relatives a produtos quimicos. Publica urn boletim bimestral_
edipao em ingles e malaio — para os seus membros).
Environment Liaison Centre
Ministere de I'Environnement
C.P. 72461
Nairobi, Kenia
GRET (Groupe de recherche et d'dehanges technologiques)
att. J.-M. Collombon
34, rue Dumont d'Urville, F-75116 Paris
Appropriate Technology Development Association
att. M.M. Hoda
P.O. Box 311, Gandhi Bhawan
Lucknow 226001, Uttar Pradesh, India
23a
Periodicos (gratuitos ou a baixo preqo) sobre a saude
Indice
Contact Comission Medicale chertienne (CMC), Conseil Ecumenique des
Eglises (COE), Case Postale 66. CH-1211 Geneve 20.
Descreve frequentemente programas comunitarios e inovadores de
saude (bimestral, gratuito; ediqoes: (rances, ingles, espanhol e portugues).
Forum Mondial de la Santb Revue Internationale de developpement sanitaire. OMS, CH-121 1. Geneve 27.
Foi concebido como um espatjo de discussao para as pessoas interessadas nos cuidados primaries de saude (trimestraI; FS 10 cada numero, FS 40
— assinatura anual; ediedes: frances, ingles, arabe, chines, espanhol e
russo).
Reportono de tecnologias apropnadas ..........................................
2A
— a desidratacdo e a diarreia..........................................................................
3A
Medica memos
4A
5A
....
notas para a utihzac^o da lista de medicamentos
Expenencias comumtanas e programas de formacao de agentes sanitarios
Health Links Third World First, 232 Cowley Road, Oxford 0X4 1UH, Reino
Unido.
Brochuras que se debruqam sobre questoes de saude relacionadascom o
Terceiro Mundo e contendo bibliografias e guias de referenda (preqo: £ RU
0,80 cada numero; sb em ingles).
Alguns principles fundamentals de saneamento rural
Link ACHAN (Asian Community Health Action Network), Flat 2A, 144 Prince
Edward Road, Kowloon, Hong-Kong.
Oferece uma rede completa de actividades de saude comunitaria na Asia
(gratuito, sb em ingles).
A saude da mulher e o desenvolvimento rural...............................
Salubritas APHA (American Public Health Association), 1015 Eighteenth
Street NW, Washington, DC 20036.
Colecqao de informatjoes uteis sobre a saude (trimestral; gratuito; ediqbes: franceds. ingles e espanhol).
-
- independent farmaceutica ....................................................
—Jista de medicamentos essenceis nos dispensaries rura.-s
— aigumas referencias bibliograficas (saneamemos)
6A
8A
.
.
.
8A
— fossas para adubos...................................................................................... 10A
— seleccSo de dados de referencias (Decemo da Aqua das Nacdes Unidas) 11A
....
. 11A
As doenqas e suas consequents em meio rural
11A
paludismo...............................................................................................
- tubercuiose. quistosomiase (bilharziose) ...
— doenca de Chagas, verme da Guine ...
. 12A
.......................
13A
..................................
—? fiiariosa. leishmamose..............................................
... 14A
...
. . 15A
— doenca do sono. lepra................................ .
— bocio endemico. afeecdes dos oinos ....................... ................................
16A
- medidas de proteccao contra aigumas doencas.................. 11.12.13.14.16A
TALC (Teaching Aids at Low Cost), Foundation for Teaching Aids at Low
Cost, Institute of Child Health, University of London, 30 Guilford Street,
Londres WC1 N 1 EH.
Produz diapositivos a cores, diagramas, grafismos, opusculos e manuais
para utilizaqao dos agentes e momtores sanitarios.
A s Hstas que precedem nao tern a pretensao de ser completes e tern por
base o material a disposiqao do co-redactor e dos membros do colectivo de
redaeqao. Esperamos contudo que elas venham a permitir aos leitores
entrar em contacto com pessoas. grupos e autores que lhes possam ser
uteis.
— seleccSo de dados de referencia (pesticidasi............................................. 1 7A
0 tabaco e o desenvolvimento rural...............................................................21A
Lista de moradas uteis .................................................................................
22A
Lista de publicacbes sobre a saude..................................................
23A
ILUSTRAQOES
Desenho da Ddcada um ano depois(PNUD) 3A. desenho(adaptado)do New In
ternationalist (Oxford. R U ). Marco 1980 4A (a direita). fotode M Zeller (fetta no
Gana}
10A. desenhos de Principios de protecq£o contra aigumas doenqas
correntesem zonasdesdrticasICESTAS. Bolonha. Italia). 1982 16A, desenhode
Saude do Mundo (OMS). Janeiro'Marco 1980 21A. pag 24A extraida (e adap
tadaj de Saude do Mundo. Setembro 1973
24a
bium v u lg a re
♦
n y ria n th u s a rb o re u s * ric ra lim a n itid a
•
S e c u rin e g a su f
Oioscorides, que viveu no seculo I. escreveu o primeiro tratado de materia mddica (descrigSo das espe
cies medicinais). 0 seutrabalhoseria considerado uma
autoridade durante 1600 anos.
Na ilustracSo ao lado (tirada de urn manuscrito do
seculo XIII originario do norte do Iraque ou da Siria) ele
expoe as virtudes da mandrSgora.
Os conhecimentos sobre as propriedades das plan
tas foram transmitidos de gerac3o em geraqao pelo
ensino de mestre a discipulo.
* pyxsoddo erpunysOH » exiojnpt pxjbuth • eorurs expands , pajndjnd
So com a condipao de tomarem parte neste processo de transformapao e
Que os agentes de saude poderao cumprir cabalmente a sua missao. Com
esta estrutura vertical" da formapao, dospoderesedasresponsabilidadese
muito dificil que os programas publicos — por muito bem intencionados que
sejam
preparem agentes de saude para desenvolver uma acpao dinamica
centrada na populapao.
Uma alternative: agentes de saude comunitaria que
sejam responsaveis, em primeiro lugar, perante os
desfavorecidos
Se os grandes programas centralizados, na maior parte dos casos, so
conseguiram criar uma participapao comunitaria de fachada, nao invalidam
no entanto que existam em muitos paises excelentes exemplos de cooperapao activa entre os membros de uma comunidade no dominio da saude.
Assistimos especialmente a urn brotar de iniciativas privadas modestas que
se vieram a desenvolver no seio das comunidades, para responder ds
necessidades populates.
Nestes programas. agentes de saude de tipo novocomecaram a desempenhar um papel preponderante. Existe uma semelhanpa evidente em muitas
partes do mundo — Bangladesh, India. Filipinas. Mexico, Nicaragua, Hondu
ras, El Salvador, Guatemala — entre os papeis destes agentes de saude,
tanto no piano socio-politico como a nivel de direcpao, em programas estabelecidos em prol da comunidade.
Estes agentes tern em comum uma entrega total ao service dos pobres.
Eles identificam-se profundamente com os mais miseraveis, perante quern
se sentem responsaveis. 0 seu lema e a saude para todos, mas uma saude
baseada na compreensao. na igualdade, na distribuipao equitativa da terra,
da riqueza e do poder, na justipa politica.
Enquanto que nos programas centralizados o esforpo educativo tende
geralmente para modificar as atitudes e os comportamentos dos pobres. os
programas de base comunitaria empenham-se em ajudar a populapao a
transformar o meio.
Um dos aspectos mais apaixonantes deste novo movimento mundial de
base comunitaria, amda que descentralizado e heterogeneo, do facto de ele
nao estar enfeudado a nenhuma doutrina rigida, religiosa ou politica. Contrariamente a muitas opinioes, os que o compoem nao estao de modo nenhum
alinhados com organizapdes comunistas militantes. Com efeito, a maior
parte dos seus dirigentes reconhece os perigos que representa uma integrapao num sistema rigido e centralizado, seja ele comunista ou capitalista. Tern
mais confianpa em grupos restritos de trabalhadores do que nas grandes
instancias centralizadas, seja de que natureza forem. Longe de aderirem a
dogmas estabelecidos, eles vao resolvendo os problemas ate aqui sem solupao. E mesmo quando tern convicpbes bem enraizadas, aceitam a critica de
boa vontade e estimulama reflexao objective e pessoal. Estao convencidos de
que e necessdrio ajudar os sem-poder e os oprimidos a melhor compreenderem os factores que moldam a sua saude e a sua vida, a tornarem-se mais
fortes.
Com base nesta conceppao pragmatica do homem, nasceu um modo de
encarar a formapao, o papel e as responsabilidades dos agentes de saude
oomunitaria inteiramente novo. Ideias e metodos foram espalhados pelas
teias de redes informais, pelo mundo inteiro.
Vejamos algumas caracteristicas desta atitude centrada na populapao:
1. Nao existe um ''plano-tipo” pre-estabelecido das actividades de forma
pao. Intencionalmente, os pianos nao sao "reprodutiveis", nem sequer na
mesma regiao. Pelo contrario, a planificapao e a programapao vao-se construindo, como fazendo parte integrante da aprendizagem. Os participantes a
todos os escaloes (professores, estudantes, membros da comunidade) sao
27
convidados a elaborar, rever e criticar os pianos 0 programa, deste modo,
nao se torna est3tico ou desactualizado Ele evolui conlinuamente para
melhor responder ds necessidades da populapao.
2. Professores e alunos consideram-se e tratam-se como iguais. Respeilam o saber o a experiencia uns dos outros (em qualquer nivel de ensino) e
permutam conhecimentos. Esta atitude ajuda a que os agentes de saude
considerem por sua vez os membros da comunldade como iguais e estdo
melhor capacitados para encorajar aqueles a ganharem confianpa em si
proprios, na sua experiencia e na sua capacidade de alterar a situapSo.
3. Os uniformes, os diplomas, os grandes palavroes tdcnicos e outros
simbolos que tendem a isolar os agentes de saude da populapBoou a sacralizar os cuidados de saude sSo voluntariamente evitados. Ao contr3rio, 3
recomendado aos agentesde saudequepartilhem livremente oque aprenderam e que formem, entre os membros da comunidade, o maior numero
possivel de colaboradores.
grupo, cantigas, cenas de teatro e outros m^todos de aprendizagem e outros
m^todos enraizados nas tradiqoes locais
7. Os instrumentos did^cticos s3o simples, baratos e originais. Muitas
vezes os alunos colaboram na sua producSo ou s3o mesmo eles que os
inventam. Os melhores auxiliares did^cticos nao s3o aqueles que procuram
provar teorias, mas os que ajudam os alunos e por perguntas e a descobrir,
por si proprios, as respostas.
8. A saude e considerada como um estado de bem estar integral que
permite £s pessoas trabalhar em comum para fazerem por si propriasfaceas
suas necessidades. Uma pessoa so pode estar de boa saude se se coloca bem
em relacSo aos outros e se reconhecer os factores que influem no seu bem
estar. Por tudo isto, as actividades que incentiva, uma tomada de consciencia
critica tornam-se um elemento essencial da formapao e do trabalho dos
agentes de saude na comunidade..
Os fermentos de transformapao
4. Os alunos mais dotados, em vez de
serem atirados para a frente e favorecidos, enquanto os menos dotados fleam
para tras. sao incitados a ajudar estes. Os
agentes de saude aprendem assim que
uma educapao nao privilegia o forte 3
custa do fraco
5. As tecnicas pedagogicas, a organizapao da comunidade e o conhecimento "do que faz adoecer as pessoas" assumem um lugar importante nos
programas deformapao. Partindodo principle de que primeiro h3 que respon
der aos desejos da populapSo, muitos programas de base comunit3ria dao
aos agentes sanit3rios nopoes iiteis de medicina curativa. Isto proporcionaIhes a credibilidade de que v3o precisar para fazerem a populapSo aceitar as
actividades relatives 3 prevenpao e transformapao social.
6. 0 ensino n3o tern por base a memorizapSo mas os exercicios praticos e
a solupSo de casos concretes. Tern por base a observapao, a reflexSo e as
realizapoes. O centre do estudo n3o 6 a sala de aula mas a comunidade. 0
curso compreende numerosas montagens de psicodramas e outros mdtodos
de formapao activa. As aulas magistrais sao substituidas por discussdes em
28
Os fermentos de transformapao ja comeparam a dar os seus frutos.Tornase evidente no comportamento de muitos grupos reduzidos e de individuos
que a humanidade est3 3 beira de uma tomada de consciencia critica. A
medida que os trabalhadores e os pobres comepam a conhecer melhor os
seus direitos, a repress3o por parte dos detentores do poder torna-se mais
dura. Mas quanto mais dura e a repressao mais sensibilizados ficam os
necessitados para a urgencia de uma mudanpa. E, pouco a pouco, a base
comepa a mexer-se. Em muitas partes do mundo, numerosos programas de
saude, restritos e autonomos, de car3cter comunit3rio desempenham um
papel determinante neste processo. N3o se trata apenas de uma reacpSo a
um qualquer endoutrinamento, mas muito simplesmente do resultado de
uma an3lise honesta das causas sociais do mau estado de saude.
Com efeito, em muitos programas de base comunitaria os agentes de
saude comepam por analisar o microcosmo do meio no qual vivem e a
compar3-lo com o macrocosmo que os rodeia. Isto leva-os a sentirem-se
globalmente mais respons3veis. Deixam-se entao envoiver por um sentimento de fraternidade para com os pobres e os que sofrem nesta terra e um
sentimento de solidariedade no compromisso em relapSo aos outros agentes
de saude que, algures, se vao esforpando por uma comunidade universal,
baseada em mais justipa e mais caridade *
"Estamos ao servico do povo" — uma coisa bem mais facil de dizerfou
mesmo de cantar) que de fazer Durante os 5 anos da minha estada nas
Filipinas com os camponeses pobres, este refrao vinha-me a memoria todas
as vezes que me tinha de confrontar com problemas. As reflexoes que aqui
apresento neste artigo sao resultado do meu trabalho e dos meus contactos
com populaqoes cobertas por programas de saude comunitdria
reflexives
de um agente de base na Asia
0 meu proposito e apenas o de vos contar algunsdoscombatesque ai tive
de travar..
por Jaime Z. Galvez-Tan
agente comunitario ve-se. no inlcio, muitas vezes paralisado pelas
Osuas
proprias contradicoes internas, fruto quer de atitudes e de escalas
populacao sd intervdm na fase de execucao — muito raramente na fase de
planificaqao e de avaliacdo. .
de valores adquiridas, quer de conhecimentos com que nos apetrecharam. .
Instintivamente sentimo-nos todos inclinados a escolher a via mais facil
— aquela onde iremos encontrar menos resistencia. E o maisfdcil 6 impdr as
nossas decisdes, recorrer a mdtodos que nos sao familiares, mesmo que
sejam estranhos para a populacao, ir ao encontro dos nossos prdprios interesses, evitar complicacoes. Pelo contrdrio, colocar-se ao servico do povo d
uma historia muito diferente, recheada de obstdculos de todo o tamanho.
Autocracia ou democracia
Proclamamos todos bem alto que oque queremos e associar a populacao
as decisdes. Mas em que medida e que esta participa na elaboracao, execuqao e avaliaQdo dos programas que, por assim dizer, lhes sdodestinados? Em
que medida os consultamos directamente e sem preconceitos? Como acolhemos as informal des e ideias que nos querem dar? Na maior parte dos casos a
Como nos prdprios constatdmos, associar a populacao ao trabalho de
planificacdo d dificil. £ necessdrio estabelecer com ela uma comunicacao
eficaz, o que exige criatividade e flexibilidade. Antes do mais. reunimos os
camponeses da aldeia para tomar contacto com eles, mas rapidamente
descobrimos que nestasassembleias so uma minoria privilegiada.composta
habitualmente por camponeses ricos, negociantes e penhoristas, tomava a
palavra. Sao as pessoas que detem o poder nas aldeias e ndo sao, de certeza
absoluta, nem os mais pobres nem os mais oprimidos. Por isso, a partir de
certa altura, encontravamo-nos em pequenos grupos de 10 a 15 familias,
todas do mesmo bairro. Em reunides restritas, os camponeses exprimem-se
melhor e de um modo mais franco, os debates sao mais vivos. Toda a gente
pode dar a sua opiniao.
Associar a populacao na fase de planificaqao exige igualmente perseve
rance, pois temos de animar os pequenos grupos, explicar-lhesos problemas
com cuidado e suscitar reaccoes. Regra geral, estas ndo sSo espontaneas. a
29
uma pergunta levantada segue-se um grande silencio. Isto pode tornar-se
desencorajador. se nao somos nem pacientes nem suficientemente optimistas para saber esperar, dar as pessoas tempo para reflectirem e se expnmirem. Poucos mmutos chegam a parecer boras — e altura de respirarmos
fundo e dizer para si ”Acalma-te, nao ha pressa...". No firn, a audiencia
reage.
As reunides em pequenos grupos ensinam-nos a ouvir, a esperar, a ser
pacientes. Ao ouvir, descobrimos a sabedoria dos camponeses; ao esperar,
conseguimos conhecer os seus sentimentos autenticos e ao manifestar
paciencia e simpatia, estimulamo-los a interessarem-se concretamente
pelas coisas que marcam a sua vida.
E facil impor as nossas ideias a pessoas que estao, de ha muito, habituadas a ser dominadas. mas uma tai atitude nem sempre e rentavel. Aproposito. apetece-me sempre contar este episodio, que me aconteceu numa
aldeia da ilha de Leyte. 0 inspector do Centrode Saude tinha organizado uma
campanha de vacinaqao contra a febre tifoide e a colera numa aldeia. No dia
combinado, apenas um pequeno grupo de pessoas se apresentou. 0 inspec
tor acusa entao os camponeses de falta de espirito de colaboratjao e de nao
ligarem a saude. Mas ignora completamente que na data que escolhera
estava a colheita do arroz no seu auge O dilema dos camponeses era o
seguinte: ou garantir a subsistencia ou proteger-se contra a tifoide e a colera
Se o inspector os tivesse consultado antes de organizar a campanha, eles
ter-lhe-iam dito que viesse depots da colheita. Os serviqos de saude teriam
sido mais eficazes e a populaqao nao teria sido acusada de apatia.
Utilitarismo ou progressismo
Numeros e estatlsticas sao importantes nos dossiers mbdicos, mas se nos
metermos a classificar as pessoas e os doentes em funtjao do numero de'
comprimidos tornados, de picadas recebidas ou de anSlisesde laboratorio, os
tais numeros e estatisticas tornam-se instrumentos de desumanizaqao. E no
entanto os medicos deixam-se invadir por esta miragem; nas escolas de
medicina, oessencial e apanhar a nota maisalta, ter sucesso omaisdepressa
possivel, chegar aocimo da escala. Nos hospitaistrata-se docaso numero tai,
desta ou daquela doenqa. 0 nome do doente ou como ele se sente e acessorio. Em materia de saude publica, debatemo-nos com as taxas de doenqa ou
de mortalidade, a incidencia desta ou daquela doenqa. Nunca procuramos
saber porque e que as pessoas ainda morrem de pneumonia ou de gastroenterite; por que razao, apesar de tantas campanhas contra a tuberculose e a
quistosomiase. estas doenqas continuam a provocar epidemias. 0 exito
30
profissional mede-se pelo que se ganha, pelo numero de carros e de casas
que se possuem, da clientela que se tern! E esta reacqao esta tao enraizada
em nos que ja nos e quase impossivel abstermo-nos de quantificar tudo, e
ficamos assim aptos a estabelecer meras relaqoes impessoais, sem qualquer
afectividade, com os nossos doentes e suas familias.
Trabalhar no seio de uma comugidade e sermos postos em contacto com
os multiples aspectos da vida quotidiana dos camponeses facilita a nossa
conversao. Com eles, percorremos um quildmetro ao sol para ir buscar agua.
lavamos a roupa no no. tomamos parte nas sementeiras e nas colheitas, nos
divertimentos e nas festas populates. Por exemplo, sentimo-nos cheios de
compaixao por Violeta, que chora com fome ao pe da mae, que procura
desesperadamente qualquer coisa para lhe dar de comer; simpatizamos com
Manuel, extenuado pelo esforqo da ceifa eque se sente frustrada, pois vai ter
de dar metade da colheita ao dono da terra; indignamo-nos ao ouvir o Jose
contar que ficou sem as terras, em favor do penhorista. Vamos descobrindo
progressivamente os membros da comunidade enquanto pessoas. Aprendemos a partilhar osseus sent!mentose emoqoes. Comopoderiamos reduzi-los
a numeros depois de ter partilhado tao estreitamente a sua vida?
Tomamos conscience de que as estatisticas nao sao tudoi Preocupamonos entao mais com as mudancas nas atitudes das pessoas. o impacto
socio-cultural do nosso trabalho ao melhorar a qualidade de vida e o nivel de
participaqao das pessoas, por nos impulsionada.
A situaqao de pobreza, analfabetismo e exploraqao que existe no nosso
pais obrigou-nos a reexaminar os nossos proprios valores. Procuramos
incessantemente o porque das coisas Porque e que as pessoas sao pobres?
Porque e que tern fome. no meio da abundancia que as rodeia? Porque e que o
fosso entre ricos e pobres vai sempre aumentando? Para encontrar resposta
a estas perguntas tivemos de estudar as relaqoes que existem entre as
diversas classes socials, osantecedentes historicos do nosso povo e do nosso
pais Tivemos de estudar o processo de produqao economica, as crenqas. os
valores e as atitudes da populaqao. Em poucas palavras, tivemos de nos
humanizar!
Individualismo ou solidariedade
Lutar contra o individualismo e tanto mais duro quanto esta atitude se
enraiza na sociedade de livre iniciativa como aquela em que vivemos. O
individualismo e ainda reforqado pela formaqao que nos e dada pelo corpo
medico, que favorece uma competiqao sem treguas em vez da cooperaqao e
camaradagem.
Como combater o individuahsmo? Na formacao do pessoal empenhamonos na formacao de atitudes e organizamos reunifies dedicadas a avaliapaoe
a analise dos assuntos correntes Estimula-se a autocritica e e dada a maior
importancia ao espirito de equipa Medicos, enfermeiros, agentes comunitarios. padres, camponeses e Pescadores, todos trabalham juntos em pe de
igualdade
Este senlimento de responsabilidade mutua e de partilha transmite-se
tambem nas aldeiasao pessoal da saude e aos pequenosgruposfamiliares. 0
espirito comunitario e reforcado atravds de varias actividades levadas a
pratica como o regime de troca nos trabalhos agricolas, petiqoes apresentadas a admimstrapao ou outras instituiqfies pela comunidade com vista a obter
certos services, as colectas de fundos (por ocasiao de acontecimentos
sociais, etc.) para financiar projectos a escala da aldeia.
As decisoes sobre questfies vitais sfio tomadas em comum. Uma das
palavras de ordem do trabalho comunitario e "Nunca decidas nada sozinho".
Estimula-se o mfitodo de consulta, nao so entre os membros do pessoal
encarregado do programa, mas entre a propria populacSo, o que cimenta a
nossa unidade
Segundo urn inquCrito recente efectuado nas Fihpinas. apenas
15% dos estudantes de medicina pensavam vir a mstalar-se nas
zonas rurais, onde vive cerca de 80% da populaqao Este numero
que nada tern de surpreendente se pensarmos que tanto a formaqao que lhes e dispensada com a orientaqao geral dos programas
sfio centradas nas necessidades dos paises mdustnalizados do
Ocidente As Pilipinas sao. depoisda India, o pals que ma is medicos
exporta e aquele em que o numero de enfermeiros expatriados e
mais elevado.
Um estudo feito no Brasil em 1973 demonstrou que a repartiqao
de medicos pelo pais nao corresponde em nada a da populaqao mas
reflecte a dos bancos comerciais.
Adapta<?ao a vida rural
Se passamos a maior parte da nossa existencia nas cidades, sentimos,
quando transplantados para o meio rural, urn grande desenraizamento. Na
altura em que decidi pessoalmente trabalhar no campo, quando me perguntaram quanto tempo tencionava ficar por I3, respondi — urn ano. Isto prova
bem ate que ponto estava pouco seguro de mim. Iria eu adaptar-me a vida de
aldeia? Tinha sobretudo medo do desconhecido. E havia a angustia da separaqao, era preciso deixar a familia, os amigos e renunciar ao conforto da vida
a que eu estava habituado.
Pouco a pouco fui descobrindo que havia mil coisas que substituiam os
cinemas, as discotecas, a casa de banho, a televisao e todas as outras
vantagens da vida da cidade. 0 sentido da hospitalidade e do acolhimento e
extraordincirio nos camponeses, em comparacao com o anonimato das cida
des. 0 mar, oscursosde agua, ascascatase asfontes rivalizamcom qualquer
casa de banho As a urorase os crepusculos, a musica e asdanqasfolcloricas,
as festas da aldeia oferecem um prazer completamente diferente. O ar puro,
as borboletas, os passaros e a majestade das paisagens fazem de cada
passeio uma festa Afinal a vida na aldeia nao era nem tao dificil nem tao
isolada como eu temia.
Os habitos alimentares
Temos muito que aprender com a adopcao dos habitos alimentares das ’
regides rurais. Na cidade fazemos, geralmente, tres refeiefies por dia. No
campo, os periodos de abundancia alternam com os periodos de penuria.
Durante estes ultimos, as pessoas comem apenas uma ou duas vezespor dia
e as refeiefies constam apenasde arroze tuberculos, acompanhadosde peixe
salgado. E um choque descobrir que a maioria dos nossso compatriotas nao
tern o suficiente para comer.
A este respeito, lembro-me de uma coisa que me aconteceu numa aldeia
da ilha de Samar. Ao pequeno-almoqo serviram-nosbatatasesal. Pensei que
fosse um aperitive e depois de comer o que tinha no prato perguntei oque se
seguia. 0 que me arrependi! Estavamos numa fipoca de carencia e alem de
batatas nada mais havia para comer. Cairam-me lagrimas de vergonha e
tristeza, enquanto apanhava as preciosas migalhas de sal...
As pressdes familiares
Como nao estudaram medicina, as nossas familias poem em nos grandes
esperanqas. A sua ambipaoe ver-nos abrir um consultorio na cidade, e a vida
de um medico de aldeia nada tern a ver com o que tinham sonhado para nos.
Logo de principio, os meus pais ficaram decepcionados quando souberam
que eu decidira ir instalar-me no meio rural. Viam-me num grande hospital
31
urbano. a ir ao estrangeiro especializar-me e fazer carreira. Tive de Ihes
explicar as alegrias e descobertas que a minha actividade me proporcionava.
Precisaram de tempo para aceitar a minha vocaqao. Mas, como o que mars
Ihes importava era verem-me feliz e realizado, acabaram por me ajudar
muito
Mas alguns colegas nao tiveram essa sorte. 0 principal handicap e o
dinheiro: devem ajudar os irmaos e irmas ainda estudantes e contribuir para
os gastos da familia Muitas vezesos pais lembram-lhes tudooque gastaram
com a sua educapao e esperam por sua vez que eles os ajudem. Tocam-nos
na corda sensivel. "Esounico medico da familia. Precisa mosque nostrates”.
Uma das nossas medicas foi mesmo submetida a uma chantagem por parte
da mae, que lhe afirmava ter de ir aos Estados Unidos fazer uma operapao
grave ao corapao, para o que precisava da companhia da filha. Depois de
alguns telegramas de pressao, a minha colega comprou um bilhete de aviao
pago no destino, para afinal chegar a constatar que a mae nao estavaassim
tao mal . Mas como so tinha bilhete de ida, tevede ficar nos Estados Unidos.
lembro-me eu bem, se falassemos a nossa lingua materna (era suposto
falarmos sempre em ingles) Nas faculdades de medicina, ensinaram-nos
mais a tratar das doenpas americanas do que das que afligem os nossos
compatnotas e preparavam-nos para passarmos os exames nos Estados
Unidos. 0 desejo mais ardente dos futuros medicos e enfermeiros e irem
trabalhar ou especializarem-se ao estrangeiro. As doenpas cardiovasculares e as doenpas de degenerescencia estaoactualmente na moda As
doenpas infecciosas, essas sao passadas pela rama. Para estabelecer um
diagnbstico, estamos de tai maneira habituados a fir mar-nos nasanalises de
laboratories de aparelhoscomplicados. que nos tornamosincapazesde usar
os cinco sentidos. Tornamo-nos dependentes do quadro hospitalar e dos
tratamentos dispendiosos, considerando os nossos curandeiros tradicionais
meros charlataes
0 agente comunitario e pois colocado perante uma oppao: por-se ao
servipo da familia ou ao servipo da coinunidade. Em qualquer dos casos, a
pressao das convenpoes e sempre muito forte.
Autocracia, utilitarismo, individualismo e elitismo sao residuos da epoca
colonial e feudal. As Filipinas, como outros paises do Extremo Oriente,
viveram durante quatro seculos sob dominio estrangeiro As atitudes que
entao se formaram sao um obstaculo e tornam a nossa colaborapao com a
populapao mais dificil, mas felizmente estamos a tomar cada vez mais consciencia deste problema e de que e possivel fazer qualquer coisa para o
ultrapassar.
P6em-se-nos os mesmos dilemas quando se trata de decidir como e que
pornos os nossos conhecimentos em pratica. Vamos apoiar-nos simplesmente em conceppoes e tecnicas ocidentais ou mantemo-nos abertos a
costumes e crenpas ancestrais? Contentamo-nos em tratar das doenpas ou
vamos tambem querer preveni-las? Como e que vamos exercer estes novos
papeis sem dominar? Se sim, nao tememos parar e isolarmo-nos sob o piano
profissional?
Praticas ocidentais ou costumes indigenas
0 nosso sistema educativoe fortemente ocidentalizado e copia principalmente o norte-americano. Inclusivamente eramos castigados na escola,
32
Aphcapao do tunku pos-natal — um metodo que parece ser capaz de fazer voltar os
musculos abdominais, as veias e o utero ao seu estado normal. 44 dias apos o parto
Com este sistema de educapao, trabalhar no meio rural provoca, no inicio
um choque cultural. Aqui, nao vamos poder recorrer as analisesde laborato
rio, nem aos aparelhos complexes, nem aos cuidados hospitalares. A pneu
monia. a tuberculose e as gastroenterites sao as causas principals das
mortes e nao as doenpas coronanas ou os diabetes. Torna-se mais importante prevenir do que curar. Os camponeses sentem um grande respeito
pelos seus curandeiros tradicionais. So depois de um certo tempo passado no
campo e que compreendemos ate que ponto a nossa formapao foi inadequada E como nos separamos do resto dos nossos compatriotas!
Desaprender e reaprender implica muitas dificuldades e frustrapoes E
necessario esquecer praticamente tudo o que nos ensinaram e temos de
encarar de frente esta triste verdade! Nao estamos de maneira nenhuma
preparados para responder as necessidades da gente da nossa terra no oue
respeita a saude. E preciso rever e aprofundar os nossos conhecimentos
sobre tuberculose, a quistosomiase, o paludismo e outras doenrac
infecciosas.
ueripas
0 acento tem de ser posro sobra a educaqao sanitaria, a higiene, a
P'otec»;ao matemo-infantil, a utihzaqao de piantas medicinais e as massagens tradicionais. I emos de pesquisar e de nos documentar sobre as formas
indigenes de medicina tradicional Para torner ma is eficazes os nossos metodos de comunicacao e formacao, temos de abdicar da nossa linguagem
ciemifica hermetica e torna-la acessivel a todos Temos muito a aprender dos
cursndeiros tradicionais. Sejamos modestos: as nossas pretensdes sao
constantemente rebaixadas pelo bom senso popular
Ameaca de estagna<?ao intelectual?
Trata-se ainda aqui de uma questao de perspectiva: com efeito. o meio
rural apresenta uma gama enorme de possibilidade’s no piano intelectual.
Nao fomos de inicio preparados para a pesquisa. E no entanto, ao participar,
ao observar e ao interessarmo-nos pelas caracteristicas populates, aprendemos a recolher dados sobre as caracteristicas e as causas de certasdoenqas
locals; familiarizamonos com as praticas da medicina tradicional, com as
concepqoes e reacqoes da populaqao em materia de saude e doenqas Tudo
isto representa uma grande ajuda para melhorarmos os serviqos por nos
prestados.
Esta aberto o campo para pesquisas colectivas sobre assuntos apropriados. Sera conveniente desenvolver os nossos conhecimentos sobre a farmacologia das plantas medicinais, sobre os sistemas nativos dos cuidados de
saude e tratamento, sobre a possibilidade de produzir os proprios auxiliares
pedagogicos para grupos analfabetos e analisar os problemas sanitarios
existentes nas regides rurais, A comunidade esta la: so falta explorar os
recusos que ela possui...
Os novos pap6is
Ainda nao tinhamos percebido que. para servir o povo, tinhamos de
assumir papeifc diferentes. Tinham-nos ensinadoa pratica da medicina, mas.
de facto, o quese espera de nos equesejamospromotoresda transformacao,
dotados de conhecimentos medicos.
Para responder a esta expectativa. somos obrigados a ser ao mesmo
tempo agente comunitario, catalizador, professor, aprendiz, investigador,
despertador de consciencias, coordenador, inspector e trabalhador da saude.
Temos de aprender a suscitar o interesse da populagSo e a estrutura-lo,
sistematizando as suas experiencias, sentimentos, conhecimentos, actos e
ate aspiraqoes, de modo a que ela se possa mobilizar a si propria, para sair de
uma situaqao que e subhumana. Tantas funqoes podem, a primeira vista,
assustar qualquer um, mas a medida que nosdamosconta da importancia de
todos estes papeis, o medo cede lugar ao entusiasmo e ao optimismo...
Para aldm da medicina e da saude
0 meu trabalho junto dos camponeses levou-me a compreender que os
problemas da saude eram, no nosso pais, indissociaveis dos problemas
politicos, econdmicos e culturais. e que. sem uma reforma estrutural do
sistema, a situagao sanitaria ficara fundamentalmente na mesma. Ir ate a
raiz destes problemas nao e facil. Como e que um medico filipino pode
responder a este desafio? Eu sou medico filipino. 0 que e que eu posso fazer
para mudar a situacao? Antes de ser medico, sou filipino e isso significa ir
aldm da medicina e da saude. O que importa e levar a populaqao a descobrir
as causas sociologicas e estruturais da sua pobreza. das suas doenqas e da
sua opressao.
Se nos colocamos nesta posiqao, e impossivel ficar apolitico. Temos de
abrir os olhos para o que se passa a nossa volta e esforqarmo-nos por ser,
acima de tudo, uteis ao povo. Por outras palavras, temos de nos unir a luta
travada pelos camponeses, operarios, Pescadores, comunidadestribais. citadinos pobres, estudantes e outros membros das proftssoes liberais, pelo
triunfo do nacionalismoedademocracia. Os nossosconhecimentos medicos
tern de estar ao serviqo desta causa nobre.®
33
SS GESTAO DOS CUIDADOS
s»rimArios de saude
prestados quer por membros do corpo medico que trabalham em part-time no
sector publico, quer por organizaqbes nbo-governamentais fortemente
apoiadas por instituiqoes de ajuda internacional. Existe tambem na maior
parte dos paises do Terceiro Mundo um sector nacional muito prospero.
Ainda que todos estes serviqos respondam a necessidades reais e, como
amiiide se afirma, sejam mais flexiveis e inovadores que os serviqos piiblicos,
eles limitam todavia a aplicaqao da politica governamental. Sera talvez por o
governo nao ter senbo uma autoridade ou um controlo bastante limitados.
Um programa de cuidados primaries de saude pode assim transformar-se
num sistema pouco homogeneo dentrodopais, e estes factores nao sao tidos
em conta.
Tambem nunca foi dada grande atenqao a diversidade dos metodos de
plamficaqao. Ainda que a maior parte dos paises do Terceiro Mundo tenha,
em gra us di versos, um regime de economia mista, a planificaqao encontra-se
mais centralizada nuns do que noutros. Este estado de coisas tern tambem
incidencia na planificaqao e na aplicaqao das politicas de saude, bem como
na repartiqao dos creditos entre o sector da saude e os restantes sectores.
gem uma decisao politics, os programas oficiais de cuidados primb**”^rios de saude nao veriam a luz do dia, mas a sua implementaqao
levanta certos problemas que, ate agora, ainda nao foram suficientemente
estudados. Podemos agrupb-los em dois grandes tipos: os problemas de
planificaqao e os problemas de gestao; nem sempre 6 facil traqar a linha
divisdria entre ambos.
Os problemas de planifica<;3o
Sendo certo que, em muitos paises do Terceiro Mundo, os poderes publicos tern vindo a atribuir uma importancia cada vez maior a acqao social, e
concretamente a saude, nao deixa de ser verdade que e ainda do sector
privado que saem muitos programas "modernos". Esses serviqos podem ser
34
Os paises de economia planificada centralmente podem sentir dificuldades na aplicaqao prbtica de um dos principios fundamentais do sistema de
cuidados primaries de saude: a participaqao das comunidades na tomada de
decisces. Pode ate dar-se o caso de nem os proprios agentes de saude locals
terem participado no estabelecimento de prioridades e nas decisbes que
dizem respeito bs medidas a tomar em materia de saude. Mesmo no caso de
ter sido reconhecida uma certa autonomia b escala local, esta aplicar-se-a as
decisbes estritamente administrativas, no caso de nao incluir o controlo das
despesas
Pelo menos, o sistema de cuidadosprimbriosde saude foi concebido tendo
em vista resultados obtidos em alguns projectos locais. Repetir, a escala
nacional, estes projectos que, por definiqao, sao muito dependentes das
condiqbes locais. em ordem a por de pe um serviqo coerente, e uma tarefa
muito ingrata. Comefeito, ascaracteristicasde uma dadadoenqa, asestruturas de migraqbo, as condiqoesde trabalho, os preconceitos religiosos, sociais
e culturais, a disponibilidade de mbo-de-obra, etc., sbo muito varibveis de
regibo para regibo. 0 bom andamentode certos pequenos projectosdeve-se
em grande parte, £ influencia de um ou dois dirigentes, particularmente
competentes ou carism^ticos, factor esse dificilmente transponivel para
outro local.
A participacSoda comunidade nasdecisoes relatives^ promop3oda saude
publics e a auto-responsabilidade constituem sem duvida dois pilares do
metodo dos cuidados primaries de saude, e foram estudados maisdoque um
projecto, no sentido de determinar em que medida esta participate pesa
realmente, embora muitos factores permanepam pouco conhecidos.
£ assim que, por exemplo, n3o est£ muito clara a importancia quesedeve
atribuir as estruturas da autoridade tradicional. NSo e sem duvida nada f£cil
criar um dispositive nacional de planificato no qual as populapoes partici pem, mesmo quando este objectivo 6 considerado desej^vel.
Os problemas de gestSo
Para que a plamficacSo njio seja apenas um exercicio teorico hd que levar
os pianos a prdtica. Isto supoe uma administrapSo e uma organizacdo, facto
res que sao chave para o sucesso global de qualquer politics de cuidados
primaries de saude. 0 resultado positivo ou negative do programa de um
agente de saude local numa dada aldeia, depende do apoio que lhe d dado
pelos services de saude de outros escaloes. Os agentes de saude locais tern
feito correr muita tinta, mas fala-se muito pouco das outras categorias de
agentes de saude cornunitiria a quern, por exemplo, estSoatribuidasfundoes
de controlo e apoio importantissimas. Ao fazer incidir a nossa atenpSo sobre
os agentes de saude locais fomos levados a esquecer, em certa medida, o
papel desempenhado por outro pessoal auxiliar, nos cuidados primdrios de
saude.
No piano da gestSo, hei exigencies contraditdrias que criam confusdo e
tensdes Esquece-se muitas vezes, por exemplo, que hd que estabelecer, a
nivel primdrio, um equilibria entre o tratamento e a prevencSo. 0 que as
pessoas querem 6 receber tratamentos, mas nSo estdo muito preocupadas
em aprender o que 6 precise fazer para evitar cair doente e, ainda menos, o
que deveriam ter feito para prevenir a doenqa que agora tern. Um bom agente
de saude corre o risco de ficar submergido pelas doenqas e de n3o ter tempo
para levar a cabo uma aepdo preventiva, cujos resultados sSo mais lentos e
mais dificeis de apreciar. A alto nivel, a repartiqao dos recursos entre o
tratamento de doenpas crbnicas ou doenqas de urgencia, entre medicina
curativa e medicina preventiva, 6 sempre problemdtica.
Existem ainda problemas meramente orgamzativos, sendo um dos princi-
35
!
pais o que diz respeito a rede de abastecimentos. E util identificar os medicamentos necessarios, mas mais util ainda e assegurar a sua distribuipao
continua e coerente.
Tambem nao e facil coordenar o sector da saude com os restantes sectores. Uma coordenaqao que ultrapasse as meras reunioes interdepartamentais ou interministeriais absorve imenso tempo e levanta tantos conflitos
como os que se pretendem resolver, sendo a colaborapao a nivel local ainda
mais facil. A rivalidade inter-sectorial ou simples dificuldades organizativas
vao chccar-se com as boas intenpoes de integrapao, quer a nivel local quer
nacional. Tudo isto 6 igualmente verdadeiro para a planificapao. Organizar a
participapao da comunidade, especialmente em sistemas de planificapSo
concebidos "de baixo para cima", exige uma paciencia que nao abunda nos
burocratas sobrecarregados de trabalhos e desejosos de obter resultados
rapidos Diferenqas de estatuto e de posipao, e de facilidade de expressao,
descoordenapoes. irao agudizar as dificuldades de participapao comunitaria,
a nao ser que exista contra tai um grande alerta. Em paises multilingues a
comunicapao e duplamente dificil.
A questao da colaborapao dos praticantes de medicina tradicional com o
sistema de saude e normalmente tratada de um modopouco realista e ilustra
bem o fosso que pode existir entre a planificapao e a execupao As dificulda
des de coordenar a medicina privada com o sistema de saude governamental
s3o, ja por si, suficientes. Integrar agora as diversas categorias de curandeiros, cada uma com o seu nivel de profissionalizapSo, torna-se quase insoliivel. £ claro que podemos citar exemplos demonstratives de que e possivel
ensinar normas modernas de higiene is parteirasempiricas. masraramente
foi estudado o impacto deste ensino.
Osadeptos do sistema doscuidados primaries de saude conhecem estas e
outras dificuldades. A mensagem tern de ser suficientemente dinamica para
mobilizar a populapao mas, sem negar o interesse deste sistema, tern de se
reconhecer os problemas que ele levanta: a avaliapao deve comepar desde
jd... •
Gill Walt e Patrick Vaughan
Uma lista de trabalhos relatives a estes problemas e a outras questoes ligadas aos
cuidados primaries de saude. de G. Walt e P. Vaughan, An Introduction to the Primary
Health Care, Approach in Developing Countries. A Review with Selected Annotated
References (Ross Institute Publication n° 13, 1981; preco £R-U.2) pode ser pedida ao
Ross Institute for Tropical Medicine, London School of Hygiene a nd Tropical Medicine,
Keppel Street. Londres WC1E 7HT.
36
egundo estimativas. em 1980 foram utilizadas no mundo 36 milhoes de toneladas
de pesticidas, um quarto dos quais nas regioes
rur&is do Terceiro Mundo, onde os seus “efeitos
secondaries" sao muito mais nefastos que nos
paises industrializados, onde sao produzidos.
Aproximadamente metade das 31 epidemias declaradas por intoxicapSo
por pesticidas entre 1952 e 1980 e 653 das 655 mortes pela mesma razSo
deram-se em paises do Terceiro Mundo. N3o se conhece o numero total de
mortes devido aos pesticidas mas e, sem duvida, mais elevado que os numeros oficiais, que apenas referem "epidemias".
E-se tentado a justificar estas mortes com oargumentodeque elassSo "o
preqo do desenvolvimento"; 6 verdade que o seu numero e baixo se comparado com os milhbes que, durante o mesmo periodo, morreram devido a
doenpas infecciosas e malnutripBo. H3 quern invoque que os pesticidas
contribuem para reduzir o numero deste tipo de mortes. j3 que permitem
produzir mais alimentos e eliminar os transmissoresde doenqas infecciosas,
como por exemplo os mosquitos. Tamb6m se arguments muito que os efeitos
nefastos dos pesticidas sobre a saude estSo longe de ser comprovados e que
s3o devidos a uma m3 utilizapSo dos produtos quimicos ou a acidentes
evit3veis. Num dos pratos da balanpa temos o crescimento da produ?3o
alimentar e a regressSodasdoenpas infecciosas; nooutro, os raros acidentes
tbxicos, resultantes de erros de utilizapBo que eram evit3veis. Cabe aos
peritos que conhecem bem os pesticidas e tomam a peito o "interesse
nacional", pesar os perigos e as vantagens: mas esta 6 so uma das faces da
moeda.
Para muitas pessoas por esse mundo fora, e o seu numerocresce todos os anos, o
termo "pesticidas" tornou-se um palavrao. Homens e naqoes apontam-se um
dedo acusador, A procura do culpado do uso e abuso e dos prejuizos ecolbgicos e
para a saude, reais e imaginArios, que estes tristes compostos qulmicos levam a
um Terceiro Mundo esfomeado e indefeso.
FAO, Servipo Especial, 13 de Fevereiro de 1982
Tambem se pode pegar neste assunto por outra ponta: estudar em que
medida a maior utilizapSo dos pesticidas aumenta a dispombilidade de alimentos dos malnutridos, avaliar o papelexacto desempenhado pelos pestici
das na erradicapSo das doenpas infecciosas; determinar quem sofre os
efeitos toxicos dos pesticidas e quem beneficia com a sua utilizapSo; investigar, finalmente, se os efeitos tbxicos sao efectivamente evitaveis ou se eles
n3o s3o fatalmente inerentes ao emprego generalizado dos pesticidas. Com
estes dados na mSo. os proprios mteressados sentir-se-So estimulados a
pesar as vantagens e os perigos que.representam os pesticidas e a indicar os
mecanismos praticos para reduzir e vigiar esses perigos.
A falta de provas...
Ouve-se dizer muitas vezes, a propdsito dos pesticidas e do desenvolvimento rural, que "estao por provar" os efeitos nocivos dos pesticidas. £ certo
que a maior parte dos produtos quimicos s3o submetidos a testes laboratoriais, mas estes efectuam-se sobre os residues existentes na alimentapSo
dos paises industrializados. £ sobre a contaminap3o dos alimentos que os
organismos de protecpSo do ambiente nestes paises e as instituipoes internacionais como a OMS, a FAO, a OIT e o PNUE dirigem a sua atenpao. Pelo
contr3rio, ningudm se preocupa muito com aqueles sobre quem recai o
grosso dos pesticidas: os camponeses do Terceiro Mundo.
Mas esta "ausencia de provas" resulta tambem de factorestecnicos. Um
incidente fatal (morte) 3 raro e os perigos correntes s3o menos graves e
difi'ceis de calcular. A menos que sesaiba expressamenteque certas pessoas
foram recentemente intoxicadas por pesticidas, n3o 6 f3cil, mesmo em caso
de morte, estabelecer uma relapSo de causa a efeito, ainda mais quando se
trata de efeitos secondaries, pois a gravidade so se vema manifestar, muitas
vezes, anos mais tarde. Frequentemente se ignora quem foi intoxicado por
um pesticida e quem n3o foi. Um dos problemas consiste em detectar o
aumento de risco de um efeito muito raro. Se um dado cancro ou uma
deformacao congenita ocorrem geralmente numa em cada 10.000 pessoas,
e os pesticidas aumentam esse risco cinco vezes, o numero de casos a
esperar 6 de 5 em cada 10.000. Os riscos quase nunca s3o completamente
excluidos, eles sao 6 pura e simplesmente ignorados.
Mortes e doenqas provocadas por pesticidas
A morfologia das mortes provocadas por pesticidas tem-se modificado ao
longo dos anos. Em 1956, mais de 60% dessas mortes eram devidas a
compostos inorganicos (sobretudo ars3nico). Em 1974, esta proporpSoera de
16%, dos quais 35% eram causadas por organo-fosfatos (OP). Segundo
c3lculos da OMS, d3o-se actualmente mais ou menos 500.000 intoxicapoes
por pesticidas por ano no mundo, 1 % das quais sao mortais. O aumento de
casos de doenpa e morte e atribuido a maior utilizapSo de OP extremamente
toxico nos campos de algodao e no controlo do paludismo. Entre as mulheres
de regioesalgodoeirasda America Central, o niveldecontaminapaocom DDT
do seu leite e 25 vezes mais elevado do que o das mulheres nos Estados
Unidos. 0 veneno passa assim para as crianpas desde o nascimentofver, em
anexo, a lista de diversos tipos de pesticidas).
A morte 6 o cume do iceberg da intoxicapSo com pesticidas. E dificil obter
numeros exactos, mas estudos realizados nos paises industrializados d3o
algumas indicapoes sobre os outros efeitos que eles provocam. Em 1975. no
Estado norte-americano da California, foram assinalados 1688 casos de
intoxicapSo com pesticidas, dos quais 30% de reacpoes cutaneas e 30% de
problemas oculares; 20% provocavam dores de cabepa, diminuip3o de vitalidade, etc.; 10% atingiam osistema digestive; 5% provocavam dificuldades no
sistema respiratorio; 5% tinham causado queimaduras quimicas. Nao foi
declarado nenhum caso fatal. Estes numeros mostram bem que hS muito a
fazer para estabelecer estatisticas respeitantes 3s regioes rurais do Terceiro
Mundo, para as quais, na melhor das hipoteses, so se tern dados sobre os
casos de morte.
Os pesticidas na agriculture
0 sector agricola, que ocupa 70% da populapao, 3 o principal consumidor
de pesticidas no Terceiro Mundo. Nos paises industrializados (onde este
sector 3 relativamente menos importante). as condipoes de utilizapao de
pesticidas sao muito mais estritamente controladas e as preparapoes sao
37
cuidadosamente embaladas e acompanhadas da indicaqao muito clara do
modo de emprego
locais em produtos alimentares, quando estas ocupam uma area 7 vezes
superior a das grandes exploraqoes.
Pelo contrario, e frequente nas grandes plantaqoes doTerceiro Mundo os
camponeses serem eles proprtos afectados no acto de aspersao dos pesticidas- Eles vivem habitualmente proximo das sementeirase a £gua que consomem esta contaminada As pulverizaqoes aereas sobre as culturas
comerciais, destmadas a exportaqao, incidem tambem sobre as culturas
alimentares que os camponeses fazem nos terrenos vizinhos. Um estudo do
Instituto Centro-Americano de Investigaqao e Tecnologia Industrial (ICAITI)
na Guatemala revelou que os trabalhadores, ao lavarem-se, aumentam
efectivamente a dose de pesticidas absorvida, pois lavam a pele com agua
poluida. Poroutro lado, asquantidadesde pesticida utilizadas sao excess!vas.
Os modos de emprego sao fixados pelos fabricantes e o interesse destes e
escoar o produto. Para tanto, recomendam a pl icacoes regulares, segundo urn
calendano standard, seja qual for o tipo de parasitas a elimmar. A este
respeito, os c^lculos variam, mas pensa-se que seria possivel reduzir o
consumo de 35 a 50%, Em muitas das grandes plantaqoes do Terceiro
Mundo, os trabalhadores naoestSoautorizadosa organizar-se no sentidode
exigirem melhores condiqoes de trabalho.
Podera talvez argumentar-se que, embora as culturas de exportaqao nao
alimentem directamente os que tern fome, elas acabam mesmo assim por os
beneficiar, ainda que indirectamente, por causa dasdivisasqueessasexportacoes propiciam aos proprietaries e a Administraqao A maior parte dos que
se ocupam de desenvolvimento rural nao estSo nada convencidos deste
efeito por influencia indirecta, pois constatarn que raramente existe uma real
redistribute dos poderes e dos dividendos.
Os perigos que correm os pequenos agricultores e os camponeses sao
ainda mais graves, Muitos nao sabem ler os modos de emprego; ou muitas
vezes os pesticidas sSo-lhes distribuidos em embalagens sem etiqueta,
fechadas apenas com uma rolha de papel de jornal. Frequentemente os
pesticidas que lhes chegam sao considerados demasiado toxicos, mesmo
para uma utilizacSo altamente controlada nos paises industrializados.
Com a intensificacao da produqao gracas ao emprego dos pesticidas, o
preqo de venda dos produtos-base consumidos no pais produtor sobe em tais
proporcoes que se tornam inacessiveis aos pobres. No Mexico, a produqjSo de
milho e feij3o sofreu um declinio enquanto que a de frutos e legumes.
destinados ao mercado dos Estados Unidos, bem como a de forragens —
como o sorgo — progrediu fortemente'Quase uma terqa parte dos cereais de
base serve actualmente para alimentar o gado. No Brasil, esta proporqao
chega a 44%.
Os pesticidas nao facilitam o acesso a alimentos por parte dos que tern
fome, pela simples razao de que a sua utilizaqao esta nas mSosdaquelesque
controlam a produto. E o que lhes interessa e o valor comercial dos produ
tos: se uma cultura nSo e rentSvel, nao lhe pegam
Os pesticidas e a saude publica
Muitas das variedades de cereais de "alto rendimento”, recentemente
desenvolvidas, sao particularmente vulner^veis aos parasitas e exigem por
isso dose„ mais fortes de pesticidas. Isto levanta a questao de saber onde se
situa o limite de segura nqa. Entre 50 e 75%dos pesticidas usados nasregioes
rurais do Terceiro Mundo aplicam-se nas culturas destinadas a Europa,
JapSo e Estados Unidos. As pessoas que correm oriscode serem intoxicadas
pelos pesticidasduranteoctcloda produqao, raramente consomemo produto
que cultivam. As culturas comerciais (cafd, algodao, coco, cana do aqiicar,
borracha) absorvem a maior parte. No pequeno Estado de El Salvador, por
exemplo, a produqSo de algodao absorve a quinta parte do parathion consumido no mundo. Na Indonesia, as grandes propriedades destinadas ascultu
ras de exportapSo (cafd, coco, cana do aqiicar e borracha) consomem 20 vezes
mais pesticidas que as pequenas exploragoes que abastecem os mercados
38
Nodominioda saude publica, as grandesquantidadesde pesticidasforam
utilizadas no combate ao paludismo. So no ano de 1962, foram empregues
60.000 toneladas de DDT, 4.500 toneladas de dieldrina e 500 toneladas de
lindano, em grande parte em zonas habitadas. Nao se pode dizer que este
esforqo tenha tido resultados brilhantes. A resistencia de mosquitose outros
insectos aos pesticidas 6 agora mais forte e nota-se um recrudescimento de
doenqas e mortes devidas a intoxicates entre os que os espalharam.
Os pesticidas foram tambem utilizados na luta contra os transmissoresde
outras doenqas, concretamente a febre amarela, a tripanossomose (doenqa
Ver Ideias e Accao N° 141 (pag. 3-9)
do sono), 3 oncocercose. a paste e o tifo. No Botswana iniciou-se recentemente a pulverizacao aerea de vastas extensoes de terra e dos sees habitantes. com o endosulfan e urn outre pesticida destinados a cornbater a mosca
tse-tse. 0 Min isle rio da Agricultura do refer ido pais a a a seguinte explicacao'
200 pessoas sao anualmente atacadas pela doenca do sono. Se o numero
daquelas que, pela utilizacao dos pesticidas. sao atingidas pelo cancro ou
ficam estereis ou sofrem deformacoes congenitas, for inferior a 200, o
balanqo pode considerar-se positive. Alem disso, mais terra ficara disponivel
para os rebanhos dos grandes criadores. 0 tempo dira se e uma medida
acertada. 0 que nao ha diivida e que os resultados obtidoscontra o paludismo
nao sao optimistas.
A historia da campanha conduzida contra o paludismo esta cheia de
ensinamentos, para quern queira estudar a incidencia dos pesticidas na
saude publica. Quer em teoria quer do ponto de vista politico, a estrategia de
espalhar insecticidas de accao residual (compostos que se mantem activos
por muito tempo) tern um certo interesse. 0 DDT e a dieldrina sao produtos
baratos, de facil emprego e que se mantem activos durante anos. Antes de
desovarem na agua, muitos mosquitos poisam nas paredes das casas e
parece portanto logico pulverizar com um insecticida de accao prolongada.
As pulverizacoes de efeito residual levantam outro problema: com efeito,
apos a picada, os mosquitos nao ficam sempre nos muros das casas mas
procuram refiigio nas folhagens que as rodeiam. Para os destruir, torna-se
necessario efectuar fumigaqoes com pesticidas, sobre vastas superficies, o
que implica uma subida da poluiqao quimica. Mesmo depois de uma campa
nha local com bons resultados, torna-se indispensavel repetira operaqaoao
fim de alguns anos. Os programas de saude publica que envolvam a utiliza
cao de pesticidas obrigam, deste modo, os paises do Terceiro Mundo a
recorrer a ela permanentemente.
Todavia, desde 1953, os msectos tornaram-se resistentes ao DDT e a
dieldrina, o que poe um problema. Inicialmente, a soluqao para o resolver foi
saturar as habitaqoes, em zonas inteiras, com produtos quimicos, de modo a
destruir todos os mosquitos antes que eles se tornassem resistentes. Mesmo
com estas medidas, houve um regresso generalizado do paludismo. Outras
especies de insectos tornaram-se tambdm crescentemente resistentes. Foi
comunicado que o numero de insectos resistentes aos pesticidas duplicou
em 12 anos: de 180 em 1966 passou a 365 em 1977.
Medindo os riscos
0 estudo do ICAITI atribui o recrudescimento do paludismo na America
Latina a expansSo e intensificaqaoda agricultura. Para lutar contra os parasitas do algodao, por exemplo na Guatemala, na Nicaragua e em El Salvador,
for rtecessSrio em 1970 proceder a 8 ou 9 pulverizacoes com insecticidas,
durante a mesma campanha. Em 1980efecTuaram-se ate 50 pulverizacoes e
deu-se um aumento paralelo dosefeitosdo paludismo na regiao. Aconteceu
a mesma coisa na India, entre os pequenos produtores de arroz e algodao de
Tamil Nadu, de Maharashtra e de Gujarat. Nestas regioes, os mosquitos
ganharam resistencia contra toda uma gama de pesticidas, concretamente o
DDT, HCH/propoxur, malathion e outros OP.
Compara-se frequentemente os perigos que os pesticidas envolvem com
as vantagens que eles podem trazer a saude publica e a economia. No
Botswana, por exemplo, onde se procedeu a pulverizacoes adreas contra a
tripanossomose, comparou-se a reduqaodo numero de doentes e os beneficios econdmicos conseguidos pelos criadores de gado com certos efeitos
secundarios nao conhecidos sobre os habitantes das regioes rurais. Em
muitos outros casos, mais concretamente no combate ao paludismo, os
resultados para a saude publica sao menosclaros. Paraestescasos, os riscos
e as vantagens sao normalmente medidos pelas autoridades nacionais, em
colaboracao com aqueles que beneficiarao economicamente (os proprieta
ries de gado, os agricultores e os produtores de pesticidas). Raramente
consultam o povo que fica de facto exposto ao risco dos pesticidas.
As normas que fixam os niveis aceitaveis de residues de pesticidas nos
alimentos estabelecem-se Segundo criterios adoptados unanimemente por
peritos. fabricantese grandes agricultores, osquaisoptampela solucao mais
capaz de manter a producao e nao a que melhor protege a saude da
populacao.
39
Compete assim aosprincipals beneficiariosdo aumentoda produqao e das
vendas e aos que fixam os niveisde perigoaceitaveis, apreciar asconclusdes
dos inqueritos sobre osefeiios nocivos dos pesticidas. Nesta optica dodesenvolvimento rural, estas pessoas tomam a peito o interesse naciona! e o dos
grupos vulneraveis, sempre que rnedem perigos e vantagens A investiga^ao
e a avaliacao dos riscos fica para os peritos que, no melhor dos casos,
aconselham o*povo sobre ccmo utilizar os pesticidas com maioi seguranqa.
Mas a educaqao e muito superficial e os utilizadores sao mantidos numa
ceria ignorancia do processo em que estdo envolvidos.
Durante os ultimos 25 anos, muitos parses tiraram beneficios do emprego
de pesticidas. E no entanto os pesticidas s3o apenas uma soluqao de curto
prazo no combate aos parasitas e, sejam quais forem as vantagens que a sua
utilizaqSo ofereqa, ela envolve sempre muitos inconvenientes. £ verdadeque
os pesticidas matam os parasitas. mas matam tambdm os animais que se
alimentam deles. Levados pela chuva, vao poluir a Sgua consumida pelos
homens, animais e plantas que ameapam envenenar.
Uma outra analise considers a situapao sob um angulo muito diferente e
mostra que os interesses dos fabncantes de pesticidas e dos negociantes
entram, muitas vezes, em conflito com os dos utilizadores e dos potenciais
intoxicados. Daqui, a escassezde provas de efeitos nocivos. Deveria tentarse tudo para informar os utilizadores de pesticidas dos seus perigos e
encoraja-los a tomarem parte activa na avaliacao de riscos e vantagens.
Podem tomar-se algumas medidas pr^ticas para este efeito a diversos niveis
(ver anexo).
Se a situaqao d assim tao grave, como e que a terra nao esta juncada de
cadciveres? Ainda nao chegamos la — porenquanto. MasatencSo: ha-osem
numero crescente em algumas regioes, e quern sabe o mal que esta a ser
causado aos vivos pelo uso cada vez maior de pesticidas em condicoes de
controlo deficiente? Utilizam-se por ai cada vez mais pesticidas e eles sSo
cada vez me nos eficazes em destruir os parasitas, pois estes vao ganhando
resistencias. Isto signifies que vamos ter de utilizar pesticidas mais toxicos e
mais caros.
Poi'que preocuparmo-nos?
0 fardo deste tipo de desenvolvimento economico nao pesa so sobre as
costas dos consumidores de alimentos contaminados. De facto, o controlo
dos residues de pesticidas nos alimentos — com fins mais comerciais que
sanitarios — esta bem desenvolvido. As grandes vitimas sSo, portanto, os
habitantes das zonas pulverizadascom pesticidas. E oseu solo, a sua alimentacSo, a sua Sgua, o seu ambiente que esta poluido.
Continuaremos a utilizar pesticidas. E aparentemente a "ordem das coisas". Mas 6 preciso que eles nSo perturbem esta ordem, o que acontecera
caso se prossiga a politica actual. Muita coisa pode ser feita para reduzir o
emprego dos pesticidas, us^-los com maior cuidado e avaliar os seus efeitos
secondaries. Fazer culturas rotativas, introduzir inimigos naturais dos para
sitas (p^ssaros, ras, lagartos) sao peqas de todo um sistema de luta integrada
contra os parasitas. Mas o mais importante de tudo 6 dar a conhecer a accao
dos pesticidas Squeles que mais expostos estSo aos seus efeitos nocivos: os
camponeses pobres.®
N.B.: Queiram consultar o anexo para referencias bibliogrificas e enderegos relatives a
este artigo.
Vocd, que e«tA a ler isto, tamMm tem pesticidas no seu organismo.
40
Os services de saude rural na CroAcia
Q s jugoslavos estao orgulhosos dos seus services de saude rural e tern
razaopara isso. 0 numero de medicos, enfermeirosepessoalauxiliare
suficiente e a cobertura de todo o pais e satisfatoria. Na maior parte das
regioes rurais existe urn mddico para 2-3.000 habitantes; nas cidades a
proporqao e francamente melhor. Osgeneralistas sao a pega mestra de todo
o sistema sanitario no campo e trabalham em colaboragao com os centres
regional de saude, para onde enviam eventualmente doentes para, por
example, ai serem. submetidos a exames radiologicos e hematologicos.
Enviam tambem os doentes para o hospital regional.
Na Jugoslavia, os poderes e as tomadas de decisao estao fortemente
descentralizados. Existe no pais uma longa tradigao de autonomia local, que
tern hoje em dia a sua expressao nos conselhos comunais. Na Croacia, por
exemplo, encontramos 105 comunas, dotadas cada uma de um conselho
soberano e as reunifies fazem parte da vida de todos os dias. 0 sector de
saude nao foge a regra e compete as comunidades locals determinar o tipo de
servigos de saude que querem ter, sem praticamente terem em conta o que
se passa no resto do pais.
Parece ter-se criado uma situacao curiosa com a combinagao entre o
poder politico e administrativo descentralizado e o corpo medico influente.
Todas as decisoes sao completamente tomadas a nivel local e os services
BOTSWANA
"Deformapao
profissional
(baseado num artigo
de Marit Kromberg)
pages pela propria populagao, mas da a impressao de que esta nao participa
realmente nas decisoes. Os conselhos comunais desempenham efectivamente um certo papel, ja que os programas sani tarios naopodem ser levados
a pratica sem a sua aprovagfio. Mas quern elabora os programas sao os
medicos — muitas vezes sem o director do centra de saude.
Numa dada regiao, os mddicos do centra de saude sugeriram que algumas
camas de hospital fossem suprimidas e a proposta, depois de examinada pelo
conselho comunal,.foi aprovada. Numa outra regiao, pareceque odirector do
centro de saude tomou a mesma medida sem consultar ningu^m. Em
resumo, existem todas as condigoes para que a populagao participe na
implementagao da rede sanitaria, masna pratica os medicosfazerh um pouco
o que querem
Os services de saude sao pagos por um sistema de tributagao Segundo os
salctrios, sendo o criterio fixado localmente (este situa-se geralmente a volta
de 0,5% dos salaries). Para aviar uma receita paga-se tambfim 10 dinars
(cerca de 0,20 SUS) por medicamento. O termo legal para designer este
pagamento signi-fica alias "participagao”. A repartigao dos recursos faz-se a
nivel local mas nem sempre o conselho local e ouvido. Reserva-se, por
exemplo, 3/14 dos recursos para os cuidados primaries de saude. 3/14 para
o centro hospitalareo restante para oscuidadosaodomicilio, os medicamentos, etc.
A partir de 1970, tem-se vindo a formar no Botswana um novo
tipo de agente sanitario — a educadora de familia O principio era
recrutar estas educadoras entre as familias mats necessitadas,
compensando-as de algum modo atravesda remuneratoque lhes
sena devida. Mas o problema eracomopagar-lhes. Comotrabalhadoras pagas por dia de trabalho, elas nao teriam garantia de trabaIho permanente. nemdireitoa ferias,baixa pordoenca.aumentode
salano com experience adquirida e no fim da sua vida de trabalho
nao estava garantida qualquer reforma Em todos os aspectos, o
seu estatuto nao diferia assim do dos habitantes das zoans rurais.
Uma outra alternative que se coIocava era a de situa-las noescal3o
ma is baixoda administrate publica local, oque Ihespermitina um
salano 3 vezes mais elevado, alem de muitos outros beneficios.
Esta segunda soluto foi a adoptada. Com o decorrer dos anos as
diferenqas entre os salaries dos rurais foram-se acentuando; as
educadoras de familia sao hoje relativamente bem pagas e
identificam-se muito mais com a classe dos funcionarios do que
com a dos camponeses pobres Os postos de trabalho s3odisputados e acabam por ser atnbuidos asfilhasdas familias ricas, com boa
mstrucao.
O governo, que aparentemente ignora as divergences de mteresses que existem entreos camponeses pobrese a administrate.
acaba por se servir oas educadoras de familia para divulgar o novo
regime de pastagem das terras tribais que vira agravar consideravelmente a ja existente desigualdade de rendimentos Cada vez
mais vimos ouvmdo as educadorasde familia queixarem-sedeque
"e muito dificil compreender os pobres" e que eles naodemonstram "qualquer espirito de cooperate" e mesmo que s3o
’■preguicosos’’.
A educadora de familia foi anancada do meio pobre a que
pertencia e integrada nas estruturas admirystrativas. Perdeu assim
a possibilidade de se identificar com a populate que era suposto
ela servir, e consequentemente a sua propria efitcia, enquanto
agente de transformato. As educadoras de familia que conservaram a sua inicial identidade levam uma vidadificil Ao elevaro nivel
de vida das educadoras de familia ignorou-se oelemento politico
dos services de saude rurais, mas o preco que se paga por isso e o
da dimmuito da sua eficacia •
41
A coordenaqao of ictal entre os sectores da saude, da educaqao e da
agricuitura parece ser fraca. Alguns medicos tern relaqoes pessoaisexcelentes com professores e animadores agricolas e vao periodicamente fazer
palestras as escolas No entanio, embora toda a genie interrogada tenha
faiado de coordenacao e cooperapao. ninguem deu exempios concretes e
convincentes.
camponeses sao encorajados a dedicar-se a culturas comerciais, por razdes
economicas, nomeadamente a vinha e isto dificulta a aplicapao de programas
de educapao nutricional Mas apesar disto, as pessoas andam bem alimentadas e tern acesso facil aos produtos alimentares essenciais em quantidade e
a baixo prepo.
Os trabalhadores da saude
Tipos de doenpas e taxas de mortalidade
Ate ha pouco tempo, em comparapao com o resto da Europa, a Croacia
mantinha-se extremanente vulneravel as doenpas mfecciosas e as taxas de
mortalidade infantil eram elevadas, Hoje em dia, as principals causas de
morte sao as mesmas que no resto do continents: problemas cardiacos.
acidentes de viapao, hipertensao, cancro e diversas doenpas profissionais.
Uma grande parte da populapao sofre de reumatismo, provocado, diz-se, em
parte, pel as condipoesde vida no campo. Muitas vezesos ruraistrabalham na
fabrics de manha e ao principio da tarde e depois, durante 6 ou 8 boras, no
campo. E surpreendente e mesmo decepcionante constatar que as taxas de
mortalidade infantil (TMI) e de mortalidade perinatal (TMP) se conservam
bastante elevadas em algumas regioes rurais.
Numa delasa TMI e de45 em mil e disseram-nos que havera piores Mas,
ao mesmo tempo, em outras duas que visitamos, e de 9-15 em mil, o que
corresponds as medias europeias cor rentes Quase todosospartos sao feitos
actualmente nos hospitals regionais bem equipados e dotados de pessoal
muito competente, mas a razao das diferenqas que notamos e inexplicavel.
As explicapoes que nos deram ("factores socio-economicos", "ignorancia
. popular”, "dedicapao do pessoal medico”) nao sao muito convincentes. Uma
proporpao excessiva das mortes infantis parece ser devida a deformapoes
congenitas e levantou-se a diivida se nao haveria uma relapao entre este
estado de coisas e a utilizapao de pesticides Aparentemente, esta questao
mereceu um certo interesse, mas nao se efectuaram quaisquer
investigapoes.
Nao notamos qualquer sinal de malnutripao nas crianpas. O governo
croata subvenciona o leite, a farinha e o aqiicar e as crianpas necessitadas
contam com uma refeiqao escolar. Os principals problemas de nutripao
resumem-se & composipao das ementas que, foi-nos dito, comportam demasiados amidos (especialmente em massas) e carne, mas poucos legumes. A
nao ser que haja legumes cultivados nos arredores. torna-se dificil arranjalos, pois os excedentes vao para as grandes cidades. Aparentemente os
42
A saiide publics nao goza de um Iugar especial no ensinoda medicina e os
estudantes tern uma formapao identica a da maior parte dos seus colegas na
Europa ocidental e'na America do Norte. A predominancia esta na medicina
curativa, nos^sectores tradicionais: patologia, cirurgia, obstetricia e ginecologia Em alguma faculdades o programa sofreu alterapoes e os estudantes
passam uma semana no meio rural e frequentam um curso de epidemologia
com a mesma durapao.
Vinte por cento dos diplomados sao generalistas. Muitos instalam-se no
campo para seguirem a sua formapao e virem a especializar-se em cuidados
primaries de saude
0 sistema de saude e indiscutivelmente regido pelocorpo medico. A todos
os niveis, desde o Ministerio da Saude e estabelecimentos de ensino ate as
colectividades rurais locais, verdadeira sede do poder, sao os medicos que
estao ao leme. Os postos-chave sao ocupados por homens, mas aumenta o
numero de professores mulheres e espera-se, para breve, o mesmo numero
de estudantes de cada sexo.
0 pessoal de enfermagem e composto quase exclusivamente por mulhe
res e, como em muitos paises, esta subordinadoaos medicos. Quer ele ou ela
trabalhe no seio de uma equipa de cuidados primaries de saude ou num
hospital, o seu papel e aplicar as indicapoes do medico.
Uma categoria particularmente interessante e a da enfermeira "assistente social”. Acumula o papel de enfermeira-visitadora com o de agente de
saiide Sao elas que constituem a verdadeira ponta de lanpa da estrategia de
cuidados primaries de saude em meio rural. Com uma formapao de base.
vao-se aperfeipoando pela pratica de reciclagens. A sua actividade principal
consiste em visitar as pessoas ao domicilio, especialmente as crianpas com
menos de dois anos, os invalidos, os idosos e os doentes cronicos que tern
necessidade de uma assistencia constante (sao obrigadas a visitar os invali
dos uma vez por mes). Fazem tambem educapao nutricional, dando conseIhos sobre o regime ea alimentapao das crianpas de tenra idade. Coordenam
ainda os grupos locais de "auto-tratamento" (ver o subtitulo seguinte). Cada
enfermeiro/assistente social dispoe de um meio de transpose (habitualmente um carro), fornecido pelo centro a que pertence (dizemos tambem no
masculino porque tambem encontramos um enfermeiro/a-assistente
social).
0 ou a enfermeiro/a-assistente social esta subordinadoao medico.Todas
as manhas lhe apresenta um relatdrio da sua equipa de cuidados primaries
de saude e recebe a lista das pessoas a visitar, com apreciacoes sobre cada
caso.
reunioes, o medico e substituido por um enfermeiro ou enfermeira. e mesmo
este e dispensado depois de alguns meses. Aproximadamente 18 meses
depois da sua criapao, a maior parte dos grupos reunem-se ja sem qualquer
medico ou enfermeiro. Sempre que sao confrontados com problemas que se
sentem incapazes de resolver por si propnos, o secretario do grupo consulta o
medico Foi-nos dito que nao sentiam muita necessidade de uma estrutura
tao forte, mas assim e mais facil o corpo mddico aceitar a ideia.
Interrogamos alguns deles a este respeito e responderam-nos — a sorrir
— que trabalhavam em equipa ea tarefa do medico era dar-lhes instrupbes. £
claro que os assistentes sociais tern iniciativas, quando um vizinho da casa
onde estao lhes pede ajuda, por exemplo, mas e bastante raro.
A remunerapao do pessoal de saude e financiada por cotizapbes obrigatorias sobre os salaries. Existe um escalonamento, mas as amplitudes nao sao
muito grandes. 0 vencimento de um especialista anda a volta do dobro do que
recebe um operario numa fabrica, masbeneficiamdediuturnidades^ medida
que ganham experiencia.
Grupos de "auto-tratamento”
A experiencia mais interessante na Croacia e a dos grupos de "autotratamento" O principle fundamental e o seguinte: grupos de cerca de uma
dezena de pessoas com o mesmo mal cronico reunem-se regularmente,
inicialmente sob a bgide de um mbdico e de uma enfermeira, maistarde sem
estes ultimos. e discutem os seus problemas, analisam-nos e seguem-nos.
Numa das regioes que visitamos (nas proximidades de Pazin), 2% da popula;
pao participa nestes grupos, que comeparam em 1976 Trata-se provavelmente de uma situapao excepcional, devida, em grande parte, ao espirito de
iniciativa do active director do centro mddico local. Alguns grupos sao constituidos por pessoas da mesma profissao, por exemplo trabalhadores da
mesma empresa, vitimas de iilcera no duodeno.
Uma avaliapao oficial quanto a aepao dos grupos de auto-tratamento
demonstra que eles produziram uma redupao espectacular do niimero de
consultas normals nos hospitals, um conhecimento mais perfeitodos proble
mas da saude e tornaram os doentes mais seguros de si proprios. Entre os
grupos de hipertensos, notou-se um abaixamento significative de mortalidade e de traumas cerebro-vasculares. ainda que este resultado seja provavelmente devido, em parte, ao facto de nestes grupos so serem admitidos
doentes em condipoes fisicas bastante satisfatorias.
£ o medico que constitui os diversos grupos partindo das fichas clinicas.
Antes da admissao, os membros sao sujeitos a um exame profundo. As
reunioes sao geralmente quinzenais. Na regiao ja citada, elas s§o sistematicamente coordenadas pelo medico que faz uma exposipao clinica de uns
vinte minutos; em seguida, outros vinte minutos sao consagradosa medipbes
(peso, tensao, etc.) e outros vinte minutos a um debate. Ao firn de algumas
As opinioes acerca destes grupos sao variaveis. Os que os frequentam
assiduamente dSo-lhes adesao total. 0 pessoal auxiliar, especialmente os
assistentes sociais, parece que o consideram util. Nas faculdades de medicina nao se faz referenda a este sistema. A maior parte dos medicos parece
ter ouvido falar dele, e nao lhe sao hostis a priori, mas sao muito rarososque
a ele recorrem efectivamente. Um deles, grande entusiasta do sistema,
43
fez-nos perceber que os seus colegas talvez temam que os grupos lhes
minem a "autoridade”. Os ginecologistas s3o os mais reticentes. Num outro
centre, disseram-nos que muitos medicos sao contra a "participacao" — sob
a forma de contribuicao de 10 dinars, pois acham que, como os doentes dao
uma contnbuiqao {financeira ou outra), sentem-se mais inclinados a meter a
sua colherada nos medicamentos e iratamentos que lhes sao prescritos.
Cuidados primaries e saude para todos at6aoano 2000
Os principios que regem os cuidados primaries de saude e que foram
definidos pela Conferencia internacional (OMS/FISE) em Alma-Ata (URSS)
em 1978, sao familiares aos agentes de saude que encontr^mos na Croacia.
Segundo a declaraqao de Alma-Ata, os cuidados de saude devem ser acessiveis a todo e qualquer individuo e a um preco que este possa assumir
inteiramente. Nas zonas rurais que visitamos, a rede de saude cobre de facto
toda a populacao a um custo razoavel. E evidente que tudo e relative e, como
tinhamos como guias membros de diversas categorias do pessoal de saude,
nao era de esperar que eles revelassem sinais de descontentamento — de
facto nao descortina mos nenhum A participacao a um problema complexo
Os mecanismos da participacao popular na planificapao e na racionalizaqao
estao la. mas nao parecem ser largamente utilizados. A "participacao"finan
ceira e assegurada por Cotizacbes mensais, que representam uma modesta
percentagem do salano, e pelo pagamento de uma soma modica quando se
recorre aos services. Os grupos de auto-tratamento sao um meio excelente
de obter a colaboracao dos doentes, mas ainda nao entraram nos habitos.
0 objective da OMS de saude para todos no ano 2000 sera atmgido na
Jugoslavia? Varios factores que se depreendem das ideias expressas tanto
pelo pessoal de saude como por leigos poderiam ajudar nesse sentido.
Em primeiro lugar, o ensinoda medicina deveria estar melhor adaptadoas
necessidades da populacao. Isto mclui uma concepcao diferente dos cuida
dos medicos e das relacoes dentro dos services de saude. Em segundo lugar,
seria bom que os assistentes sociais gozassem de maior autonomia e ser
reconhecidos como trabalhadores de primeira linha dos services primaries
de saude. Em vez de meros executores das receitas do medico, naodevenam
depender dele senao em casos em que considerassem a sua intervencao
necessaria. Por outro lado, o medico, por sua vez, pode decidir que o caso que
the e apresentado e do foro do hospital regional. Seria tamb^m conveniente
44
integrar os grupos de auto-tratamento no sistema de saude e multiplica-los.
Por fim, a comunidade deveria ter uma palavra a dizer na utilizaqao dos
recursos samtanos. Disseram-nos que a realizapao destes objectives estava
subordinada a uma transformacao de atitude por parte dos medicos.
Estas propostas podem parecer radicals, utopicas digamos, mas talvez
seja mais facil materializa-las na Jugoslavia que em qualquer outro pais da
Europa Existe ai. de facto, uma tradicao de participacao na politica local
firmemente enraizada e a devolucaodo poder asautoridades regionaisd^ um
grande peso as decisoes e as medidas tomadas a este nivel. A profissao
medica esta tambem bastante desperta, e varias personalidades eminentes
com quern nos encontramos estao convencidas que uma reforma seria util.
Referencias bibliogrificas
Bartolic A., "A study of the importance of work with small groups organized
for a continuous observation of chronic patients". Tese de doutoramento,
Universidade de Rijeka, Jugoslavia 1978 (em croata, com resumo em ingles).
OMS/FISE, Alma-Ata 1978. Os cuidados primaries de saude. Relatorio da
Conferencia internacional sobre os cuidados primaries de saude, Alma-Ata
(URSS), 6-12.9 78
OMS, Formulacao deEstrategias com vista a instauragao da saudepara oano
2000. OMS, Geneve, 1979, Serie "Saude para todos" n° 1 e 2 (preco 5 fr.).
(Em frances, ingles, arabe, chines, espanhol e russo.)
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Os agentes sanitarios; ao servitjo de quern?
Os agentes sanitarios "de primeira linha” podem dirigir a sua acqao em
dois sentidos: ou sao Correias de transmissao da influencia da autoridade
central ou apoiam 0 esforqo das comunidades rurais com vista a aquisiqao de
um controlo crescente sobre os seus prdprios assuntos. A sua formaqao
tecnica nao os fecha na sua especialidade. Em determinado pais, por exemplo, os agentes de saiide de primeira linha tern por missao lutar contra a
subversao. No seu manual de formacao vinha expressamente indicado que
eles constituem um instrument util na luta para assegurar a lealdade da
populaqao rural, ja que havia agitadores que se estavam a organizar nas
aldeias e prestavam serviqos de saiide.
feffSs- -da saiide
rural
Mesmo quando procuram orientar uma comunidade no sentido da
independencia, e possivel que os agentes de um sistema de saiide centralmente controlado se mantenham fieis ao poder central que lhes paga o
ordenado.
Os agentes sanitarios sao muitas vezes escolhidos entre os camponeses,
partindo do principle que 0 seu conhecimentodomeioenriquecera automaticamente os conhecimentos medicos adquiridos recentemente e reciprocamente. Porem, raramente e assim. Estes dois dominios do conhecimento
apoiam-se em estruturas e opticas diferentes, por vezes contraditorias. Ha.
de qualquer modo, frequentemente, um conflito de ideias. A reacgao dos
agentes de saiide varia: ou a sua acqao e uma mera extensao da autoridade
central, ou se assumem como membros de uma comunidade que procura
45
alargar o controlo do seu proprio desenvolvimento A medicina indigena e
frequentemente ignorada ou desacreditada e mesmo quando se lhe reconhece algum valor e, geralmente, para se ganhar a colaborapao dos curandeiros tradicionais. Para melhor adaptar os conhecimentos medicos as
necessidades dos camponeses, os instrutores de um programa de saude
rural foram enviadosaoSudaofazer um estagio nasaldeiaspara onde seriam
chamados.
Noutro projecto, levado a cabo no Gana, a populacao local preencheu
questionarios reveladores das suas necessidades e a formacaodos agentes
sanitarios foi revista em conformidade.
Uma das dificuldades especiais do trabalho dos agentes sanitarios de
primeira linha e que eles foram treinados a desempenhar algumas tarefas
como um ritual Este ensino e o oposto ao metodo pragmatico que fixa, ao
agente sanitario, um objective preciso: melhorar efectivamente a saude da
comunidade. Se alguem tem febre, por exemplo, um agenteque desempenhe
a sua tarefa mecamcamente administra certos compnmidos, preenche um
formulario e passa o caso a agentes mais competentes Como estas tarefas
mecanicas sao a correia de ligaqao entre o Tesouro Publico e a carteira do
agente sanitario, ele nao se esforpa nem por pd-las em duvida nem por
aperfeicoar-se
E muito raro ensinar-se os agentes sanitarios a trabalharem com grupos.
0 contacto pessoal reforca a ideia de que a doenpa e muito mais um problema
individual do que o resultadode nscoscolectivos.eestaconceppaoemvezde
unir a comunidade divide-a. Um project© inovador, realizado no distnto
carecido de Giugliano, a norte de Napoles, na Italia, e uma feliz excepqao a
regra. Nele, os agentes de saude de cuidados primaries ''operatori di base",
aprendem antes de tudo a dirigir reunibes que agrupam pessoas com problemas analogos. Os problemas sao discutidos em comum e cria-se uma estrategia colectiva. Se precisam de conhecimentos tecnicos mais elaborados, os
"operatori" contactam um especialista do centro de medicina social, que
criou o project©
A formacao dos guias rurais voluntaries (GRV) pelo service rural desaude
e assuntos sociais no sul da India ilustra uma outra faceta do problema.
Sempre que as autoridades centrais nao querem, ou nao podem, pagar aos
agentes rurais voluntaries, fica a populacao encarregue de tai. Mas uma
sociedade onde nao existe nem solidariedade nem accao comunitaria, nao
esta preparada para o fazer. A solucao que o service rural de saude e
assuntos sociais encontrou foi autorizar os GRV a cobrar dinheiro pelos
services prestados. E claro que este sistema abre as portas a corrupcao, pois
46
O tratamento pessoal reforqa a ideia de que a doenqa e um problema individual e
nao o resultado de riscos colectivos, e esta concepcSo, em vez de unir a comuni
dade, divide-a
os agentes sanitarios sao tentados a consagrar todoo seu tempo aos clientes
privilegiados e a passar por cima dos pobres que provavelmente maior necessidade terao dos seus cuidados. Os agentes sanitarios acabam, afinal, por
estar ao servipo de uma elite rural Como resolver o dilema? Por um lado, see
o Estado que paga aos agentes sanitarios, estes sentir-se-ao mais responsabilizados perante ele que perante a comunidade local. Por outro. se sao pagos
pelos camponeses com meios, eles acabam por ser considerados seus
empregados. Uma solucao seria a de incentivar programas locais de desen
volvimento sanitario e rural autofinanciados. Foi o que se passou, por exem
plo, com os projectos “Soya Production an Research Association" (SPRA)em
Uttar Pradesh, na India, e "Gonoshashthaya Kendra" (GK) (Centro de Saude
Piiblica) em Savar, no Bangladesh (ver pag. 22).
Conhecimentos tradicionais e estruturas tradicionais
do poder
Os curandeiros tradicionais sao um recurso para o desenvolvimento sani
tario nas zonas rurais, um reservatorio de saber, que pode contribuir para a
auto-suficiencia local As pessoas em muitas areas rurais pobres, e ale
quantas vezes em meios urbanos, preferem os curandeiros, mesmo quando
tern urn acssso relativamente facilitado a medicina ocidental
0 lado neg at Ivo deste recursode desenvolvimento rural e oestatuto social
e a autoridade de que gozam os curandeiros
0 lado negative deste recurso de desenvclvimento rurale o estatuto social
e a autoridade de que gozam os curandeiros. Eles recusam-se a transmitir
aos doentes o que sabem das funqbese problemasdo organismo. mantendoos assim na ignorancia acerca do diagnostico e do tratamento. Muitas vezes
tornam-se membros muito ricos da comunidade e o seu estiio de vida bem
como o seu comportamento assemelham-se. em muitos aspectos. aos dos
grupos dominantes E portanto utopico esperar que eles contribuam de uma
forma desinteressada para o desenvolvimento rural, partilhando o seu saber
e a sua riqueza com quern os rodeia.
Mas raramente podemos bani-los completamente, tendo em conta os
services que prestam localmente Programas inovadores cujo objectivo e
permitir que sejam os rurais a assumir a responsabilidade dos cuidados de
saude enfrentam ate, muitas vezes, a sua oposiqao Ou osprogramasdepen
dem em grande medida de dadores estrangeiros para obtenqao de medicamentos e fundos para a formacao ou eles vem reforqar as desigualdades
existentes, apoiando inequivocamente a medicina tradicional e os interesses
que ela representa.
Talvez a soluqao esteja no meio termo: uma alianqa de principio com os
que praticam a medicina tradicional, conjugada a uma avaliapao imparcial
feita. quer pelos curandeiros, quer pelo pessoal medico, dos meritos respectivos dos dois sistemas. Na medida do possivel sera porem conveniente, nas
negociaqoes com os curandeiros, dar provas de f irmeza, para evitar consolidar sistemas de poder que vem a par com a monopolizapao do saber.
Tecnologia apropriada
Nos ultimos dez anos, desenvolveram-se uma sbrie de auxiliares sanitarios, depois das decepebes causadas pela aplicacao de tecnicas sofisticadas
nas zonas rurais. A tecnologia apropriada (TA) vai de vento em popa. Nao se
trata de uma coisa negativa em si e e melhor que uma "tecnologia desapropriada". Muitas ideias sao inteligentes. Algumaschegam mesmoa funcionar
bem. mas muitas sao opcoes ba ratas que nao servem para nada e que retiram
as aldeias a iniciativa do desenvolvimento, reduzindo este a um privilegio
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exclusive das cidades e dos paises industrializados. Tai como a tecnologia
"de ponta", tambem nao e a TA que melhora as condicoes de vida do
campones pobre. Continue a nada lhe custar porque lhe e oferecida como
ajuda. mas enquanto a primeira saia cara ao dador, esta nao lhe custa quase
nada. E. obviamente, mais "apropriada" para os dadores.
0 importante e. evidentemente, o contexto em que a tecnologia vai ser
aplicada. Uma dada tecnologia. em determinado contexto, pode roubar a
miciativa a populacao rural, ignorar a sabedoria local e ern nada contribuir
para melhorar a situaqao imediata; a mesma tecnologia, noutro contexto,
pode ter efeitos muito positives e levar as pessoas a compreender, pela
primeira vez, que podem agir por si proprias Muitas vezesbastara transmitir
informacoes — o piano de uma fossa septica, por exemplo — para provocar
uma verdadeira movapao tecnoldgica (No anexo pode encontrar uma lista
que ajudara a determinar emquemedida as teen leas sanitariassao apropriadas em diferentes contextos).
Desenvolvimento da medicina curativa
Desde ha longo tempo, os peritos sanitarios vem insistindo, e com razao,
em desenvolver a medicina preventiva nas aldeias. Todavia esta posiqao
serviu, demasiadas vezes, de desculpa para manter a medicina curativa nas
maos dos profissionais. E muito facil sugerir aos outros que cavern buracos
nao chao para instalar latrinas, enquanto os profissionaiscontinuam de bata
branca e a receber os elogios por responderem as necessidades imediatasda
comunidade' curar uma crianqa doente e muito mais espectacular que escavar um poco. Uma acijao preventiva e absolutamente necessaria — mas para
que os agentes de saude locais ganhem a estima da comunidade e para que a
comunidade faca uma melhor opiniao de si propria, torna-se necessario que
eles sejam capazes de diagnosticar e resolver os problemas colectivos. E
preciso que seja visivel a sua imediata contribuiqao para a saude.
Uma enorme percentagem dos pobresque vivem nas zonas rurais sofre de
qualquer doenqa. Para eles. participar em actividades preventivas nao e
muito estimulante, mas o facto de padecerem de um mal nao os devia deixar
de fora da carruagem do processo do desenvolvimento sanitario. "Gruposde
doentes", isto e. de pessoas atacadas pela mesma doenca cronica. podem ser
orientados para se virem a tratar em conjunto. Mesmo no caso de doenqas
agudas, o campones sente-se mais integrado no seu tratamento se e ele que
administra a cura que lhe foi prescrita, ou se esta lhe e administrada por um
parente — eventualmente o agente sanitario pode tornar-se uma realidade
tanto na medicina curativa como na medicina preventiva.
"Divulgar a medicina curativa" nao significa "aumentar o consumo de
medicamentos". A sobre-medicamentaqao e ja flagrante. O que e preciso e
informar melhor. e isso pressupoe uma certa desmistificacao. O meio mais
seguro de la chegar e garantir um aprovisionamento em medicamentos
essenciais (como e sugerido no anexo) acompanhados de um modo de
emprego claro, na lingua local, ou atraves de simbolos apropriados.
Educaqao sanitaria — para quern?
"Mais educacao sanitaria" — e um leitmotiv dos peritos internacionais.
Diz-se que e preciso ensinar aos camponeses a aceitar certos a limentos, a
co nt race pea o, os re medios e algumas praticas de higiene. As elites nacionais
aderem de boa vontade a estas ideias, pois assim veem reforqar a sua
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superioridade. A op i mao de que a doenpa e a mcapacidade saocausadas pela
ignorancia ou que, no minimo, podem vir a ser reduzidas pela educacao,
denota urn erro de calculo generalizado A ignorancia, no sentido de analfabetismo, e resultado precisamentedas mesmascondicoes sociaisqueprovocam as doenqas evitaveis e as incapacidades Tem origem nas mesmas
desigualdades sociais, econdmicas e politicas que as doencas devidas a
pobreza.
Para ser eficaz, a educacao sanitaria deve dar a popuiapao local a possibi11dade de controlar efectivamente os cuidados de saude e outros aspectos da
vida rural. A este respeito, podemos citar o piano elaborado pela esposa de
um grande agricultor na America Latina Ela percebeuqueo unicolugar onde
as mulheres se juntavam regularmente era o poco, e depois cada uma ia a
sua vida, e foi ai que fez instalar um altifalante difundindo conselhos de
higiene (lavagens, cozinha, refeipoes, contraceppao. etc ). A ideia e excelente, mas o no da questao la esta. quern controla a educacao7 As boas
mtenpbes desta mulher esclarecida nao sao suficientes. Ja que a tecnica e
simples, porque nao encarregar um grupo de mulheres de transmitir casset
tes gravadas? Entao o "grupo alvo" (para usar uma expressao do sistema
hierarquizado de educacao sanitaria) aprenderia verdadeiramente qualquer
coisa.
A ajuda sanitaria
As opinides relatives as vantagens e inconvenientes da ajuda sanitaria e
de qualquer outra forma de ajuda ao desenvolvimento rural, estao bastante
divididas. Uma das teses comeqa por afirmar que uma transferencia de
recursos poderia facilitar algo que de outro modo nunca seria possivel, dadas
as presentes circunstancias ''Esmola para os pobres" e sempre, em prmcipio, uma bonita acqao. Outros no entanto dirao que a esmola nunca tirou o
pobre da miseria e muitas vezes e mesmo prejudicial, pois fa-lo perder o
habito de contar consigo proprio e torna-o dependente do dador
As implicaqoes desia primeira tese sao simples: a ajuda e uma coisa boa,
temos portanto que a aceitar. As da segunda sao menos Claras, pois parece
ser exagerado e pouco realista rejeitar toda e qualquer ajuda.
Excepto numa sociedade economicamente sa, independente e igualitaria
(onde provavelmente qualquer forma de ajuda seria superflua). e muitas
vezes conveniente desafiar as estruturas nacionais de poder, se queremos
que o desenvolvimento samtario aumente a participaqao popular. Financiamentos externos podem entao proporcionar a independence economica
No caso de uma das funcoes ainbuidas ao agente de saude ser o recolher de
dados, este dara pnoridade a esta tarefa, passando a solucao dos problemaspara
segundo lugar
necessaria para criar uma base de poder alternative. E possivel tambem que
individuos estranhos a comunidade, bem como membros dasclassesprivilegiadas nativas, possam contribuir para este processo. Os nscos de agravar a
dependencia cultural e economica sao todavia consideraveis e estao sempre
presentes.
A Ajuda sanitaria pode assim ser integrada num sistema mundial de aeqao
social ao qual se afectam um ou dois por cento dos recursos mundiais, a fim
de garantir um minimo vital a todos aqueles que nao tem qualquer controlo
sobre os seus recursos Mas tambem pode acontecer que ela sirva como
instrumento de pressao as elites nacionais que mantem os seus compatriotas num estado de miseria quase total. Em ultima analise, a ajuda sanitaria,
como muitos outros aspectos do desenvolvimento rural, e uma arma de dots
gumes.
0 melhor que ha a fazer em cada situaqao sera talvez proceder a uma
exame sistematico das condicoes a que a ajuda esta subordinada; modahdades de reembolso, se se forma entre a populacao quern mais tarde possa
substituir os estrangeiros. se os tecmcos do pais dador gozam de facilidades
tais que os coIocam numa situacao privilegiada, se — bemvistas-ascoisas —
a dependencia da populaqao local em relatjao ao dador tem tendencia a
aumentar ou a diminuir No fundo. se os dadores seleccionam os casos em
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que meihor podem exercer a sua influencia, porque e que os beneficianos
nao poderao dar a sua preference aos dadores que lhes imponham menos
laqos de dependencia?
de encerramento das reunioes cientificas, vai-se repetir que e preciso
continuar as pesquisas". Alias, quando se referem a situacao dos camponeses pobres. tem-se geralmente em mente o estudo de carencias psicoldgicas
e educativas destes grupos
Investigate e avaliacao
Todos estao de acordo em que uma pesquisa deve incidir sobre um
problema precisa e que as informacoes recolhidas naodevem ser armazenadas num arquivo a espera do dia em que possam ser uteis. No entanto. da-se
a primazia aos sistemas de reuniao de informacoes correntes que, em si
proprias, nao tern muito valor Num projecto executive na India, tres agentes
sanitarios, cada um com uma missao diferente, estavam encarregados de
reumr informacoes de 50 em 50 casas que visitavam. Cada casa recebia a
sua visita uma vez por mes, preenchiam um formulario-tipo e as informacoes
eram transmitidas ao hospital central onde eram guaradas. E era tudo: as
pessoas forneciam os dados, o agente sanitario registava-'os e transmitia-os.
Durante os dez anos do projecto (que recentemente se concluiu) nao se
registou nenhuma melhoria significativa dos parametros vitais (mortalidade
dos recem-nascidos, mortalidade infantil, etc ) no perimetro do projecto. em
relacao ao resto do pais.
A investigacao no dominio da saude centra-se, em geral, nas necessidades dos grupos dominantes. Mesmo se se interessa polos rurais pobres, tern
sempre em conta os problemas que tambem dizem respeito aos ricos, lais
como o crescimento demog rafico ou as infecqdes que afectam todas as
classes sociais (a variola, por exemplo). Em conferencias cientificas sobre o.
paludismo que flagela milhoes de habitantes do Terceiro Mundo e provavel
ouvirem-se sabias comunicaqdes sobre complicacdes muito raras como o
paludismo cerebral e seu tratamenio. A proposito de esquiiosomiase (bilharziose) falar-se-a de complicacdes urinarias. Raras vezes a atencao se concentra na anemia cronica provocada por essas doencas. E nodiscurso ritual
0 problema e que a investigacao e a relacao acabam por ser um fardo
suplementar que e imposto aos agentes sanitarios, ja por si sobrecarregado^.
E quase sempre assim quando a avaliacao parte do topo para a base. Se se
entrega a um agente sanitario, como uma das suas tarefas, a funcao de
reumr dados, sera nisso que ele se ocupara mais, passando para segundo
piano a soluqao dos problemas, tarefa obviamente mais dificil de vir a ser
apreciada.
Os cuidados primaries de saude supoem uma definicao de prioridades
sanitarias. especialmente quando os creditos sao limitados. 0 homem da rua
nao tern voz activa no processo. Sao terceiros que se apercebem das suas
necessidades e que decidem se devem ou nao ser satisfeitas. E por demais
evidente que e indispensavel associar a todo o processo a populacao
afectada.
E precise que a saude ganhe raizes no seio da comunidade... o que exige... uma
capacidade cada vez maior para tomar decisdes sobre as prioridades sanitarias.
50
Um factor susceptivel de criar um certo optinmsmo no campo da avaliacao
e da investigacao e a importancia crescente que vem sendo dada a investiga
cao participante, considerada como uma componente da accao sanitaria, e
na qual a populacao tern um papel cada vez mais determinante. Parte-se do
principio que descobrindo ela propria os problemas e escolhendo as medidas
a tomar, a populacao ficara mais disposta a associar-se ao processo de
desenvolvimento no seu conjunto
Mas afina! que se deve fazer?
Foram desenvolvidas varias estrategias de combate ao agravamento da
pobreza rural: politica de desenvolvimento social tendoem vista elevaronivel
de instrupao e protecpao social; politica de habitat com vista a melhorar e
aumentar as habitapoes nos bairros pobres; programas e politicas de desen
volvimento rural ’'integrado", tendo como objective descentralizar a indus
try e criar postos de trabalho. No sector da saiide, experimentaram-se
programas verticals e diversas formas (assistencia, coerpao e estimulos
materials) com vista a redistribuir os recursos sanitdnos. Todavia, cada uma
destas estrategias diz respeito a um umco sector (saiide, educapSo, seguranca social, emprego), enquanto nos restantes se mantem intocaveis as
desigualdades. Ainda nao ha coordenapao entre os programas sectoriais
para as zonas rurais, a firn de fazer frente aos problemas dos seus habitantes,
e este fracasso a nivel nacional e muitas vezes agravado com a intervenpao
de agendas internacionais de ajuda. Porventura o mais importante e que
estas solupoes so muito raramente fazem apelo a criatividade e dinamismo
da populapao que pretendem servir
Outro tipo de solupoes que vaoganhando terrenoenvolve uma analisedas
necessidades da populapao interessada e a elaborapao de programas de
aepao destinados a saistafze-las. Uma delas e o mdtodo da participapao ,
Que ja fez correr muita tinta mas que. na pratica, nunca foi aplicada ao
desenvolvimento sanitario Varios especialistas internacionais que considefavam a participapao como um meio para alargar a cobertura dos services,
falam agora de fracasso. Estes peritos citam projectos em que a participapao
Popular consistia por exemplo. em cavar fossaspara a instalapaode latnnas
Disseram as pessoas onde e como as fossasdeviam serescavadase como se
deviam utilizer das latrinas. Ora ninguem se veio a servir delas e a conclusao
tirada foi a de que a participapao tinha redundado num fracasso. Muito
diferente e a optica que considers o desenvolvimento sanitario como uma
componente da participapao social. 0 trabalho quotidiano e entao orientado
para este objective mais audacioso.
Os argumentos pro e contra uma crescente participapao no desenvolvi
mento da saude tern origem em questoes politicas e nao somente em questoes de ordem tecnica ou financeira. As realizapoes sanitarias sao. sent
diivida, mfluenciadas por factores politicos, sociaise economicos, mas so em
parte. Trata-se de evoluir progressivamente para chegar a um ponto em que
as decisoes sejam tomadas pelos camponeses. 0 principioque residedquea
saiide nao se transfere nem se troca como qualquer mercadoria. Os services
medicos poderao talvez ser oferecidos como tai, mas isso nao leva a uma
automatics melhoria da situapao sanitaria. Geralmente oefeito acaba por ser
o reforpo das relapbes comerciais no resto da sociedade. E preciso que a
saude ganhe raizes no seio da propria comunidade, oque exige odesenvolvi
mento dos conhecimentos em materia de higiene, atravds de uma educapao
melhorada (como se lavam os dentes, etc.), mas tambem uma crescente
capacidade para tomar decisoes sobre as prioridades sanitarias.
Em muitos pontos do planeta, estao a formar-se grupos motivados, que
elaboram uma teoria cada vez mais articulada e coerente de participapao no
desenvolvimento sanitario. 0 seu metodobaseia-se numa analisedas necessidades feita pela populapao e no desenvolvimento de programas de aepao
sucessivos, chegando cada um mais longe que o anterior Importa agora fazer
confianpa neste metodo e tirar ensinamentos da experience adquirida. Este
e um primeiro passo para a realizacao das aspiracoes dos camponeses
pobres.®
51
145
82
editor
Victoria Bawtree sg
paginapao
Eugenio Caldi
CJI
secretariado
w
Barbara di Marco ”
Madeleine Zeller
""
Ideias e Accdoe urn boletim pubhcado bnnestralmenic um inglus francos <• espanhol
Todos os anos e editado urn numero duplo sobre um tcma especial
E gratuito Para o receber basta escrevei para a morada aqui relcnda dando lodos os
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Uma alterac^o de morada deve ser imediatamente mdicada
Todos os comenianos ou criucas sao benvindas Nao na qualquer impedimenta a reproducao dos artigos nele mcluidos desde que a sua fonte seja citada
Pubhcado pela Campanha Mundial contra a fome Accao pelo D^senvolvm - ..ig, Orga
nizacaodas Nacdes Umdas para a Ahmentaqao e a Agncultma. C0100 Roma, Italia As opt
moes expressas nao representam necessanamente as posicoes da TAO o.; da CMCF AD.
nem as designacoes utihzadas implicain a opimao da organizacao sobre o estatuto luridico
dos paises ou a delimitacao das suas fronteiras
Indice
Editorial......................................................................................................................................................................................... 2
0 desenvolvimento rural e cuidados primaries de saude
2
...........................................................................
Mitos e obstaculos ................................................................................................................................................................ 4
0 mito dos cuidados primaries de saude: um estudo de caso no Peru, por Frits Muller .... 7
/4s estaqoes e a saude no meio rural .............................................................................................................
Mobilizapao para a saude: o caso da Guine-Bissau (extracto de um estudo)
Saneamento e desenvolvimento rural, por Piers Cross e Neil Andersson
13
...........................
13
..................................
15
Instalacao de latrinas ventdadas modernas no Zimbabwe ...............................................................
17
Saneamento comunitario no Paquistao
........................................................................................................
20
Esquemas de financiamento alternatives......................................................................................................
22
Participacao e responsabilidade dos agentes de saude comunitaria — uma experience
realizada no Mexico por David Werner .............................................................................................................
23
Ao Servipo do Povo: reflexoes de um agente db base na Asia, por Jaime Z. Calvez-Tan an 29
Medicos de provincia.................................................................................................................................................
31
Planificaqao e gestao dos cuidados primaries de saude, por Gill Walt e Patrick Vaughan
34
Os pesticidas e o desenvolvimento rural, por Neil Andersson.............................................................
36
Botswana: "Deformaqao profissional"
Jugoslavia: os services de saude rural na Croacia .......................................................... 1
Para uma estrategia de desenvolvimento de saude rural .......................................................................
45
llustragoes
Capa de E. Caldi, com "arbre a palabres" de Nuru ( de Contact, n°. 53, CMC(Conselho Ecumenicodas
Igrejas, Genebra); desenhos de L. Mackie ... 4-6, 29, 43; foto OIT(publicada pela FAO)... 7; fotode F. Muller
... 9; fotos OMS de Y. Pouliquen ... 10, 12; (publicada pela FAO)... 15; D. Deriaz ... 1 9, 35; J. Abcede ... 21.
33; RC da Silva ... 24, 51; A.S. Kochar ... 34; desenho extraido de Educaqao Sanitaria, Comissariado de
Educaqao Nacional (Guinb-Bissau)... 1 3; desenho de capa de Agua e Saneamento para todos? Earthcan
(Londres), 1 980 ... 1 6; banda desenhada de C. Offley (extraida do New Internacionalist (Oxford), Setembro
1 981 ... 1 8, desenhos extraidos de Helping Health Workers Learn, the Hesperian Foundation (Paia Alto.
USA), 1982 ... 23, 26, 28, 51; foto publicada pela FAO ... 25; fotos FISE (publicadas pela FAO) . 27-49;
desenho extraido de Utusan Konsumer, Associacao de consumidores de Penang (Malasia), Janeiro 1982
... 32; desenhos extraidos de Pesticides Problems in a Developing Country, Friends of the Earth (Malasia),
1981
40, foto FAO de F Mattioli
46; P A Pittet
48; foto PAM/FAO de G Torteli
------------------------
47
- Media
699.pdf
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